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É ilícito o emprego de tais recursos, no todo ou em parte, para financiar candidaturas masculinas

Alexandre Francisco de Azevedo

Especial para o Jornal Opção

Não tem erro. Tão logo começo a falar, em aulas ou em palestras, sobre a cota de candidaturas por gênero, alguém tece o seguinte comentário: “Mas, professor, mulher não quer se candidatar” seguido por “mulher não gosta de política”. Há ainda os mais corajosos que afirmam ser “as cotas inconstitucionais, pois ninguém pode ser obrigado a se candidatar”.

Neste momento, discorro sobre a educação política que os partidos deveriam fazer visando atrair as filiadas para as campanhas políticas e, então, pergunto o que a agremiação tem feito. Dizer que as mulheres não querem se candidatar, que as mulheres não gostam de política além ser uma completa falácia, é preconceituoso.

O que as mulheres não gostam é de serem usadas como um objeto apenas para cumprir uma cota legal.

Em um evento com a deputada Lêda Borges, na Assembleia Legislativa, sobre a participação feminina na política, foi destacado que a representação feminina na Casa sofreu retrocesso de mais de 20 anos. Com efeito, atualmente há naquela Casa Legislativa apenas duas deputadas.

Visando combater fraudes na cota de gênero, o Tribunal Superior Eleitoral, sob a presidência da ministra Rosa Weber — olha a importância de representação nos lugares públicos —, vem adotado interpretação à legislação eleitoral de modo a proteger e incentivar as candidaturas femininas.

Inicialmente, passou a entender ser cabível a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime) para apurar ocorrência de fraude na cota de gênero. Constatada a fraude, a consequência é a cassação de toda a chapa proporcional — não atinge, portanto, o prefeito eleito, mas apenas os vereadores — com determinação da retotalização dos votos.

Os elementos utilizados para verificar a configuração da fraude são, dentre outros: a) votação das candidatas; b) recursos utilizados pelas candidatas; c) atos de campanha eleitoral.

Em caso julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, constatou-se a fraude, uma vez que as candidatas tiveram votação zerada, arrecadação e gasto zerados e não tiveram nenhum ato de campanha eleitoral. No comício realizado pela coligação todos os candidatos masculinos foram chamados e discursaram — menos as candidatas.

Para as eleições de 2020 o Tribunal Superior Eleitoral determinou, em suas resoluções, que, no mínimo, 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) — recursos públicos — devem ser utilizados para as candidaturas femininas. Caso a proporção de mulheres seja maior, os recursos do FEFC deverão ser aplicados na mesma proporção.

Exemplificando, imagine-se que o partido A tenha 30% de candidatas, então deverá aplicar em suas candidaturas 30% do FEFC. Mas se esse mesmo partido tiver 40% de candidatas, nesse caso deverá aplicar 40% do FEFC.

Os recursos que foram repassados para as candidatas deverão ser utilizados exclusivamente em suas candidaturas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, para financiar candidatura masculinas.

A imprensa noticiou um caso bastante elucidativo: determinada candidata, faltando poucos dias para as eleições, recebeu quase R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) do FEFC e os utilizou para pagar a impressão de materiais gráficos. À toda evidência, utilizaram a candidata para pagar despesas de todos os candidatos da agremiação.

Na Resolução das eleições de 2020, o Tribunal Superior Eleitoral prescreveu que tal conduta representará gasto ilícito atrair as punições do artigo 30-A da Lei das Eleições, além da obrigação de restituição do numerário ao tesouro nacional.

Por fim, o Tribunal Superior Eleitoral fez constar nas normas para essas eleições que a divisão do tempo de propaganda no rádio e na televisão, destinado às candidaturas proporcionais, deverá observar o percentual de candidaturas por gênero.

Por outras palavras, do tempo destinado à propaganda dos vereadores, no mínimo 30% deverá ser destinado às candidatas.

Espera-se que, com essas ações, os partidos políticos se conscientizem sobre a importância de incentivar as candidaturas de suas filiadas, pois, caso contrário, perderá dinheiro e tempo de rádio e televisão. Além de, eventualmente, configurada a fraude, perder os mandatos de seus candidatos.

Por que não fazer diferente? Por que não cumprir a legislação e incentivar a candidatura feminina?

E para vocês mulheres, por que não, dentro de sua ideologia política, votar em candidatas? Senso de classe importa. A sociedade somente terá a ganhar com a representação feminina nos lugares públicos.

Alexandre Francisco de Azevedo é professor-mestre na Unifan e na PUC-Goiás. Twitter: @alex_eleitoral. É colaborador do Jornal Opção.