Líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stedile, prestou depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o movimento. Durante sua fala, nesta terça-feira, 15, foi interrompido diversas vezes pelos deputados presentes. Presidida pelo deputado Tenente-Coronel Zucco (Republicanos), a Comissão durou quase 7 horas e caminha para o fim. Uma das falas de maio destaque do economista foi a de que o agronegócio está dividido. “Parte do agronegócio já tem consciência dos limites e já está migrando para outra agricultura, a chamada agora de ‘práticas regenerativas’, para substituir pesticidas por defensivo agrícola agroecológico (…) Mas o agronegócio burro, que só pensa em lucro fácil, está com os dias contados”, explicou Stedile.

Agressões

“O senhor é um vagabundo”, disse o deputado delegado Éder Mauro (PL-PA) ao líder do movimento. Em seguida, deputado teve seu microfone cortado, tempo para se recompor e retornou com os xingamentos. A sessão também precisou ser pausada após discussão entre a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e o relator da Comissão, deputado Ricardo Salles (PL-SP). Outro parlamentar, deputado rodolfo Nogueira (PL-MS), interrompeu a fala de João Pedro para perguntar sobre a política da China.

“Por que a China passa fome?” “O senhor foi a China com qual passaporte?” “Tinha visto?”. Além de representar o MST, os deputados esperavam que o líder do movimento advogasse pela China, pelos Estados Unidos, pelos Governo Lula e Dilma e ainda se justificasse por todas as desgraças que acontecem no mundo. Tudo foi pauta na CPI, que investigou tudo, menos os supostos crimes praticados pelo Movimento Sem Terra. 

“O senhor acredita realmente que seja possível implantar o comunismo no Brasil?”, questionou Coronel Assis, deputado federal (União-MT). “Nenhum país do mundo teve comunismo e não é o caso do Brasil. O que está em debate agora no Brasil é um projeto de soberania nacional”, respondeu João Pedro. Em seguida, o economista mostrou os caminhos para que o país conseguisse atingir a soberania com os recursos que já existem.

Salles, relator da CPI e ex-ministro do meio ambiente, acusou o MST de uma série de irregularidades. De acordo com ele, testemunhos e documentos apresentados à CPI mostram abusos contra assentados e privilégios de dirigentes. Além disso, o relator acusou o MST de se apropriar de recursos públicos. “As narrativas trazidas aqui indicaram nominalmente, factualmente, desvios de conduta não desprezíveis”, ressaltou.

Ricardo Salles citou três casos de violência que teriam sido relatados por ex-integrantes do MST à CPI. Segundo afirmou, houve um episódio em Goiás em que um integrante do MST teve o dedo amputado ao ser expulso de um assentamento. Na Bahia, um militante teria sido retirado a chutes de dentro de sua área. Além disso, teria ocorrido mais uma situação semelhante no Distrito Federal, de integrante expulso do assentamento com violência.

João Pedro Stedile argumentou que o MST adota uma série de medidas para coibir irregularidades. A principal delas seria a liderança colegiada, para evitar atitudes abusivas de dirigentes. Ainda assim, afirmou que, como em qualquer movimento, pode haver pessoas que ingressam nos acampamentos para “tirar vantagem”.

João Pedro Stedile ressaltou ainda que o MST tem hoje 5 mil assentamentos com 500 mil famílias. Com isso, defende que “nem Jesus Cristo” teria como saber o que acontece em todos eles.

Quem é o líder do MST

Oriundo de uma família de pequenos agricultores descendentes de italianos, formou-se em Economia pela PUC do Rio Grande Sul e pós-graduou-se na Universidade Nacional do México (UNAM). Escreveu livros como Brava gente: a trajetória do MST e a luta pela terra no Brasil (1999), em colaboração com Bernardo Mançano Fernandes, Assentamentos: uma resposta econômica da reforma agrária (1986), entre outros.

João Pedro Stedile acumula 60 prêmios por sua atuação à frente do movimento, como o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos (1986 e 1990), Medalha Pedro Ernesto (1995), Memorial de la Paz y la Solidaridad entre los Pueblos (1995), Medalha Chico Mendes de Resistência (1989, 1998), Prêmio Hebert de Souza (1998), Medalha da Inconfidência (1999), Prêmio Paulo Freire de Compromisso Social (2000), Prêmio em Tecnologia Social, pela Fundação Banco do Brasil e Unesco (2003), Prêmio Santos Dias de Direitos Humanos (2018), Prêmio Espanha Reconhece (2021), entre outros.