Senador Delcídio do Amaral faz delação premiada e incrimina Lula da Silva e Dilma Rousseff

03 março 2016 às 12h49

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O depoimento do senador do Mato Grosso do Sul é o mais forte em relação à presidente da República e um dos mais fortes em relação ao ex-presidente
A “IstoÉ” é responsável pelo furo da semana, com a reportagem “A delação de Delcídio”, da jornalista Débora Bergamasco. Todos os outros veículos, até as concorrentes, comeram poeira e tiveram de mencionar a revista. O senador Delcídio do Amaral, do PT do Mato Grosso do Sul, era um dos políticos mais próximos tanto do ex-presidente Lula da Silva quanto da presidente Dilma Rousseff. Era da cozinha, ou quase. Agora, fez delação premiada, que está à espera de ser homologada pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal. Por certo, terá de apresentar as provas do que diz, embora ele próprio seja uma prova viva. Na delação, corrobora o que já foi divulgado pela imprensa sobre a Operação Lava Jato e outras operações e acrescenta informações de bastidores — de quem privada da intimidade do poder petista, de quem, na verdade, era parte do poder petista. Se o petismo disser que o senador petista mente, o que estará dizendo é que os petistas apreciam andar em companha de mentirosos. O que certamente vão fazer, orientados por advogados gabaritados, é atenuar as declarações de Delcídio do Amaral e, possivelmente, sugerir que está ressentindo e, como tal, pretende se vingar daqueles que, supostamente, não lhe deram a mão quando foi preso pela Polícia Federal com autorização do STF.
É provável que Delcídio do Amaral está dizendo a verdade — até porque sabe que tudo que disse será investigado e comparado — e que esta precisa ser tão-somente matizada pelas provas, conectando outros depoimentos e documentos.
A delação de Delcídio do Amaral sugere que uma espécie de gangsterismo ronda parte significativa do PT. A presidente Dilma Rousseff sempre diz que não tem nada a ver com nenhum esquema de corrupção. O senador diz que não é bem assim. O relato da “IstoÉ”: “Segundo Delcídio, Dilma tentou por três ocasiões interferir na Lava Jato, com a ajuda do ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. ‘É indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e da própria presidente no sentido de promover a soltura de réus presos na operação’” (Lava Jato).
Como o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, não quis participar de nenhuma ação para liberar presos da Operação Lava Jato (ele teria sido sondado por Dilma Rousseff, em Portugal), encontraram outra “solução”: “A nomeação do desembargador Marcelo Navarro para o STJ. ‘Tal nomeação seria relevante para o governo’, pois o nomeado cuidaria dos ‘habeas corpus e recursos da Lava Jato no STJ’”.
Delcídio do Amaral teria conversado com Dilma Rousseff a respeito do assunto, no Palácio do Alvorada. “Dilma solicitou que Delcídio, na condição de líder do governo, ‘conversasse com o desembargador Marcelo Navarro, a fim de que confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo Odebrecht e de Otávio Marques de Azevedo’, da Andrade Gutierrez. Conforme acertado com a presidente, Delcídio se encontrou com Navarro ‘no próprio Palácio do Planalto, no andar térreo, em uma pequena sala de espera, o que, segundo o senador, pode ser atestado pelas câmeras de segurança. Na reunião, de acordo com Delcídio, Navarro ‘ratificou seu compromisso, alegando inclusive que o dr. Falcão (presidente do STJ, Francisco Falcão) já o havia alertado sobre o assunto’”.
Segundo a revista, “o acerto foi cumprido à risca”. Durante julgamento no STJ, o ministro Marcelo Navarro votou pela soltura dos executivos Marcelo Odebrecht e de Otávio Marques de Azevedo. Mas o STF optou por manter a prisão por 4 votos a 1. “IstoÉ” frisa que, a ação de Dilma Rousseff, se confirmada, indica o “falecimento” dos discurso de “liberdade de atuação da Lava Jato”.
Refinaria de Pasadena
Em 2006, a Petrobrás comprou a refinaria de Pesadena, no Texas, por 792 milhões de dólares. Dilma Rousseff sempre alegou que não tinha conhecimento das cláusulas que eram desfavoráveis à Petrobrás. A presidente é contestada pela delação de Delcídio do Amaral: “Dilma tinha plena conhecimento de todo o processo de aquisição da refinaria. (…) A aquisição foi feita com conhecimento de todos. Sem exceção”.
