Depois que se tornou público o desaparecimento do submarino Titan, da empresa de turismo OceanGate, o assunto dominou os noticiários. A vida dos cinco passageiros (o piloto e os outros quatro passageiros) foi destrinchada pela imprensa. Curiosidades e denúncias sobre a embarcação pipocaram em sites, jornais, revistas e na TV. A contagem regressiva do oxigênio que garantiria a vida de todos os que embarcaram nessa viagem tomou conta das redes sociais.

Em tese, eles tinham hora marcada para morrer. Com o fim do prazo de 96 horas, a chance de vida a cerca de 4 quilômetros de profundidade já era quase zero. Mas até que ponto é saudável – e humano – tornar a morte em algo quase que recreativo? Por que o tema atrai tanto a humanidade? Por que histórias tristes são um prato cheio para mídia, mesmo as menos sensacionalistas? As respostas são várias.

A morte é o maior dos valores-notícias. A avidez por saber como o outro morre é quase que um instinto de sobrevivência. Isso nos ajuda a não morrer. Sendo pragmático e simplista: se alguém morreu entrando num submarino duvidoso para conhecer o navio Titanic, se não quero correr risco de morte, não entraria na embarcação.

Mas a história do Titan tem mais camadas. Primeiro que para estar a bordo era necessário gastar algo em torno de U$ 250 mil, ou seja, mais de R$ 1 milhão. Algo impossível para a grande maioria da população mundial. E para o “pobre”, ver o rico se dar mal é quase que um regozijo. Uma forma da vida os punir por terem tanto dinheiro e é a vida mostrando que a morte é para todos.

Mesmo assim, melhor não ter dinheiro vivo do que morrer milionário e deixar os parentes brigando pela herança. E isso lembra a definição de Nitzsche para o ressentimento. Para ele, a vingança imaginária é uma força reativa que alimenta a alma do ressentido.

Tragédia após tragédia

Dentro dos 6,7 m de comprimento por 2,8 m de altura e 2,5 de largura, a viagem “turística” até os destroços do Titanic duraria 8 horas, e durante todo esse período os passageiros precisam ficar sentados no chão, sem conforto algum. Para ver o exterior e a cena de cinema, havia apenas uma janela de 55 cm. Para ver uma tragédia, outra se fez.

E aqui vem outra camada: porque tanta vontade de ver uma cena tão triste? Um navio naufragado, uma promessa não cumprida que tirou a vida de tantos? Ver a “morte” dos outros de perto custou a vida dessas pessoas e isso não é rizível. A chuva de memes sobre o assunto nas redes sociais é condenável.

Certa vez tive a oportunidade de entrar em um submarino. Durante a visita, ele ficou o tempo todo na superfície, mas recordo perfeitamente da sensação de claustrofobia que cerca de 20 minutos dentro dele me causaram. Riachuelo é o nome dele, pertence à Marinha do Brasil e fica disponível para visitação do Espaço Cultural da Marinha, no centro do Rio de Janeiro. A embarcação foi construída na Inglaterra, em 1973, pertence às Formas Armadas desde 1977 e ficou em operação até 1997.

Conhecer o Submarino Riachuelo custa R$ 10 no Espaço Cultural da Marinha no Rio de Janeiro | Foto: Marinha do Brasil

Na visita, a tecnologia ganha destaque. Muitos botões de comando e controles. Salas de máquinas, de operações e de observação. No espaço reduzido, há camas para os tripulantes e até cozinha. No corredor estreito, é quase impossível andar sem esbarrar em algo. Mas, no caso do submarino Titan, tudo parecia muito improvisado. Era guiado por um controle de videogame e só uma cortina separava o banheiro do restante do submersível.

Para conhecer um submarino por dentro tive que desembolsar R$ 10, além da viagem para o Rio de Janeiro. Uma experiência que levo pra vida e que me fez ter empatia pelas cinco pessoas que perderam a vida ao estar em um dos lugares do mundo menos visitados por humanos do que o espaço sideral. E 110 anos depois do naufrágio, o Titanic consegue fazer novas vítimas e aumentar os números da própria tragédia.