O pastor Ariovaldo Ramos, líder da Comunidade Cristã Renovada e fundador e coordenador nacional da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito – e que aconselhou Luís Inácio Lula da Silva durante a campanha para presidente – avalia que o governo federal precisão não só continuar mas aprofundar o diálogo com a comunidade evangélica.

“Nós conseguimos, com a graça de Deus, a resposta evangélica nas eleições e o Lula se tornou presidente”, lembrou o pastor, que acredita que os últimos seis meses já deixam claro o que essa vitória representou para o país. “Esse é só o primeiro passo”, disse. Agora, na visão de Ariovaldo, falta um representante evangélico no “Conselhão”, como é chamado o Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), que é um espaço de debate de agendas e temas de interesse dos mais diversos segmentos da sociedade.

Movimentos sociais, setor financeiro, agronegócio e fintechs são alguns dos setores que têm representantes no grupo formado por 246 conselheiros. Atualmente, integram o “Conselhão”, além do presidente Lula, que o preside, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e ministros. “Que sinal o governo está dando quando não colocar nenhum evangélico?”, questionou o pastor, que reconhece que até existem evangélicos no governo. E não por serem crentes, mas apesar de seguirem essa religião.

Pautas progressistas

Quando perguntado se a aparente posição progressista com temas mais sensíveis na sociedade, como a luta pelos direitos da comunidade LGBTQIAPN+ e o aborto, por exemplo, Ariovaldo decreta: “o PT é o partido menos progressista entre as legendas de esquerda”. Segundo o pastor, o sindicalismo é a filosofia petista e a legenda, na visão dele, seria muito conservadora e corporativista. “A pauta do PT é trabalhista, não é nem socialista. É aquela ideia de que é possível um acordo entre o capital e o trabalho e que eles podem se entender. E isso não mexe com os evangélicos”, resumiu.

Mas o líder religioso reconhece que nos últimos anos houve uma grande campanha contra o PT que colocou sobre ele uma série de pechas que não lhe cabem. “O Partido dos Trabalhadores não soube se defender da propaganda antipetista. Não foram ao público evangélico para desmentir. E não fizeram isso porque a maioria dos petistas ainda não percebeu a nova configuração do Brasil, que é cada vez mais religiosa”, comentou.

Raízes do bolsonarismo evangélico

Para explicar o fenômeno “Bolsonaro” entre os evangélico, Ariovaldo afirma que em algumas correntes evangélicas a figura centralizadora do pastor acostumou os crentes que frequentam esses templos a viver em uma comunidade ditatorial. Com isso, a democracia foi subvalorizada e assumir o poder se tornou uma prioridade nesse meio.

Antes, outras lideranças já tentaram fazer o que Bolsonaro fez. É o caso de Francisco Rossi, de São Paulo, e Anthony Garotinho, do Rio de Janeiro. “Mas eles foram precipitados. A Igreja Evangélica não estava pronta ainda”, avaliou o pastor. No contexto bolsonarista, os evangélicos estavam preparados para ter um líder que os representasse no poder. “Tudo foi sendo forjado”, criticou.

Ariovaldo cita o batismo do ex-presidente no Rio Jordão pelo pastor Everaldo Dias, da Assembleia de Deus, a maior denominação pentecostal. Após isso, o político foi apontado como líder evangélico pelo pastor Josué Valandro, da Igreja Batista, a maior denominação histórica. “Eles disseram que Bolsonaro era um ungido de Deus. Mesmo com todos nós sabendo que ele nem era crente. E isso no nosso meio é fortíssimo. Quando alguém diz isso, uma comunidade toda sabe como deve se portar”, explica o pastor.

Assim, Jair Bolsonaro fez um acordo com a comunidade evangélica, pelo menos com o segmento fundamentalista e majoritário, segundo o líder religioso. “Esses irmãos foram os mais enganados. Eles acreditaram numa figura que estava muito mais para Herodes, um falastrão, um bandido, um cara que vai ser comido por vermes, do que pra Davi”, comparou com o rei mais justo da Bíblia. Mas Ariovaldo acredita que os evangélicos já começaram a perceber o engano e vê como absolutamente possível a adesão dos crentes a Lula.