Mesmo aliado a José J. Veiga, o colombiano não seria capaz de imaginar uma nação tão surrealista e mágica quanto a brasileira

Não poderia o escritor colombiano Gabriel García Márquez, autor de “Cem Anos de Solidão” e nem nosso J. J. Veiga, que escreveu “Os Cavalinhos de Platiplanto”, qualquer dos dois, em sua fértil imaginação, competir em realismo fantástico (para não dizer fantasmagórico) com o que a história política brasileira vem escrevendo nestes últimos tempos. Arrisco mesmo a dizer, prezado leitor, que o aqui acontecido não tem similar na geografia e nem na história global. Os fatos não admitem discussão.

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Marielle Franco e Adélio Bispo
Marielle Franco e Adélio Bispo | Fotos: Reproduções

Morre, em um assassinato premeditado, uma vereadora do PSOL. Era necessário que se esclarecesse o acontecido e se punissem exemplarmente pistoleiros e mandantes. Mas, embora figura obscura e polêmica, a vereadora tornou-se centro de uma enorme campanha, até internacional, para que se desvendasse o ocorrido, sob desproporcional estardalhaço da imprensa.

Já por outro lado, quase morre o hoje presidente da República, numa tentativa de homicídio por pouco não levada a cabo, em que o executor era figura ligada ao mesmo PSOL da vereadora. Era igualmente necessário que se descobrissem os mandantes e que fossem devidamente submetidos à lei. Mas, nesse caso, há como que um complô para que não avancem as investigações e sequer se conheçam os pagantes dos caros advogados do bandido esfaqueador, dado como inimputável solitário, com enorme e estranha rapidez. Tudo sob silencio geral da imprensa.

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Sergio Moro e o Supremo
Gilmar Mendes e Sergio Moro | Foto: Reprodução

Um juiz federal, pela vez primeira nestas plagas, condena com base nas mais robustas provas, dezenas de ladrões do dinheiro público, todos eles figuras importantes no meio político e empresarial e os leva à merecida prisão, entre eles um ex-presidente da República; consegue além disso devolução de bilhões de reais roubados das arcas da nação. Suas sentenças são confirmadas por quase uma dezena de colegas e por duas instâncias superiores. Os crimes de corrupção são também investigados e rendem condenações em várias nações para onde se ramificou a corrupção brasileira e a ação das empreiteiras ladronas ligadas ao establishment aqui radicado. Num passe de mágica, a nossa Suprema Corte extingue as sentenças relativas ao ex-presidente, e deixa entreaberta a porta para que os outros sicários passem por ela, rumo a uma horrível impunidade. Além disso, o juiz que enfrentou o maior esquema criminoso do Brasil e quiçá do globo, passa a suspeito de parcialidade, e pode sofrer sanções.

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Partidos submetem o Supremo?

Em todos os lugares do mundo, partidos políticos exercem seu papel atuando no local próprio, o parlamento. Dias atrás, um partido minoritário português, espertamente, recorreu a um tribunal superior requerendo uma intervenção deste junto ao Executivo português no sentido de suspender uma proibição de viagens entre cidades vizinhas, motivada pela pandemia. O Tribunal simplesmente arquivou o requerimento, comunicando ao partido que atuasse no seu teatro próprio de operação, o Parlamento Português, para atingir seus objetivos. Que requeresse ali.

Ferrovia Ferrogrão | Foto: Reprodução

No Brasil, ao menos três partidos de extrema esquerda, PT, PSOL e PC do B — o primeiro tido e havido como organização criminosa, os outros de caráter totalitário, um trotskista e o outro stalinista, inexpressivos nas suas bancadas —, recorrem frequentemente à Suprema Corte. O STF os tem acatado, com enorme rapidez, enquanto se mostra lerdo no deslanchar processo de figuras conhecidas pelas acusações de corrupção, como Renan Calheiros, Aécio Neves e outros. E o pior, tem atendido esses partidos em proposições que nunca teriam curso no local próprio, o Congresso. Com isso, engessa o governo.

Conseguiram paralisar a mais importante ferrovia em construção no país, a Ferrogrão. Invalidaram medidas que beneficiavam esportistas do tiro, policiais, promotores e magistrados. Transferiram do governo federal a estados e municípios as medidas de combate à pandemia e depois determinaram ao Senado a instalação de uma CPI para apurar as falhas do governo federal na condução das mesmas medidas que o proibiram de tomar. Proibiram o Executivo federal de nomear interventores para institutos de ensino, dificultando o combate à corrupção e ao aparelhamento desses institutos. Proibiram o presidente de nomear o titular do Departamento de Polícia Federal de sua escolha. Isso sem contar as inúmeras determinações para prestação de informações em prazos exíguos, dirigidas ao Executivo Federal.

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CPI com Renan como relator?!
Renan Calheiros: relator da CPI da Pandemia | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Comissões Parlamentares de Inquérito no Brasil foram muitas as instaladas nas últimas décadas. Não há como citar uma sequer que desse resultado positivo ou esclarecesse satisfatoriamente um problema nacional, logo, que o resolvesse. Gastaram muito dinheiro público, desviaram o foco do Congresso de coisas importantes, e o que é pior, deram margem a chantagens e corrupções. O que esperar da última, essa da pandemia, cuja instalação foi determinada pelo Supremo, além de dissipação de tempo e dinheiro e ataques direcionados ao Executivo Federal? Ainda que CPIs fossem coisa séria, o que esperar de alguma proposta por Randolfe Rodrigues apoiado por Renan Calheiros?

Em sua instalação já temos a mostra: o indicado para seu presidente fala em apurar “como o governo deixou o vírus entrar no País”, uma ignorância sem limites. O indicado relator, ninguém menos que Renan Calheiros, é, além de notório processado, pai de um governador que aplicou, sabe-se lá como, o dinheiro que recebeu da União para combate à pandemia. Jader Barbalho, outro membro da CPI é pai de outro governador, Helder Barbalho, que tem a Polícia Federal em seus calcanhares para que explique coisas estranhas em compras de equipamentos sem licitação, e por aí vai. A imprensa nada diz, mas imagine o leitor a gritaria se o senador Flavio Bolsonaro resolvesse participar dessa CPI…

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Legislativo e Judiciário engessam o governo

Num momento de guerra, o que fazem as classes maiores de uma nação: unem-se contra o inimigo comum, tentam reduzir os danos causados por ele, procuram derrotá-lo da forma mais rápida e cabal possível.

Nessa guerra contra o vírus, e no Brasil, o Legislativo faz o que sempre fez, ignorando as circunstâncias, por graves que sejam: preocupa-se em encher os bolsos e assegurar a próxima reeleição.

O Judiciário, na sua parte ideológica, engessa o governo e tenta, com a “grande imprensa”, e com a ala da esquerda totalitária no congresso, derrubá-lo. A imprensa espalha o pânico e mal consegue disfarçar sua satisfação com o agravamento da guerra pandêmica, enquanto atribui ao governo todos os males dos tempos de guerra e dos tempos de paz. E de sobra, esse conluio difama o governo no exterior, pensando com isso torná-lo mais frágil. Ou cai, ou se desgasta até 2022 e não se reelege – aposta.

Esse o cenário brasileiro. Um cenário que só podemos classificar de realismo fantástico! E põe fantástico nisso!