Dilma Rousseff e Nestor Cerveró
Quem é o “pai” (ou a “mãe”) de Nestor Cerveró no governo petista. Depois de sua prisão, nem os padrastos querem assumi-lo. Mas Delcídio do Amaral contra uma história diferente. Ele garante que Dilma Rousseff foi decisiva na nomeação dele para a diretoria da BR Distribuidora.
Na delação premiada, Delcídio do Amaral afirmou que “tem conhecimento” da “ingerência” da presidente, “tendo em vista que, no dia da aprovação pelo Conselho, estava na Bahia e recebeu” duas “ligações de Dilma”.
“Na primeira” ligação, “a presidente telefonou ‘perguntando se o Nestor já havia sido convidado para ocupar a diretoria financeira da BR Distribuidora’. (…) Depois, ligou novamente, confirmando a nomeação de Nestor para o referido cargo”. O executivo foi nomeado em março de 2008.
Pagamentos a Nestor Cerveró
Como Nestor Cerveró pretendia fazer delação premiada, o grupo de Lula da Silva desesperou-se e procurou Delcídio do Amaral para negociar um acordo com sua família. Na delação premiada, o senador contou que “o mandante dos pagamentos à família Cerveró foi o ex-presidente Lula. Segundo Delcídio, Lula pediu ‘expressamente’ para que ele ajudasse o amigo e pecuarista José Carlos Bumlai, porque ele estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor Cerveró. Bumlai, segundo o senador, gozava de ‘total intimidade’ e exercia o papel de ‘consigliere’ da família Lula”.
Na delação está registrado: “No caso, Delcídio intermediaria o pagamento de valores à família de Cerveró”. O senador, após conversar com Lula da Silva, acertou intermediar a operação. “Depois de receber a quantia de Maurício Bumlai [filho de José Carlos], a primeira remessa de 50mil reais foi entregue em mãos pelo próprio Delcídio ao advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, também preso pela Lava Jato”. Ao todo, a família de Cerveró teria recebido 250 mil reais.
Lula pode ser preso?
A “IstoÉ” relata que procuradores que tomara o depoimento de Delcídio do Amaral admitem que a gravidade das denúncias “pode justificar a prisão do ex-presidente Lula”. Se o operador, Delcídio do Amaral, foi preso, por que o mandante não pode ser preso?
Marcos Valério e 220 milhões de reais
Delcídio do Amaral contou, na delação premiada, que, para ficar calado, Marcos Valério exigiu 220 milhões de reais. O dinheiro teria sido prometido por Paulo Okamoto, homem do staff de Lula da Silva. O senador teria alertado Lula da Silva: “Acabei de sair do gabinete daquele [Paulo Okamoto] que o senhor enviou a Belo Horizonte. Corre, presidente, senão as coisas ficarão piores do que já estão”. Lula da Silva teria corrido e colocado Antônio Palocci para renegociar o caso. O fato teria ocorrido em 2006.
Marcos Valério não recebeu 220 milhões de reais. Mas, como calou-se, Delcídio do Amaral avalia que recebeu uma bolada alta.
Mensalão e Lula
Em 5 de abril de 2006, Delcídio do Amaral “disse ter testemunhado ‘as tratativas ilícitas para retirada do relatório (final da CPI dos Correios) dos nomes de Lula e do filho Fábio Luís Lula da Silva em um acordão com a oposição”. Isto evitou o impeachment de Lula da Silva.
José Dirceu disse uma frase que se tornou clássica: “Pode checar quem ia à Granja do Torto aos domingos. Te garanto que não era eu”. Quem frequentava a Granja do Torto eram Delúbio Soares e Marcos Valério.
CPI do Carf e o filho de Lula
A compra de medidas provisórias está sendo investigada pela CPI do Carf, o que, segundo Delcídio do Amaral, preocupa Lula, devido o envolvimento de seu filho Luís Cláudio Lula da Silva. O senador frisa, na delação, que, “por várias vezes, Lula solicitou a ele que agisse para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor”. Eles deram ao menos 1,5 milhão da Luis Claudio.
CPI dos Bingos
A CPI dos Bingos empolgou o Congresso, mas não deu em nada. Porque, segundo Delcídio do Amaral, “uma das maiores operações de caixa 2 para a campanha de Dilma em 2010 foi feita através do empresário Adir Assad. (…) Orientado pelo tesoureiro de campanha de Dilma, José Di Filippi, os empresários faziam contratos de serviços com as empresas de Assad, que repassava recursos para as campanhas eleitorais. (…) Quando o governo percebeu que as várias quebras de sigilo levariam à campanha” de “Dilma “em 2010” determinou-se “o encerramento dos trabalhos”.