Sou uma leitora rara de poesia. E o motivo? Desconheço, pois gosto bastante do gênero.

Mas o que sei, ou sinto, são as poetas que me tocaram dessas últimas leituras.

A Livraria Palavrear é uma verdadeira dádiva para quem é leitor e gosta de se aventurar por novas descobertas. Até para mim, que escrevo como dona/livreira/curadora, algumas obras me passam, me pego pensando que depois, em algum momento, irei ler, mas o depois, talvez, demora um pouco.

Assim, boas obras e bons autores vão se perdendo em meio a tantas coisas a serem lidas.

Mas como eu disse, a Palavrear é expert em me fazer ler livros em que o “depois” se torna mais breve.

Nesse caso, foi o Clube de Poesia que me proporcionou duas experiências literárias excelentes:

Wislawa Szymborska e Ana Martins Marques.

Wislawa é encantamento.

Suas poesias são inteligentes, com aquela rara combinação de filosofia e lirismo, observação de mundo, de seus pares. Ela faz poesia com crítica social de forma sutil, filosófica.

Szymborska tem um humor elegante, refinado.

Seus poemas são contemporâneos, vão de história do mundo até dança moderna, pop, mitologia, história e eventos cotidianos, refletindo sobre as nuances do dia a dia com a universalidade de seus temas.

[Para o meu coração num domingo], – até agora meu preferido dela -, é poético até no título. Afinal, quem aos domingos pretende prestar atenção a um coração?

Mas na verdade, seus títulos são especialmente bonitos: “Um amor feliz”, “Riminhas para crianças grandes” e “Para meu coração num domingo”, que acredito ser um bom início para quem quer se apaixonar por Szymborska.

A segunda “descoberta” poética foi com Ana Martins Marques. Algum tempo ela estava no meu radar de leituras, mas por essas coisas da vida de leitor, acabei deixando para o depois.

Em “Risque esta palavra”, Ana fez poesia do cotidiano. Onde ninguém (ou quase ninguém) vê, onde não há, ali ela viu algo e nos trouxe esse olhar bonito para coisas tão simplórias.

Acho que ser poeta é isso: ver beleza onde nós, meros mortais, vemos apenas a vida acontecendo. Mas a vida acontecendo, já não é uma poesia?, talvez diria eles, os poetas.

Poesia sobre fazer malas, cigarro. Poesia do cotidiano, do que é a vida, ou da tentativa de entende-la.

Interessante esse olhar de Ana Martins tirando poesia de tudo: mar, cotidiano, amor e até da própria língua e tradução. Poesia do próprio poema, linguística.

Em “Risque esta palavra”, Ana Martins escreveu um poema sobre Szymborska. Um retrato em que esta, já mais velha, fuma desaforadamente – e belíssima, por sinal. Mas a foto é somente uma premissa para um poema sobre o abandono do cigarro, que serve como uma espécie de reflexão sobre questões afetivas, estéticas e até sobre a perda.

Vejo os poemas de Ana Martins como uma espécie de inventário de memórias afetivas. Onde ela busca reter – e nos contar através da poesia, o mundo que deixamos de ver e sentir.

“(…) e no entanto

no transporte público no supermercado

num guichê no meio de uma tarde

qualquer

ela – a poesia – parece estar de volta

quando menos se espera

e sem que se tenha a certeza

de que é mesmo ela.”

Risque esta palavra – Ana Martins Marques

Gosto de escritas elegantes! Ana Cristina e Wislawa, tem isso em comum. Apesar de não só.

Percebei com essas duas poetas, que a poesia do cotidiano me emociona especialmente.

Quando eu disse, logo no início desse texto, sobre a Palavrear ser uma dádiva de descobertas para leitores, é sobre o que uma livraria de rua pode proporcionar: clubes de leitura que nos possibilitam leituras fora das nossas habituais, livros que nos encontram quando não os procuramos, leituras fora das nossas rotas.

Assim, fica o convite para conhecer nossos clubes: Clube Palavrear de Literatura Contemporânea e Clube de Poesia.