O narcotráfico e nós: ideias para salvar a juventude do Brasil
07 agosto 2022 às 00h00
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Não se discute que o problema nacional maior e mais urgente seja a Educação. Afinal, dela, que vai muito mal, depende a solução dos outros males que nos afligem. Mas quero alertar para outro problema, de enorme importância, que está a exigir mais que cuidados, pedindo mesmo união nacional, pela gravidade com que está deformando algo inestimável para o futuro do País, que é a sua juventude. O nome desse problema é: droga. E seu tráfico.
Somos talvez o país mais vitimado por essa classe de criminalidade. Para começar, temos, em nossas fronteiras, os três maiores produtores mundiais de cocaína: Colômbia (50% da produção mundial), Peru (32%), Bolívia (16%), mais a Venezuela, que vem aumentando seu plantio. E um dos maiores produtores mundiais de maconha, o Paraguai. O incômodo com esses vizinhos cresce quando se vê que a rota da droga exportada para a Europa e para os EUA (maior consumidor mundial) passa pelo território brasileiro e utiliza os portos do Sul e Sudeste do País.
Outro agravante: muitas vezes, as maiores autoridades desses países vizinhos entram em conluio com traficantes, por razões econômicas ou ideológicas, e lhes dão cobertura dentro de suas fronteiras. Uma das consequências foi o surgimento, no Brasil, de duas das maiores facções criminosas do mundo: o Primeiro Comando da Capital (PCC), fundado em 1993, em Taubaté, São Paulo, hoje um exército armado estimado em mais de 100 mil integrantes, e uma multinacional, com ramificações na Bolívia, na Colômbia e no Paraguai; e o Comando Vermelho (CV), fundado em 1979, na Ilha Grande, no Rio de Janeiro, hoje com mais de 30.000 faccionados, também ramificado para países vizinhos produtores da droga.
Muitos dos nossos graves problemas sociais têm em sua raiz as drogas, embora isso nem sempre seja perceptível à primeira vista.
O Brasil, a despeito da queda no número de ocorrências nos últimos quatro anos, ainda é um dos países com a maior taxa de homicídios por ano: quase 50.000, ou seja, mais de 130 a cada dia, ou 23 assassinatos para cada 100 mil habitantes (nos EUA, para que se compare, esta taxa é próxima de 5).
Qualquer delegado da Polícia Civil, ou oficial da Polícia Militar, que convive diariamente com essa hecatombe, vai atestar que assassinados são, na maioria, jovens. E, quando se busca a motivação desses crimes, em geral se encontra no tráfico. Jovens recrutados pelo PCC e pelo CV se matam na disputa por pontos de venda de drogas, em combates ordenados pelos chefões, ou morrem em combate com a polícia, muito mais bem preparada para essa guerra. Jovens drogados morrem por não saldarem suas dívidas com o tráfico ou matam inocentes nos assaltos que promovem para obter o dinheiro de que precisam.
O Tribunal do Tráfico dessas facções, que já têm domínio territorial em algumas áreas e desafiam o poder central, já adota, desde sua fundação, a pena de morte para quem denuncia integrantes, tenta deixar a facção ou comete erros nas “missões” determinadas pela chefia. Integrantes da facção rival capturados fora de seu território são também executados sumariamente. Essas execuções, não raro, são filmadas e postadas nas redes sociais, para servirem como exemplo. Já vimos várias, até de mocinhas adolescentes sendo executadas a tiros ou pancadas, algo verdadeiramente monstruoso.
Em áreas dominadas pelo tráfico, no Rio de Janeiro, traficantes recrutam crianças para entrega da droga, às vezes garotos com 7 ou 8 anos de idade, os chamados “aviõezinhos”. Jovens adolescentes são recrutados para tarefas mais pesadas, chegando até aos combates armados. Garotas são desencaminhadas, vão se drogar cedo, e cedo vão se tornar mães solteiras, sem a mínima condição de arcar com uma maternidade responsável. Esse é um pungente drama social, quase desconhecido da população, pois os políticos não se tocam, e a imprensa ainda menos.
