Exército se recusou a dispersar golpistas em 8 de janeiro, afirmam PMs

25 junho 2023 às 07h00

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Policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar do Distrito Federal divulgaram recentemente novos detalhes sobre a inércia dos militares do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), ligados ao Exército, durante a invasão do Palácio do Planalto no ato golpista ocorrido em 8 de janeiro.
Essas informações foram reveladas em depoimentos e relatadas pelos próprios policiais militares que estiveram envolvidos no confronto com os golpistas.
De acordo com informações exclusivas do portal UOL, os policiais militares fizeram parte do grupo Patamo Alfa, do Batalhão de Choque, e foram acionados no início da tarde de 8 de janeiro, quando os golpistas se dirigiram à Praça dos Três Poderes para tentar invadir os prédios. Além disso, eles destacaram postura violenta dos golpistas e uma série de agressões direcionadas às forças policiais, representando uma “grave ameaça à vida”.
A documentação revela suspeitas adicionais de irregularidades na atuação do Exército durante o ato golpista ocorrido em 8 de janeiro.
“Não podemos atuar”
Um dos relatórios mais contundentes foi elaborado pelo então primeiro-sargento Beroaldo José de Freitas Júnior, que estava envolvido na defesa do Palácio do Planalto quando os golpistas tentaram invadir o prédio.
Em reconhecimento à sua atuação em 8 de janeiro, ele foi promovido a subtenente em maio. De acordo com Beroaldo, os militares solicitaram ajuda a um pelotão do Exército que estava equipado e pronto para intervir na área externa do Planalto, mas receberam uma resposta negativa.
“O Patamo Alfa combateu na defesa do Palácio do Planalto e na via N1; ficamos obrigados a recuar mesmo contra nossa doutrina, pois fomos superados de forma desproporcional ao efetivo empregado, que era de dez escudeiros, dois atiradores e três operadores químicos. Durante o recuo, nos aproximamos da guarita do Palácio do Planalto, onde um pelotão do Exército Brasileiro encontrava-se pronto e equipado; solicitei ajuda dos mesmos para nos auxiliar contra a turba, mas recebi a seguinte resposta: “Não podemos atuar”. Insisti para que pelo menos abrisse a grade/portão de acesso para que o Pelotão de Choque pudesse se abrigar ali e diminuir, mesmo que de forma precária, o ataque ferrenho que enfrentávamos, e, novamente, recebi como resposta que não podiam nos ajudar”, relatou o militar.
De acordo com o relatório de Beroaldo, diante da recusa do Batalhão da Guarda Presidencial em auxiliar na contenção dos manifestantes, ele tomou uma iniciativa de chutar a grade de proteção do Palácio do Planalto para adentrar ao território e proteger a tropa de choque no local. Assim, eles formaram uma linha de defesa conjunta com os militares do Exército. No entanto, conforme relatado por ele, os militares recuaram e abandonaram a linha de defesa.
“Já na área (interna) do Palácio do Planalto, onde reorganizamos a tropa e nos salvamos de um massacre certo, com essa atitude, forçamos o Exército a combater os vândalos também. O confronto se intensificou, novamente, por volta das 15h30, momento em que nos cercaram no Palácio do Planalto: o Exército Brasileiro acabara por abandonar a linha que anteriormente fizera ao lado do Patamo, uma vez que se afastaram para a retaguarda da tropa devido ao gás lacrimogêneo; por duas vezes isso ocorreu – diante do desespero que tomou conta da tropa do Exército – momento em que fui compelido a tomar algumas atitudes para o oficial à frente da tropa do Exército e falei em alta voz para que comandasse sua tropa e parasse de “frouxura”. Reconheço que fora uma medida extrema, a fim de que essa incoerente apatia do oficial do Exército não contaminasse nossa tropa e fôssemos dominados pelo medo e desespero, o que resultaria consequências devastadoras e derrota certa”, destacou Beroaldo.
Prisões
Os relatos dos policiais indicam que, após realizarem a detenção de golpistas que estavam ocupados nos prédios dos Três Poderes, dirigiram-se ao quartel-general do Exército com o intuito de prender golpistas manifestantes que ainda estavam presentes no local no dia 8 de janeiro . De acordo com diversos policiais, a narrativa é semelhante: a ação policial foi impedida por ordem da alta cúpula do exército, que chegou a posicionar veículos blindados na entrada do quartel-general.
“Às 21h20 as tropas embarcaram nas viaturas e seguiram em comboio em direção ao SMU, onde efetuamos diversas prisões e não prosseguimos nas operações por intervenção dos militares do Exército Brasileiro subordinados ao Comando Militar do Planalto; ademais permanecemos no local aguardando novas ordens”, contou Loraine Prado Nascimento de Freitas, primeiro-sargento da Polícia Militar do DF.
Em seu depoimento à Corregedoria da Polícia Militar, o segundo-tenente Marco Aurélio Feitosa, responsável pelo comando da tropa de choque do grupo Patamo Alfa durante uma dispersão na Esplanada dos Ministérios, afirmou que os presos se deslocaram na direção ao quartel-geral do Exército com o objetivo de enganar a prisão de vândalos que tentavam escapar e se esconder no local. Ele relatou que, de fato, houve uma detenção de golpistas na entrada do Setor Militar Urbano, mas uma ação foi interrompida.
“As operações não puderam prosseguir devido à oposição do Exército Brasileiro, que posicionou blindados no local”.
Feitosa também revelou que o tenente-coronel Jorge Fernandes da Hora, comandante do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) e oficial do Exército, tentou evitar a prisão dos invasores no Palácio do Planalto após uma tropa de choque ter retomado o controle da área.
“No momento que a tropa de choque adentrava no Palácio do Planalto, os vândalos correram com o aparente objetivo de abandonar o prédio e evitar a prisão. A tropa de choque da PMDF enfrentou a oposição inicial do Comandante do Batalhão da Guarda Presidencial (Coronel Da Hora), que alegava que os vândalos já estavam descendo”, disse.
Em seguida, de acordo com o relato de Feitosa, ele afirmou ao tenente-coronel Jorge Fernandes da Hora que “ninguém seria autorizado a deixar o prédio, pois todos estavam detidos, conforme ordens expressas de oficiais superiores do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) , incluindo o ministro do GSI, para a prisão de todos os vândalos”.
O tenente-coronel Jorge Fernandes da Hora foi convocado para prestar depoimento à Polícia Federal em abril, após ter sido mencionado por policiais militares em seus depoimentos. Ao considerar a responsabilidade dele e de outros militares do Exército no caso ainda estarem em andamento, e nenhuma conclusão foi concluída até o momento.