Entenda por que o filme “Não Olhe Para Cima” é excelente, inteligente e divertido

06 janeiro 2022 às 09h37

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É o Borat saindo do Cazaquistão do ano 22. É menos debochado, mais moderno e bem trabalhado. É o “Bacurau” bem-feito, coroado com Leonardo DiCaprio e Meryl Streep
João Paulo Teixeira
Especial para o Jornal Opção

A Netflix vive criando a teoria da agenda do mundo moderno. E vai criar outras mais. Foi assim com o bom “Round 6”, o médio “O Poço” e agora faz a mesma fórmula dos ingleses de 1960 com o estrelado “Não Olhe Para Cima”. Só que o da vez é muito melhor. Reafirmo: o filme é excelente.
Explico: você já viu franquias estilo “Todo Mundo em Pânico”? São tantos e bons roteiristas que fazem da paródia um produto muito melhor que os filmes originais.
Vai um exemplo: a geração Y certamente se lembra mais da cena da “Samara dançando tik tok” do que propriamente da “Samara que sai do poço”, a cena icônica do clássico do terror japonês e, depois, do cinema ocidental.
É isso que vale no mundo das redes sociais. Ícones. O que viraliza é o que fica nas retinas e nas telas. As musiquinhas, idem.

“Não Olhe Para Cima é uma confluência de conteúdos que só um país democrático e livre poderia produzir. Só EUA, Alemanha, França, Inglaterra e Brasil seriam capazes produzi-lo com tantos escrachos.
Arrisco a ir enumerando-os. Ele é o Borat saindo do Cazaquistão (isso mesmo, Borat… rsrs) do ano 22. É menos debochado, mais moderno e bem trabalhado. É o “Bacurau” bem-feito, coroado com Leonardo DiCaprio e Meryl Streep.
“Não Olhe Para Cima” tem tudo que só países maduros podem produzir: uma “zueira” (zueira com u mesmo) comum, ampla, gigantesca e coletiva. Não se poupa ninguém. Nem a humanidade, que dança com um tambor para impedir uma pedrada espacial.
Todos são metralhados. Escapa ninguém. A Nasa, famosa salvadora da humanidade em filmes como “Armagedom”, “Impacto Profundo” e “Independence Day”, segue esculachada. Ninguém a chama e, quando vem, não sai com nada.
O chefe do instituto é desconhecido, a logo da diretoria ninguém sabe, ninguém nunca viu. O general do Pentágono rouba lanches, nas faculdades medianas (como se fossem uma UFG ou Federal do Paraná — em comparação simples com a americana citada) ninguém confia.

Sem falar nos políticos. A presidente dos EUA é zoada como Hilary (repare a foto dela abraçando o Bill Clinton). Também é de uma verossimilhança incrível com o ex-presidente Donald Trump e seu exército de republicanos.
É ainda cópia mal-feita das Sarah Palin da vida, ex-governadora do Alasca sempre metida em casos homéricos e poses com armas. É tudo isso junto, somada à sua equipe brancaleonesca.
A lista é grande. O cientista bonitão (como isso fosse possível, uma espécie de Clark Kent) segue ludibriado pelo canto da sereia do poder e da televisão. Essa, a TV, tem seus programas noticiosos e de entretenimento jogados na lata do obtuso.
O caso da jornalista e do cientista é isso, olhado de fundo: a junção de dois mundos, do subúrbio, e o glamour, que só se beijam às escondidas, unindo os beiços na mediocridade.
Tem mais zoeiras. A cientista que batiza o meteoro vai trabalhar como caixa de supermercado. O skatista é crente, um pregador fervoroso. A família americana média, que acredita que o meteoro salvará empregos e a economia. Uma pedra espacial aparece cavalgando o mito do herói.
Ninguém é poupado. Tem cacete na moleira da Apple, no protótipo de Steve Jobs, Elon Musk e “Pedros Biais”. Tudo é uma mistura de coachs, profecias, naves espaciais e celulares.
Ah, tem o final, a pergunta final. Ela é deixada no ar num salto maior aos que deram aos macacos de Kubrick em 2001, a odisseia no espaço: 22 mil anos depois a humanidade poderia voltar e lutar com os Bronteroc?
Não, parece que não.
Mas, acredite, vale a pena assistir essa peleja.
João Paulo Teixeira, jornalista e publicitário, é publisher da Mind Digital propaganda.
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