Mães aos 14 anos: mais de 700 mil
Para que o leitor tenha uma ideia da dimensão desse desvio, o número de garotas que se tornam mães antes dos 14 anos está na casa das 20.000 anuais. O Ministério da Saúde, em levantamento que não contemplou, obviamente, todos os casos, registrou mais de 700.000 garotas de até 14 anos que se tornaram mães, de 1994 a 2021, isto é, em menos de três décadas. Isso corresponde a cerca de 70 garotas parturientes por dia! Um contingente de meninas praticamente alijadas do normal social, e um contingente de quase 1 milhão de crianças sem perspectiva de futuro.
É um enorme exército de desvalidos, parte de nossa juventude, do futuro mesmo da nação: os rapazes corrompidos, drogados, abatidos nos mais estúpidos combates de uma guerra interna. As garotas corrompidas, drogadas, transformadas prematuramente em arremedos das mães que não poderiam ser e nunca serão.
É estarrecedor contemplar que toda a política de combate às drogas vem sendo mantida, apesar de se mostrar omissa, equivocada e mesmo conivente com o crime em muitos casos. A abrangência do problema exige uma abrangência de abordagens.
No campo externo, exige uma busca de ações conjuntas de nossas autoridades e autoridades dos países produtores, desde que estas últimas tenham disposição para tanto. No caso de autoridades vizinhas coniventes com o crime, como vem ocorrendo, por exemplo, na Bolívia, onde o governo Evo Morales deu incentivos para o plantio de coca junto a nossas fronteiras, buscando divisas com a exportação do crime e do infortúnio, o tratamento deve ser de dureza e não de afago, como ocorre, e o combate nas fronteiras não pode ser frouxo, como acontece com a proibição de abate de aviões dos traficantes, que afeta a eficácia da FAB.
Internamente, há uma pletora de defeitos a corrigir, evidentes pela gravidade do problema, apesar dos esforços de nossas polícias.
No Legislativo, a proteção ao policial deveria substituir a leniência com o crime, como as progressões de pena, o não trabalhar nas penitenciárias, as “saidinhas”, as permissões para uma enormidade de contatos dos apenados mais graves com advogados e parentes, que servem apenas para traficar drogas, aparelhos e armas para dentro das prisões. Uma revisão da legislação da maioridade penal está tardando. Os mais violentos crimes, os mais cruéis homicídios ficam impunes, se o criminoso está a alguns dias apenas da maioridade.
É urgente uma legislação de proteção aos agentes penitenciários, vulneráveis com suas famílias ao poderio do tráfico. Limitações ao trabalho policial, como a absurda proibição de operações nas favelas ou exigências que coloquem os policiais em desvantagem com bandidos, nos momentos drásticos de combate, não têm razão de ser numa guerra de verdade, como essa que livramos contra o tráfico e seu poderio financeiro.
No Judiciário, muito há que se corrigir, a começar pelas audiências de custódia, responsáveis muitas vezes pelas liberações indevidas de criminosos perigosos e por uma verdadeira perseguição aos policiais. Penas leves, mesmo para traficantes violentos e contumazes são outra distorção, que leva os policiais à frustrante sensação de “enxugar gelo”. O próprio Ministério Público, em muitas unidades da Federação, age mais como oponente da polícia do que como seu aliado junto à sociedade. Preocupa-se mais com o bem-estar do traficante do que com a proteção do policial. Tivemos oportunidade de ver em Goiás como é frutífera a colaboração do Ministério Público e da Polícia, por exemplo, nos serviços de inteligência, o que aproxima as duas importantes instituições.
Já vai longe essa lista de queixas, mas uma palavra se faz necessária no analisar ONGs de Direitos Humanos, no mais das vezes suspeitas, financiadas com dinheiro externo, e partidos de cunho marxista, que apostam na luta de classes e têm traficantes na conta de vítimas, de parceiros, de “classe oprimida pela sociedade burguesa”, e a polícia como organização “a serviço das elites”. Lembro que boa parte da imprensa sustenta essas ONGs e essa extrema esquerda. E que temos políticos que pregam o desencarceramento e a legalização das drogas, quando essa política fracassou onde foi aplicada, e como mostra o triste exemplo das “cracolândias”. Prestam todos os lenientes um desserviço à sociedade, que se reflete naqueles enormes números que citamos lá em cima, de jovens assassinados, de mães adolescentes solteiras, e de uma infância destinada ao abandono familiar, com todas suas consequências.