Por que é importante ler a obra divergente de Thomas Sowell: um peixe fora d’água

12 outubro 2022 às 21h24

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É do senso comum que o peixe não enxerga a água em que está imerso. Nem o homem comum vê as circunstâncias que o envolve. O peixe e o homem só têm noção do mundo que os cerca se são capazes de sair do “aquário”. A incapacidade de abstração de uma realidade é a característica do homem medíocre. Ele não vê a água em que está mergulhado.
Thomas Sowell foi um peixe que enxergou a água. Destacou-se no universo intelectual americano por chegar a conclusões que põem em xeque boa parte da cartilha progressista que domina os departamentos de Ciências Sociais das universidades do país. Sendo por isto considerado por Steven Pinker¹ “como o mais subestimado autor de todos os tempos”.
Sowell é um economista estadunidense, crítico social, filósofo político, autor e membro sênior da Hoover Institution da Universidade de Stanford. Nasceu na Carolina do Norte, mas cresceu no Harlem, Nova York. Largou a universidade e foi servir na Marinha dos Estados Unidos durante a Guerra da Coréia. Graduou-se em Economia na Universidade Harvard em 1958 e depois fez mestrado em Economia pela Universidade Columbia. Em 1968, recebeu seu doutorado em Economia pela Universidade de Chicago. É autor de mais de 40 livros, dentre eles o seu maior best-seller — “Economia Básica” (Alta Books, 368 páginas), de 2015. Trata-se de um manual de economia usado como livro-texto em faculdades americanas que já está em sua quinta edição.

No seu livro “Controversial Essays”, Sowell analisa o mundo com absoluta isenção de ânimos. Nascido pobre e preto não se deixou marcar pelos estigmas raciais e econômicos. Distinguiu-se por não perder a racionalidade ao opinar sobre a riqueza e o preconceito da cor. O que para ele era óbvio, para muitos seria uma revelação. Em um dos seus pensamentos, elucidativos de sua mente privilegiada, dizia: “Algumas coisas são tão óbvias que, se você tem de explicá-las, você não consegue”.
A nossa pode tornar-se a primeira civilização destruída, não pelo poder dos seus inimigos, mas pela ignorância dos nossos professores e o perigoso nonsense que eles estão ensinando às nossas crianças. Em uma era da artificial inteligência, eles estão criando a artificial estupidez. — Thomas Sowell
Ler os “Essays” de Sowell é apreciar nos pequenos capítulos, em linguagem clara, acessível e objetiva, a sua perspicácia e coragem de reverter verdades tidas como absolutas. É uma oportunidade de o leitor sair do aquário para olhar o nosso mundo. É um aprendizado, um alerta, a olhar os fatos tendo em conta outras perspectivas — que é onde reside a sabedoria que nos livra da mediocridade.
“A nossa pode tornar-se a primeira civilização destruída, não pelo poder dos seus inimigos, mas pela ignorância dos nossos professores e o perigoso nonsense que eles estão ensinando às nossas crianças. Em uma era da artificial inteligência, eles estão criando a artificial estupidez”, assinalou Sowell.
É fácil entender as razões de a intelectualidade subestimar a grande contribuição de Sowell. Ele afronta o senso comum do establishment. Ele não tem receio de apontar as falácias das ideias correntes. Criticando o salário-mínimo dava a falsa impressão de ser contra os menos favorecidos, quando escreveu: “O salário-mínimo é zero — pois isto é o que recebe os muitos inexperientes e menos habilidosos, os desempregados, como resultado de uma política que torna ilegal pagar o que seria possível ao empregador”.
Em todo o texto perpassa não só a isenção do autor, nas suas análises racionais e conclusões lógicas — que surpreendem pela originalidade — como pelo cultivo da autoestima e da dignidade.
Não aceitando o pensamento corrente de faltar aos pobres e pretos oportunidades, exemplifica não ser um desprivilegiado por não ser um Tiger Woods. Não atribui à falta de oportunidade a sua inabilidade para o esporte. Tem a postura de quem não delega a terceiros a responsabilidade dos seus resultados. Nessa linha, cita Joe Maggie, campeão de beisebol: “Nenhum garoto de uma família rica nunca conseguirá jogar nos maiores torneios”; e Jack Dempsey, famoso boxeado, que dizia: “Ninguém que tiver outro meio de vida se tornaria um boxer profissional”.
Como filósofo político, Sowell entendia que “o tipo de gente que necessitamos no governo é precisamente o tipo que é mais relutante a ser governo — gente que entende o inerente perigo do poder e sente a falta de gosto por usá-lo, mas que o faria por uns poucos anos como um dever cívico. A pior espécie de gente para ser governo é aqueles que veem uma oportunidade dourada de impor nos outros a sua superior sabedoria e virtude”.
Vale a pena conhecer este texto, se o leitor sabe apreciar abordagens que contrariam as ideias correntes; e se quer aprender a pensar fora do lugar comum.
Thomas Sowell é um peixe fora d’água. Ele via a água.
Nota
¹ Steven Pinker, psicólogo e linguista canadense naturalizado norte-americano, é professor da Universidade Harvard e escritor de livros de divulgação científica. “Os Anjos Bons da Nossa Natureza — Por que a Violência Diminuiu” (Companhia das Letras, 1088 páginas, tradução de Bernardo Joffily) é um dos seus livros mais discutidos.