Decisão de Iris pela aposentadoria política embaralha jogo eleitoral em Goiás
06 setembro 2020 às 00h00
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Apoio costurado em 2014 entre o governador Ronaldo Caiado (DEM) e o prefeito Iris Rezende (MDB) era a solução dos problemas da base para 2022
Quando o prefeito Iris Rezende (MDB) decidiu voltar à disputa ao governo do Estado em 2014, precisou quebrar o acordo que tinha com o pré-candidato pelo partido, o empresário José Batista Júnior, o Júnior Friboi. Não só tirou Friboi da corrida eleitoral, como costurou aliança com o então deputado federal Ronaldo Caiado (DEM), que precisava do apoio de Iris para ser eleito senador.
Se em 1998, 2010 e 2014, a força eleitoral de Iris Rezende não foi suficiente, naquele momento, para derrotar o então governador Marconi Perillo (PSDB), quatro anos depois o apoio político firmado com Caiado ajudou o democrata a destituir do cargo José Eliton (PSDB), que assumiu o Estado quando Marconi tentou voltar, sem sucesso, ao Senado. Mesmo com candidato próprio no MDB, Iris se preservou de um apoio veemente e abriu caminho para vitória nas urnas de Caiado em 2018.
O ex-deputado federal Daniel Vilela foi a pedra no sapato do governador naquela eleição. Mesmo eleito no primeiro turno, ficou em outubro de 2018 estabelecido que Caiado teria um opositor com voz enquanto for o inquilino do Palácio das Esmeraldas. A construção da nova figura pública de Daniel nas críticas à gestão do democrata estabelecia que provavelmente teríamos um concorrente em 2022 na eleição.
Jogo duplo
O afastamento de Iris da campanha de 2018, mesmo com a declaração pública à candidatura de Daniel, fortalecia o apoio de Caiado à tentativa de reeleição do prefeito de Goiânia neste ano. Primeiro surgiu a negociação de quem seria o candidato a vice-prefeito na chapa de Iris Rezende, uma figura pública a ser seguida por qualquer um que pretende ter sucesso em processos eleitorais.
Com 86 anos, Iris é história viva do processo de redemocratização do País. Foi eleito vereador em 1958, deputado estadual em 1962 e prefeito de Goiânia ainda na década de 1960. Teve seu mandato no Executivo municipal cassado pela ditadura militar, retornou à vida pública como deputado estadual, foi governador por duas vezes, senador, ministro da Agricultura no governo José Sarney (MDB), da Justiça na gestão Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e caminha para o fim de seu quarto mandato como chefe do Executivo na capital. Qualquer político adoraria ter um currículo eleitoral desses!
Só que, assim como na vida, a política eleitoral é feita do hoje. Apesar de contar com o amanhã – a eleição de 2022 – bem arquitetado, Caiado viu seu aliado de todas as horas nos últimos seis anos anunciar na manhã de 25 de agosto que chegará ao fim seu trabalho público na política eleitoral em 31 de dezembro de 2020, quando se encerra seu mandato de prefeito de Goiânia. A partir de então, negociações das mais possíveis às menos prováveis tomaram conta do cenário de reta final da pré-campanha na capital.
Grande vencedor
Iris, se conseguir concluir a grande quantidade de obras tocadas pela prefeitura, será o grande vencedor das eleições. Mesmo se não disputar. Precisamos ter em mente que outro anúncio assim, um pouco mais modesto – com a assinatura de uma carta – foi realizado pelo prefeito em 2016. Há quatro anos, o emedebista deu a certeza de que sua carreira eleitoral estava encerrada. No último dia das convenções partidárias, após conversas com o Marconi, não topou receber o apoio do PSDB e se lançou candidato.
Naquela disputa de 2016, o adversário no segundo turno foi o senador Vanderlan Cardoso (PSD), que recebeu o apoio do então governador tucano para enfrentar Iris nas urnas. Criticado por parte do eleitorado pela idade avançada para ocupar o Paço Municipal pela quarta vez – aos 82 anos naquele ano -, Iris provou na reta final, inclusive na campanha de rádio e TV, que tinha vigor e disposição administrativa a demonstrar, mesmo depois de tanto serviço prestado.
Aquele apoio de Iris a Caiado, que impedia o fortalecimento dos Vilela na corrida de 2022 no Estado, pode ter se desfeito. Sem o prefeito na busca pela reeleição em Goiânia, é difícil até saber se há disposição no emedebista em apoiar fielmente qualquer um dos candidatos a prefeito. E aqui vale lembrar que existem dois grupos distintos no MDB goiano.
Força eleitoral e política
Mesmo restrito a Goiânia desde 2004, quando volta a se eleger prefeito sobre o candidato a reeleição Pedro Wilson (PT), Iris continua como a grande referência do MDB estadual. Mas surge Daniel Vilela como o novo presidente estadual do partido anos depois, inclusive ao impor derrota ao candidato de Iris na disputa interna. Tudo que Caiado e Iris queriam juntos era enfraquecer qualquer chance de os Vilela voltarem ao poder estadual.
Só que sem Iris nas urnas em Goiânia, Caiado se vê na necessidade de negociar até com os Vilela, que se mostram dispostos em manter a aliança irista com o governador do DEM, adversário de Daniel em 2018. Para o democrata, o risco é grande de a aliança se desfazer anos ou meses depois do pleito municipal. Ter Maguito Vilela como prefeito de Goiânia é fortalecer o filho na busca pela consolidação da candidatura estadual dois anos depois.
A família de Iris e servidores próximos ao prefeito no Paço dizem estar convictos de que desta vez é para valer, o emedebista precisa descansar e se dedicar às pessoas mais próximas, que, ao longo de décadas, abriram mão de um convívio mais intenso com o parente para que Iris se dedicasse aos goianos. Caso isso se confirme no dia 16 de setembro, Vanderlan já se mostrou à disposição de Caiado para ser candidato com apoio do governo em novembro.
PSD e 2022
Mas o apoio de Caiado ao senador do PSD não passa por 2022, o que complica a formação da aliança eleitoral em Goiânia. Se entrar na negociação, nada garante que daqui dois anos Vanderlan se lance candidato a governador contra o democrata. É um jogo muito arriscado para Caiado, tanto ao lado de Vanderlan quanto junto aos Vilela.
O problema é que a aposentadoria de Iris obrigou os políticos que pretendem ter capilaridade e visibilidade eleitoral até 2022 a se movimentarem agora. Quem não sair fortalecido das eleições municipais perde grande chance de aumentar a rede de apoio de outros partidos até as urnas daqui dois anos. A via mais favorável para Caiado continua a ser a candidatura a reeleição de Iris Rezende.
Por mais que aposte em outras possibilidades, como a candidatura própria do DEM com o deputado federal Zacharias Calil, um dos três nomes do Progressistas – o ex-secretário estadual Joel Sant’Anna Braga Filho, o ex-deputado federal Sandes Júnior, o deputado estadual Rafael Gouveia – ou o ex-senador Wilder Morais (PSC), será preciso verificar em sua base a viabilidade eleitoral de abrir mão do apoio do MDB ou fechar as portas para o PSD.
Quem mais precisa avaliar o movimento a ser feito neste momento é o governador Ronaldo Caiado. Perder apoio em Goiânia, a depender do candidato eleito, será um complicador na busca pela reeleição. Se carreatas e buzinaços parecem não ter convencido Iris Rezende a desistir pela terceira vez da anunciada aposentadoria, talvez uma reaproximação dos dois líderes políticos possa pacificar uma disputa eleitoral que é crucial para o futuro de MDB e DEM em Goiás.