A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apresentou novo recurso recurso na sexta-feira, 15, contra a interpretação jurídica estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a qual determina que veículos jornalísticos são responsáveis por declarações de entrevistados que erroneamente imputem crimes a terceiros. Conforme o entendimento, deliberado em novembro por uma maioria de 9 votos a favor e 2 contrários, se um entrevistado fizer uma acusação falsa contra outra pessoa, a publicação poderá ser condenada a pagar indenização à vítima da acusação falsa.

De acordo com a tese aprovada, a responsabilidade da publicação poderá ser estabelecida se for comprovado que, no momento da publicação da entrevista, já existiam “indícios concretos” da falsidade da acusação do crime e se “o veículo não observou o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência desses indícios”. Os ministros também determinaram a possibilidade de “remoção de conteúdo por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas e em relação a possíveis danos materiais e morais.”

Durante o julgamento, jornalistas e entidades de imprensa como a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Abraji criticaram a redação final da tese, cujos termos, considerados amplamente vagos pelas entidades, poderiam permitir ataques à liberdade de imprensa e ao direito constitucional de acesso à informação. O acórdão com o texto final da tese foi publicado pelo Supremo em 8 de março. A Abraji entrou com embargos de declaração sete dias depois, buscando esclarecer os termos do julgamento.

Voto dos ministros

Segue o placar dos votos dos ministros do STF: 9 votos a favor da responsabilização: Edson Fachin, Roberto Barroso (presidente), Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Nunes Marques; 2 votos contrários: Marco Aurélio de Mello (relator) e Rosa Weber…

No recurso, a associação argumenta que se trata de uma “questão sensível para a democracia” e que a tese estabelecida pelo Supremo é excessivamente genérica. A entidade alega que, ao permitir a remoção de conteúdo, o Supremo ultrapassou o escopo das acusações falsas em entrevistas, que era o tema do processo, autorizando uma remoção muito mais ampla de conteúdo. Esse alcance amplo da decisão ocorre porque a tese autoriza a remoção de qualquer “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas”.

Na época do julgamento, o presidente do Supremo, ministro Roberto Barroso, emitiu uma nota oficial e fez declarações negando que a tese do Supremo representasse um risco à liberdade de imprensa e expressão. “O veículo não é responsável pela declaração do entrevistado, a menos que tenha havido uma negligência flagrante na apuração de um fato que fosse de conhecimento público”, declarou Barroso. No recurso, a Abraji argumenta que a própria necessidade de esclarecimento por parte do Supremo indica problemas na redação da tese. Da mesma forma, expressões como “negligência flagrante”.

Ação

A decisão do Supremo Tribunal Federal teve como base uma ação na qual o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho (1935-2017) processou o jornal Diário de Pernambuco por danos morais, devido a uma reportagem veiculada em 1995.

Na matéria, o político pernambucano Wandenkolk Wanderley alegou que Ricardo Zarattini foi o responsável pelo atentado a bomba no aeroporto de Recife, em 1966, durante a ditadura militar, resultando na morte de três pessoas no aeroporto de Guararapes. Ricardo Zarattini era militante do PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário) e deputado federal pelo PT de São Paulo. Ele é pai do atual deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP).

A defesa de Ricardo Zarattini recorreu à Justiça, alegando que o entrevistado fez acusações falsas, e a divulgação da entrevista resultou em grave dano à sua honra. De acordo com ele, o jornal reproduziu uma afirmação falsa contra ele, apresentando-o à opinião pública como criminoso. Os ministros já analisaram o caso e decidiram que o jornal deve ser responsabilizado pela declaração. Com a fixação dessa tese, espera-se que essa definição oriente outros casos semelhantes que estão em tramitação na Justiça.

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