Demissões na Globo são “castigo” porque a emissora “fez o L”?
16 abril 2023 às 00h15
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Antes de tudo, em relação ao título do texto, é preciso pontuar: demissão sempre será castigo maior para o demitido do que para quem demite. O empregado é sempre um assalariado que depende de sua força de trabalho para sobreviver, ainda que seja contratado da Rede Globo e mais bem remunerado do que 99% da população ativa brasileira.
Ocorre que, nas últimas semanas, um passaralho tamanho família vem assolando as bandas do Jardim Botânico, bairro onde fica a sede da TV no Rio de Janeiro. Na verdade, colocar apenas a sede carioca como local do “abatedouro” é modo de dizer, já que a emissora está fazendo a operação de enxugamento de quadros também em suas unidades de São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Distrito Federal.
Muitas carinhas conhecidas de décadas, dos departamentos de jornalismo e de esportes, vão sumir da telinha da Vênus Platinada: entre elas, as do narrador Cléber Machado, de competentes repórteres como Régis Rösing, Giuliana Morrone, Giovana Teles, Marcelo Canellas (premiadíssimo, diga-se), Flávia Jannuzzi e Mônica Sanches, do comentarista esportivo Maurício Noriega, entre tantos outros. E todos com décadas de casa.
Nos círculos bolsonaristas (por natureza militantes anti-Globo, como o personagem que dá nome ao movimento), o corte sistemático – e, diga-se, por vezes até desrespeitoso na forma com que se dá – dos profissionais é ligado ao fato de a empresa supostamente ter apoiado Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais. “Faz o L agora”, é a frase que circula em resposta a cada anúncio de mais comunicadores demitidos.
A Globo não está sendo “punida” pela conjuntura de um governo petista, como quer insinuar o discurso bolsonarista
Pode-se até dizer, com razão, que a Globo quis ver Jair Bolsonaro (PL) fora do poder, mas também é certeiro afirmar que a relação da emissora com Lula nunca foi nem próxima de uma aliança. Pelo contrário – e as duas maiores provas são a edição do último debate do petista no segundo turno das eleições presidenciais contra Fernando Collor, em 1989, e a campanha pró-Lava Jato que levou à derrocada do PT no poder, com a destituição de Dilma Rousseff da Presidência e a prisão de Lula por um juiz que depois seria considerado suspeito, Sergio Moro.
A Globo não está sendo “punida” pela conjuntura de um governo petista, como quer insinuar esse discurso. Na verdade, todas as TVs, não só do Brasil, mas do mundo, sofrem com uma novidade deste século: a concorrência da internet e, em especial, das operadoras de streaming.
Faça você a conta de quanto tempo passava em frente à televisão e quanto hoje você gasta no mesmo passatempo. Não que provavelmente você não fique mais diante de uma tela: apenas que, agora, ela é diminuta e pode ser transportada para qualquer lugar.
Cada vez mais empresas preferem anunciar na internet e não na TV. Como sustentar a mesma folha de pagamento e os mesmos gastos em geral de uma empresa gigante? É inviável.
Outra faceta das demissões é a necessidade periódica de reestruturar a própria equipe: há novos profissionais chegando com grande competência e domínio das novas tecnologias e do formato adequado para o telejornalismo nestes tempos. Se a emissora conseguir mesclar esses talentos com a experiência dos nomes já conhecidos e também talentosos, vai ter tido sucesso na dura tarefa de se “podar”.