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Por Stéfany Fonseca
A recente troca de farpas entre os deputados goianos Bia de Lima (PT) e Amauri Ribeiro (UB) vai muito além do que parece. Não se trata apenas de uma disputa entre dois parlamentares. O episódio é mais um sintoma do adoecimento do debate público brasileiro — um duelo estéril entre direita e esquerda que já não serve mais ao interesse coletivo, mas sim a paixões cegas que transformam qualquer gesto, piada ou discurso em munição ideológica. É a incoerência elevada à institucionalidade.
A discussão ganhou os holofotes quando, em uma entrevista descontraída, a deputada Bia mencionou sua preferência por homens mais jovens, usando o termo “novinhos”. A apresentadora, em tom de brincadeira, a chamou de “papa-anjo”, e ambas riram. Até aí, uma conversa corriqueira e informal. Mas Amauri Ribeiro enxergou uma oportunidade de atacar a colega. Usou a gravação da entrevista na tribuna da Assembleia e acusou a deputada de comportamento pedófilo. Um absurdo.
Aqui, cabe uma pergunta incômoda, mas necessária: se um deputado de 60 anos dissesse publicamente que gosta de “novinhas”, alguém o acusaria de pedofilia? A resposta, infelizmente, é não. Em um país ainda profundamente patriarcal, esse tipo de fala masculina é banalizada ou até romantizada. Homens são chamados de “garanhões”; mulheres, de “imorais”. A violência política de gênero, ainda que disfarçada de indignação moral, escancarou-se nesse episódio.
Por outro lado, quando se trata da defesa de valores e da atuação parlamentar, a esquerda também falha ao recorrer a dois pesos e duas medidas. O mesmo deputado que cometeu o absurdo de tentar criminalizar uma piada de gosto duvidoso é também aquele que, recentemente, leu na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa trechos do livro “O Avesso da Pele”, de Jeferson Tenório. Uma obra literária indicada pelo próprio MEC, mas que vem sendo questionada por setores conservadores por conter linguagem considerada “vulgar”.
Não há nada de equivocado no direito do parlamentar de criticar o conteúdo do livro. Ele tem legitimidade para isso. A obra, aliás, é uma reflexão sobre o racismo estrutural e as marcas da violência policial na vida de um jovem negro — temas que incomodam justamente por escancarar feridas que parte do Brasil prefere ignorar.
Se o livro é considerado apropriado para a sala de aula, por que não seria também entre as paredes do parlamento estadual? O questionamento do parlamentar é pertinente e merece reflexão.
Ambos os parlamentares, no fundo, são produto de um país fraturado desde 2018, com o acirramento da polarização entre lulistas e bolsonaristas. Um Brasil que não debate mais ideias, apenas acusa, grita, cancela e idolatra. Lula e Bolsonaro se tornaram arquétipos mitológicos de um embate sem fim, onde o bom senso morreu soterrado sob os escombros da idolatria política. E os parlamentares seguem esse script à risca, reproduzindo o mesmo teatro de guerra no microcosmo do Legislativo goiano.
O problema maior, portanto, não é a fala da deputada, nem a leitura do livro pelo deputado. O problema é que ambos os lados perderam a capacidade de dialogar, de ponderar, de reconhecer erros e excessos nos próprios aliados. A política virou torcida organizada, e quem pensa diferente vira inimigo — e não adversário.
Enquanto isso, os problemas reais do país continuam sem solução. Educação, saúde, segurança pública, desigualdade social… esses temas não rendem likes, não inflam redes sociais e tampouco atiçam os extremos ideológicos. Mas são eles que importam. O resto é só espuma.
Está mais do que na hora de romper com essa lógica binária que empobrece o debate e adoece a democracia. O Brasil não precisa de soldados ideológicos, precisa de políticos com coragem para pensar com a própria cabeça — e, principalmente, com o coração voltado para o bem comum.
Bia ou Amauri?
Ambos são produtos de realidades distintas e visões de mundo inconciliáveis.
Bia, mãe solo, sindicalista, professora, mulher de origem humilde. Amauri, produtor rural, homem do interior, conservador, pai de três meninas e defensor da chamada “família tradicional brasileira”. São representantes legítimos de espectros opostos, que jamais compreenderão completamente as vivências e valores um do outro. E sempre acreditarão que sua luta é a mais justa.
Mas há algo que os une: o desejo de um Brasil melhor. Ambos querem um país sem corrupção, sem violência, sem desigualdade — um lugar onde se possa andar nas ruas sem medo, onde a fome não exista, onde a justiça social não seja uma utopia. No entanto, apesar de almejarem os mesmos resultados, os dois talvez sempre vão acreditar que estão em lados opostos da batalha.
O verdadeiro inimigo não é Lula nem Bolsonaro. É a máquina e a estrutura que, todos os dias, esmagam o povo brasileiro. Mas talvez eles ainda não estejam preparados para essa conversa.
Stéfany Fonseca é jornalista formada pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás
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