Nas redes sociais atualmente, o que mais há são jornalistas criticados por tomar partido. Mas pode ou não pode?

Manifestantes a favor de Jair Bolsonaro fazem apologia da cloroquina | Foto: Reprodução

Nas redes sociais, são cada vez mais comuns comentários em perfis de veículos e profissionais de comunicação condenando a “parcialidade” do conteúdo emitido. Mas jornalista tem de ser imparcial em tudo, o tempo todo? Afinal, não diz a ética profissional que é preciso, em toda matéria, “ouvir” os dois lados e evitar se posicionar?

Primeiramente, seria preciso diferenciar os gêneros jornalísticos. A comunicação é informativa, mas também opinativa. Considerando esses gêneros como os dois grandes “galhos” da árvore comunicação, os ramos, em cada uma, seriam: subgêneros informativos – nota, notícia, coluna, reportagem, perfil, entrevista etc.; subgêneros opinativos – editorial, artigo, análise, resenha, coluna, carta, crônica etc.

Por exemplo, este espaço é uma coluna, chamada Imprensa, em que os colunistas podem formular textos de informação ou de opinião. Não necessariamente, no entanto, a opinião do autor coincide com a do veículo – por isso, a coluna vem sempre assinada.

Nas redes sociais, o que mais há são jornalistas de vários veículos tomando partido e, tanto quanto isso, sendo criticados pela atitude. Ora, não sendo sua página pessoal ligada ao veículo em que atua, o profissional pode expor seu pensamento livremente, assim como deve arcar – e não o veículo – com todas as eventuais consequências judiciais.

O veículo em si também pode emitir sua opinião – e para isso existem os editoriais. Já a informação, no entanto, não deveria ser enviesada para um lado ou para outro. Mas os tempos mudaram – porque coisas que não tinham lado passaram a ter. As últimas décadas se tornaram ao mesmo tempo pródigas em desinformar com a mesma eficácia, mas em sentido contrário, ao ofício do jornalista.

Não só no Brasil, mas no mundo todo, grupos cada vez mais organizados para postar e espalhar contrainformação de forma rápida e eficiente. Aqueles que não acreditam na emergência climática, na ação das vacinas e na esfericidade da Terra se comunicam rapidamente por meio de um simples aplicativo. Assim tão fortes como as notícia são, hoje, as fake news. Pior: há veículos de comunicação com concessão pública – ou seja, com regras que prezam a verdade das informações e responsabilidade social – que se abrem a debater fatos já constatados.

Pior ainda: com a ideia de ser “imparcial” ou “equilibrado”, mesmo os que cumprem sua função também tropeçam. Foi o caso de um desastroso debate sobre a pandemia promovido pela GloboNews, em que convidaram, para expor suas ideias, os ex-ministros da Saúde Luiz Mandetta e Nelson Teich e o deputado e bolsonarista Osmar Terra (MDB-RS). Todos médicos, mas o último um já então conhecido negacionista, famoso por errar previsões sobre o número de mortos e o fim da crise sanitária. Deram a ele um espaço nobre para contestar dados científicos. Seria o mesmo que colocar, lado a lado, um astronauta da Nasa e um físico militante do movimento da terra plana: não é por ter diploma que a pessoa passa a ter autoridade, mas pelo que faz de seu diploma.

No cenário pandêmico, não há por que querer “equilibrar” versões. A vacina é uma realidade a favor da humanidade e é preciso que a sociedade se mobilize para cobrar a imunização de todos no planeta. E a imprensa é uma instituição da sociedade. Nesse sentido, como no combate de toda ideologia totalitária, é dever da imprensa informar da melhor forma possível, o que significa cada vez mais não ceder espaço à desinformação: não há que dar espaço para quem desafia os consensos físicos, químicos e biológicos alentando uma teoria da conspiração da “big pharma”, da “China comunista” ou dos “bilionários globalistas”.

Em outras palavras: é dever da imprensa, por sua função social, ser “parcial” em favor do combate ao aquecimento global, da vacinação em massa e de forma rápida e da denúncia de crimes humanitários. Não há dois lados em situações como essas, embora o grupo que cobre esse tipo de “democracia”, esteja cada vez mais radicalizado e, infelizmente, volumoso.