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Não há tanques capazes de esconder que, na atual guerra, morreram quase 600 mil brasileiros e há milhares de outros doentes

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Voto impresso, Lula e CPI da pandemia

Jair Bolsonaro, sem partido, sabe que não dá para esconder um gigante — a apuração da CPI da pandemia — com algo mignon, o voto impresso. Pode-se manipular incautos, com a ação eficaz dos mictórios do ódio, mas o presidente sabe que as urnas eletrônicas, ao contrário do que diz, evitam fraudes.

O fato — a questão objetiva — é que o chefe do governo federal não apresentou provas, sequer uma, de que as urnas eletrônicas possam ser fraudadas.

O grito, de Edvard Munch

Se um presidente, com toda a estrutura ao seu dispor, não tem como provar quer as urnas são devassáveis, fraudáveis, quem poderia? Ninguém, claro.

O que, verdadeiramente, Bolsonaro teme? Tudo indica que o presidente está preocupado com a possibilidade de Lula da Silva ser eleito presidente no primeiro turno. Uma vitória do petista libera a Polícia Federal e o Ministério Público Federal — hoje, às portas de fazer advocacia para Bolsonaro e sua família — para investigarem tanto o presidente quanto seu filho Flávio Bolsonaro e alguns aliados.

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Tanques são ameaça à democracia
Tanques no Planalto | Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo

Democratas não ameaçam a democracia com o fim das eleições. Não há democracia sem eleições. Portanto, Bolsonaro está ameaçando a democracia, sugerindo que planeja contorná-la para continuar no poder.

A pior democracia é melhor do que qualquer ditadura. Não há ditadura benigna. Quando perguntado por qual motivo havia decidido acabar com a ditadura civil-militar, produzindo a distensão — que levou à Abertura —, o presidente e general Ernesto Geisel disse: porque havia se tornado uma bagunça.

Os tanques das Forças Armadas, na porta dos poderes — Judiciário, Legislativo e Executivo —, é uma exibição de força de Bolsonaro. O presidente está dizendo, com os tanques, que pode, a qualquer momento, dar um golpe de Estado e acabar com a democracia.

Pintura de Goya

Não há nenhuma coincidência entre o desfile militar e a votação da PEC do voto impresso, auditável. Não dá para esconder um elefante. Só o senador Jorginho Mello parece acreditar em coincidências, como se não conhecesse a história do Brasil.

Jorginho Mello e o senador Luis Carlos Heinze falam de corrupção ocorrida no passado, mas esquecem de informar que o Centrão, que “contaminou” o governo de Lula da Silva e Dilma Rousseff, ocupa cargos de alto mando no governo de Bolsonaro. Cadê a “santidade”?

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Corrupção no governo de Bolsonaro

Há indícios fortes de corrupção no Ministério da Saúde. As denúncias devem ser investigadas. O presidente Jair Bolsonaro, se nada teme, deveria incentivar a CPI da Pandemia. Deveria exigir uma investigação a fundo. Porque, se não houver contaminação sistêmica, poderá sair, ao fim da CPI, com um atestado de idoneidade.

Mas o marketing do voto auditável não tem como esconder a CPI da Pandemia e seus resultados.

Não dá para esconder que 564 mil brasileiros morreram devido à Covid-19. Não há tanques que possam esconder que há uma guerra em curso. Além dos mortos, mais de meio milhão, há milhares de brasileiros internados e vários outros com sequelas físicas e mentais — às vezes sem a assistência adequada. Adiante, muitos tendem a morrer em decorrência de complicações derivadas da Covid-19, mas nos atestados de óbito devem figurar “AVC”, “tromboembolias” etc.

No caminho com Maiakóvski, de Eduardo Alves da Costa

Assim como a criança

humildemente afaga

a imagem do herói,

assim me aproximo de ti, Maiakóvski.

Não importa o que me possa acontecer

por andar ombro a ombro

com um poeta soviético.

Lendo teus versos,

aprendi a ter coragem.

Tu sabes,

conheces melhor do que eu

a velha história.

 

Na primeira noite eles se aproximam

e roubam uma flor

do nosso jardim.

E não dizemos nada.

Na Segunda noite, já não se escondem:

pisam as flores,

matam nosso cão,

e não dizemos nada.

Até que um dia,

o mais frágil deles

entra sozinho em nossa casa,

rouba-nos a luz, e,

conhecendo nosso medo,

arranca-nos a voz da garganta.

E já não podemos dizer nada.

 

Nos dias que correm

a ninguém é dado

repousar a cabeça

alheia ao terror.

Os humildes baixam a cerviz;

e nós, que não temos pacto algum

com os senhores do mundo,

por temor nos calamos.

No silêncio de meu quarto

a ousadia me afogueia as faces

e eu fantasio um levante;

mas amanhã,

diante do juiz,

talvez meus lábios

calem a verdade

como um foco de germes

capaz de me destruir.

 

Olho ao redor

e o que vejo

e acabo por repetir

são mentiras.

Mal sabe a criança dizer mãe

e a propaganda lhe destrói a consciência.

A mim, quase me arrastam

pela gola do paletó

à porta do templo

e me pedem que aguarde

até que a Democracia

se digne a aparecer no balcão.

Mas eu sei,

porque não estou amedrontado

a ponto de cegar, que ela tem uma espada

a lhe espetar as costelas

e o riso que nos mostra

é uma tênue cortina

lançada sobre os arsenais.

 

Vamos ao campo

e não os vemos ao nosso lado,

no plantio.

Mas ao tempo da colheita

lá estão

e acabam por nos roubar

até o último grão de trigo.

Dizem-nos que de nós emana o poder

mas sempre o temos contra nós.

Dizem-nos que é preciso

defender nossos lares

mas se nos rebelamos contra a opressão

é sobre nós que marcham os soldados.

 

E por temor eu me calo,

por temor aceito a condição

de falso democrata

e rotulo meus gestos

com a palavra liberdade,

procurando, num sorriso,

esconder minha dor

diante de meus superiores.

Mas dentro de mim,

com a potência de um milhão de vozes,

o coração grita — MENTIRA!