Será possível conciliar religião e ciência?
19 junho 2022 às 00h00
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Eu não sou um homem que age baseado na Fé. Se a Ciência não encontra razões, permaneço na dúvida
Irapuan da Costa Junior, meu amigo pessoal, nome de prestígio no meio intelectual, social e político, colunista do Jornal Opção, repercutiu o meu ensaio “A razão e a fé”, em edição recente do jornal. Fiquei feliz, pois a pior coisa que pode acontecer a quem escreve é o silêncio dos leitores. A melhor é uma manifestação, que não importa se de agrado ou desagrado. A escrita fica vazia quando não tem repercussão. É como o sermão aos peixes do Padre Vieira, por não ser ouvido pelos homens.
Irapuan deu vida ao meu texto. Agradeço, por isto, e, pelo respeito e admiração que lhe dedico, sinto-me no dever de retribuir com algumas observações. Entre estas destaco dois aspectos do seu comentário que merecem uma análise. Uma é a divergência milenar da discussão do confronto entre a Ciência e a Religião. História quase tão antiga quanto a humanidade. Elas nos levaram das batalhas verbais até as guerras. O que valida a nossa presente divergência de opinião.
A segunda é que este tema foi abordado pelo filósofo Herbert Spencer no seu livro — um clássico da filosofia — “Primeiros Princípios” (Ex Machina, 469 páginas), mostrando que essas posições são conciliáveis.
Diga-se de passagem que de Spencer eu só conhecia o livro “Filosofia do Estilo” (Cânone Editorial, 68 páginas) e as frequentes citações de suas ideias. Tive a sorte de ser presenteado pelo tradutor, Irapuan Costa Junior, com um exemplar dos “Primeiros Princípios”, e assim poder penetrar nas ideias desse filósofo inglês.
Atenho-me ao primeiro capítulo, no tema a “Ciência e as Religiões”, que Irapuan Costa Junior sugere que os leitores conheçam. Segundo ele, Spencer mostra que essas dualidades podem ser conciliadas — a Ciência e a Religião. O que, no meu entendimento a Ciência explicaria as razões; e a Religião, daria a Fé, que seriam conciliáveis. O que contraria o espírito do meu artigo. Até porque faço distinção entre Religião e Espírito Religioso — que nem sempre andam juntos.
Realmente há uma diferença nas duas leituras, a de Irapuan Costa Junior e a minha. Nesse primeiro capítulo, Spencer diz que “se a Religião e a Ciência podem (grifo meu) conciliar-se, a base desta conciliação deve ser o mais profundo, amplo e acertado fato entre todos — o de que o Poder manifesto do Universo é completamente incognoscível para nós”.
Nesse posicionamento, na minha modesta opinião, o filósofo levanta uma hipótese — quando diz “podem” —, não uma tese; e ao reconhecer a nossa limitação cognoscitiva, apela por um crédito: já que não está ao meu alcance… cedo. Não é isto um apelo à Fé?!
E é este o ponto da nossa divergência. Eu não sou um homem que age baseado na Fé. Se a Ciência não encontra razões, permaneço na dúvida. Irapuan Costa Junior, sábio como é, transige. É um homem de boa-fé. Aceita o apelo de Spencer para a conciliação entre a Razão e a Fé.
Estas posições, evidentemente, simplificadas, não devem satisfazer plenamente aos leitores do jornal. É tão-somente uma posição que tomo em respeito aos meus leitores e ao meu mestre-amigo Irapuan Costa Junior. Com isto, as duas posições foram colocadas. Cabe agora aos leitores a leitura do livro “Primeiros Princípios”, de Herbert Spencer, e formarem a própria opinião para terem a resposta de se é possível conciliar o inconciliável. Uns continuarão como estão, outros poderão se juntar aos agnósticos — para nossa honra.