Colunista da “Folha de S. Paulo” perdeu cargos e altos salários, mas não se dobrou ao poder de Ricardo Teixeira

Juca Kfouri é um comentarista esportivo, num país avesso à crítica mas apaixonado pela futrica, que desgosta os dirigentes poderosos. Consta que o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) Ricardo Teixeira, conhecido como Homem Processo (processa seus críticos com frequência), prefere ver o cão comendo pequi numa encruzilhada do que se encontrar com o colunista da “Folha de S. Paulo” e comentarista do UOL. Enfrentando advogados poderosos, com recursos parcos, Juca Kfouri nunca recuou um milímetro — aliás, se o fez alguma vez, foi por recomendação de advogados astutos — nas suas críticas contundentes.

Por não renunciar à crítica, que sempre faz de maneira direta, com elegância mas sem subterfúgios, Juca Kfouri perdeu espaço na TV Globo e em outros meios de comunicação, exceto na “Folha de S. Paulo”, que nunca o demitiu, apesar de, possivelmente, ter recebido pressões. Como não quis (e não quer) fazer parte do coro dos contentes, dos que cedem metros e até quilômetros — para manter empregos e salários (Galvão “Globo” Bueno jamais teria coragem de pôr em risco seus 2,5 milhões mensais) —, o jornalista perdeu espaço consagrador e, sobretudo, muito dinheiro nos últimos anos.

Aos 67 anos, José Carlos Amaral Kfouri, Juca, nascido em São Paulo, lança o livro “Confesso Que Perdi — Memórias” (Companhia das Letras, 248 páginas). O título parece derrotista, mas não é. Porque as derrotas de Juca Kfouri foram também, e sobretudo, vitórias da ética. Perdeu espaço (cargos). Perdeu dinheiro. Mas não perdeu a decência. O saldo, com derrotas e tudo mais, é positivo.

Pelé e Juca Kfouri: um foi craque em campo; o outro é craque fora de campo

Juca Kfouri cobriu as Copas do Mundo de Futebol de 1982 a 2014. Isto diretamente. De uma redação, cobriu também as Copas do Mundo de 1970, 1974 e 1978. Ele foi diretor de redação da revista “Placar” nos seus melhores momentos. Sob sua batuta, a publicação da Editora Abril denunciou a “máfia da loteria esportiva” e editou uma série de reportagens quentes que, de uma forma ou de outra, contribuíram para melhorar o futebol patropi.

Como diretor da revista “Playboy”, além de pôr mulheres maravilhosas na capa, Juca Kfouri bancou a reportagem que revelou quem era Alcides Caminha, o pacato funcionário público que, como criador artístico, era Carlos Zéfiro. Ele era parceiro de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito.

No livro, Juca Kfouri conta que, em 1977, quando o Corinthians sagrou-se campeão paulista, depois de um jejum de 20 anos, comemorou como qualquer outro torcedor. “Não sei como, fui parar no gramado do Morumbi, com uma bandeira na mão, bandeira que não levara ao estádio e não me recordo de ter comprado”, revela.

Sem papas na língua, Juca Kfouri revela suas venturas e desventuras. O lançamento está previsto para setembro, mas já pode ser pedido no site das livrarias.

Política

Quanto às posições políticas de Juca Kfouri, um homem de esquerda, é outra questão. Pode-se não simpatizar com ele — no mais das vezes, é equivocado (do ponto de vista de seus críticos) — e com elas, mas, quanto ao jornalista esportivo, não se pode questionar sua decência e sua capacidade de criticar com o máximo de precisão e correção.