Apenas o jornal cearense O Povo lembrou da coincidência da terça-feira (17/4), quando o senador mineiro se tornou acusado de corrupção passiva e obstrução à Justiça em data igual à da admissibilidade do impedimento contra Dilma na Câmara em 2016

Senador Aécio Neves (PSDB-MG) fala à imprensa momentos depois de se tornar réu no STF por corrupção passiva e obstrução à Justiça | Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Não fosse o jornal cearense O Povo, que na tarde de terça-feira (17/4) noticiou “Aécio vira réu no aniversário de 2 anos da votação do impeachment de Dilma na Câmara”, passaria batida a coincidência de datas entre a admissibilidade do processo de impedimento contra a ex-presidente petista em 17 de abril de 2016 e a abertura de processo pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) pelas acusações de corrupção passiva por unanimidade (5 a 0) e obstrução à Justiça (4 a 1) em desfavor do senador do PSDB mineiro.

Aécio e Dilma, além de terem disputado a eleição presidencial que dividiu o Brasil em 54 milhões de votos contra 50 milhões – que deu o primeiro sinal do fortalecimento da polarização política que o País enfrenta até hoje -, também estavam em lados opostos no processo de impeachment. Enquanto a petista tentava se defender das acusações de ter cometido crimes de responsabilidade no cargo de presidente da República, o tucano atuava como um dos principais articuladores no Congresso Nacional da destituição da ex-adversária nas urnas menos de dois anos depois da derrota nas urnas.

Veja o que dizia Aécio sobre a destituição de Dilma do cargo de presidente da República pelo Senado ao final do processo de impeachment, em 31 de agosto de 2016:

Mesmo destituída e tratada pela maioria dos deputados federais e senadores como corrupta durante o processo de impeachment, Dilma – ao menos até o momento – não é alvo de processo. Já Aécio viu a presidência do PSDB nacional ser tirada dele em dezembro de 2017, foi afastado pelo STF do cargo, retornou com ajuda dos parlamentares e se tornou réu pelo recebimento de R$ 2 milhões em quatro parcelas de Joesley Batista, da JBS, ao lado da irmã Andrea Neves, do primo Frederico Pacheco e do ex-assessor do senador Zezé Perrella (MDB-MG), Mendherson de Souza Lima.

“Agora, o que eu tenho certeza que o meu governo jamais fez foi compactuar com a corrupção. Entro num tema que acho sério, que é o sincericídio do ministro por um mês, do Planejamento, o senador [Romero] Jucá (MDB), quando disse que tinha que estancar a sangria e usou palavras, assim, pornográficas para descrever as relações políticas no Brasil”, disse a petista na entrevista “A segunda torre de Dilma”, publicada em 17 de março de 2017 pelo jornal Valor Econômico.

Em sua defesa, Aécio diz que provará sua inocência. “Estou sendo acusado tendo como base uma ardilosa armação de criminosos confessos, aliados a membros do Ministério Público, que construíram um enredo para aparentar que cometi alguma ilegalidade. Não cometi crime algum”, afirmou o senador após virar réu no STF.

A diferença de 2014, quando enfrentou Dilma nas urnas, e 2016, quando era uma das figuras mais atuantes da oposição ao governo do PT no processo de impeachment – inclusive com pedido de recontagem de votos nas eleições presidenciais -, o tucano mineiro vive um quase ostracismo. Além da ação aberta na terça contra o mineiro, o senador tucano ainda é alvo de oito investigações.

Ao ponto de sua pré-candidatura ao Senado em Minas Gerais estar tão abalada que não surpreenderá ninguém se Aécio optar por concorrer a uma vaga na Câmara dos Deputados. Sem contar o risco de que o ruído político da abertura de processo contra o neto de Tancredo Neves no STF possa diminuir a chance do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), possível concorrente ao governo em Minas, manter sua força na corrida eleitoral pelo Executivo estadual.

Parte correta

Em uma coisa Aécio estava correto na entrevista concedida após a sessão do Senado que destituiu Dilma: a política econômica da petista foi catastrófica. E que pode ter sido agravada pela atuação do “quanto pior melhor” do Congresso para derrubar a adversária política com pouca habilidade de gestão.

Agora resta ao senador e sua defesa tentarem comprovar, quando for analisado o mérito do processo contra Aécio no STF, se o mineiro continua a dizer a verdade sobre sua honestidade ou se o que o tucano falou no pronunciamento do dia 11 de maio de 2016 – sessão que afastou horas depois Dilma temporariamente da presidência da República – não passava de encenação protagonizada por um político corrompido a atender o interesse de poder pessoal ou de um grupo.

“Foram os brasileiros, em primeiro lugar, que foram às ruas em todas as partes do Brasil sem exceção para dizer um basta em definitivo a tanto desprezo à verdade, à ética e à correção na gestão da coisa pública”, discursava Aécio há quase dois anos. Confira no vídeo: