Repórteres lamentam que ninguém se comova com aquilo que é trágico em longo prazo e, portanto, pode ser protelado

Reunião da Comissão Mista em que o relatório final do Plano Diretor de Goiânia foi votado e aprovado depois de seu envio por WhatsApp | Foto: Reprodução

Uma das grandes artes – melhor seria dizer “dos grandes dramas” – do jornalismo é conseguir levar informações as mais corretas e compreensíveis possíveis sobre assuntos técnicos de grande relevância para toda uma população.

Primeiramente, porque é preciso ser meticuloso com os dados, às vezes áridos demais, de modo a não se deixar levar por uma interpretação errônea e já gerar, de início, algum equívoco fatal. Depois, porque será preciso “traduzir” a matéria para o leitor, alguém que não tem todo o tempo do mundo para estudar aquele assunto de forma mais profunda e que confia no veículo para se manter atualizado com as notícias.

Por isso é famosa aquela expressão “jornalista é um especialista em generalidades”. Ao contrário do que é o pesquisador PhD em alguma coisa – cuja coisa ele vai saber mais do que todos –, o profissional da imprensa sabe pouco de quase tudo.

Que ninguém espere, portanto, entender a problemática da imunidade cruzada em meio a uma pandemia com uma matéria de uma página numa quarta-feira. Mas, sim, o repórter vai entrevistar um pesquisador e, a partir daí deve – sempre com o devido cuidado, ressalte-se – repassar ao leitor o básico sobre aquele tema. Para isso, naturalmente, será preciso primeiramente ter o mínimo de conhecimentos interdisciplinares obre diversas áreas: matemática, saúde coletiva, biologia humana (fisiologia, virologia, genética etc.).

E ainda há uma questão mais sombria para o jornalista: estar diante de um tema relevante, mas que não causa impacto direto para as pessoas. Um aumento de impostos é algo contra qual a população se indigna já de começo e procura detalhes sobre alíquotas, deduções, bitributação etc.

Esse não é o caso do Plano Diretor de Goiânia. O documento que dá as diretrizes sobre como será a ocupação da cidade, onde podem ser abertos novos adensamentos, que áreas serão protegidas, como ficarão os corredores de transporte. Tudo que, de fato, impacta no dia a dia do cidadão, desde a hora que acorda até na hora em que acorda de novo, porque obviamente até seu sono pode ser afetado pelas decisões sobre a cidade.

Depois de um atraso de cinco anos na revisão do Plano Diretor, a Câmara de Goiânia está finalmente votando o documento. Mas o quadro é de horror: a proposta foi recolhida ainda em 2020 pela Prefeitura, por determinação do então prefeito Iris Rezende, e de lá só saiu no fim de novembro, quando então uma série de emendas não discutidas com a sociedade foram enfiadas no relatório final – que nunca foi colocado à disposição de todos em um site público, por exemplo, no da própria Casa legislativa.

Então, após uma espera desde 2017, os vereadores goianienses resolvem votar tudo com uma pressa digna de quem está fugindo da enchente – que, aliás, podem se agravar na capital justamente por conta das mudanças chanceladas pelos parlamentares na comissão mista. O único vereador que parece disposto a conter a sangria desatada pela aprovação relâmpago do projeto é Mauro Rubem (PT), que por duas vezes conseguiu parar o processo por meio de liminares judiciais.

Em meio a isso, o destino da população, que, ao contrário do apelo do IPTU ou do ICMS, não se comove. Por mais que as reportagens denunciem as manobras políticas e as consequências para a cidade com o destino traçado para ela com essas manobras, as pessoas ignoram o tema, a não ser em algumas bolhas de profissionais da área – arquitetos, engenheiros etc. –, interesse econômico – empreendedores imobiliários, incorporadoras, corretores etc. – e poucas associações de bairros.

Tal cenário fez o repórter Vandré Abreu, do jornal O Popular, que cobre a trajetória do Plano Diretor desde o início a desabafar nas redes sociais, usando sua conta no Twitter:

https://twitter.com/vandreabreu/status/1478823504728498177

O desabafo é plenamente entendido por quem cobre a área. Lidar com questões ambientais é realmente uma missão inglória. Está aí, para não deixar ninguém mentir, o cenário das mudanças climáticas, comendo o futuro do planeta pelas beiradas, por não ser algo que ocorre imediatamente.

Registre-se aqui, também, além do Pop – com Vandré e também sua colega Elisama Ximenes – o bom trabalho da Rádio Sagres AM na cobertura, liderado por Cileide Alves. Ela, na emissora ou nas redes sociais, está informando o passo a passo do que ocorre no processo. Notícias que são, na verdade, denúncias, tal a situação de escárnio com que está sendo conduzido o Plano Diretor.

Por fim, planejamento urbano, meio ambiente e discussão da cidade são também prioridades do Jornal Opção, que, com sua equipe, está destacando o que vem ocorrendo na tramitação do Plano Diretor.