Nihal Naim nasceu em um lugar onde sempre pareceu que não teria paz. Na Palestina, mais especificamente na Cidade de Gaza, a hoje especialista em Marketing, viu momentos de paz e guerra durante toda a sua vida. Porém, esses momentos de guerra se tornaram ainda mais frequentes desde 7 de outubro, início de mais uma etapa de uma limpeza étnica promovida pelo Estado de Israel em Gaza.

Ao Jornal Opção, Naim narrou que os últimos 9 meses em Gaza tem parecido uma década de sofrimento, perda, dor e privação, o que se difere dos últimos anos. O começo de 2023 foi como de qualquer outro ano, Naim tinha sonhos e uma rotina tranquila. Ela havia acabado de conseguir um novo emprego em uma boa empresa com possibilidades de crescimento. Ela tinha uma vida produtiva.

Porém, o fim do mesmo ano foi algo totalmente diferente e manchado de sangue e perdas para todos em Gaza. Os lugares mudaram, as condições mudaram e a vida mudou quando Israel começou a bombardear Gaza de forma mais intensa.

Nihal Naim | Foto: Redes sociais

No dia 10 de outubro, Naim viu sua vida quase escapar de seu corpo quando ouviu avisos de Israel para esvaziar áreas residenciais 4 minutos antes de iniciar ataques a drones. As 39 pessoas que viviam naquele prédio viram, quando conseguiram evacuar, um prédio a cerca de 50 metros ser destruído. Naim, por sua vez, se sentiu impotente, como se não conseguisse ter uma vida ou cuidar de sua mãe, que busca formas de tratar um câncer. Então, 3 dias depois do início do que é chamado de guerra, Naim se viu sem lar e se tornou uma refugiada.

Para ela, o início do conflito também causou o início de um estado de aceitação de que a partir dali ela teria que viver em constante refúgio na tentativa de sobreviver. No momento em que ela se viu forçada a sair de sua casa deixando suas coisas, seu dinheiro, seu trabalho, ela notou que às vezes seria necessário deixar de lado tudo para conseguir uma única coisa: sobreviver.

Todos os lugares que Naim tentava se refugiar tinha um problema: as células de ocupação israelenses estavam mais próximas a ela. Isso causava desespero, pois o risco de morte de mulheres e crianças próximas à essas células crescia a cada minuto que passava.

Naim é uma mulher de 31 anos que, antes do início da guerra mais recente em Gaza, começou a trabalhar em uma empresa da Cisjordânia como Especialista em SEO. Ela se via como uma sonhadora ambiciosa nascida em uma família orgulhosa de sempre ter dado condições para que ela e suas irmãs realizassem sonhos.

No primeiro dia, um bombardeio atingiu seu local de trabalho em Gaza. Naim, então, ficou sem seus contatos e sem acesso à internet, o que lhe impede de trabalhar. Essa interrupção da internet e energia é quase que permanente, fazendo com que até hospitais fiquem sem condições de tratar feridos em um conflito que já matou quase 40 mil pessoas.

Naim se tornou desempregada no primeiro dia de conflito e viu suas responsabilidades diárias mudarem completamente. Após o bombardeio de sua casa, ela e sua família se tornaram obrigados a buscar refúgio diariamente. Hoje, ela vive com sua mãe doente em tendas que não as protegem do inverno frio ou do verão quente de Gaza.

Outro fator que dificultou a vida de Naim é a constante busca por alimentos, água e produtos de higiene pessoal. Além disso, Gaza sofre com constantes apagões, falta de água, de internet e de alimentos perecíveis.

Rotina

Naim acorda às 2 da manhã, quando consegue dormir. Ao acordar, ela já deve se dirigir a filas de ajuda humanitária para buscar comida e água potável para passar o dia. Nessas filas, segundo ela, não há diferença entre homem, mulher, criança ou idoso. Cada um é responsável por carregar o que conseguir para sobreviver. Para ela, a tarefa de carregar água pode levar mais de 4 horas e tem vezes onde ela não consegue nada para se hidratar.

Após essa tarefa, às 5h da manhã, ela e sua mãe tentam descansar mais um pouco enquanto seu pai busca madeira para produzir uma fogueira para que possam ter um café da manhã. Tudo é feito de forma manual em Gaza.

Todos os dias, Naim vai aos pequenos mercados que sobraram no sul de Gaza para tentar encontrar comida fresca que são afetadas pelos preços excessivos. Às vezes, ela precisa procurar por até três horas por dia para encontrar carne e vegetais frescos, mas, na maioria dos dias, isso não pode ser encontrado. Naim e sua família, então, se contentam com pequenos lanches como se fossem refeições.

Até hoje Naim busca uma forma de ajudar no sustento de sua família, mesmo no meio de um conflito que devastou seu país. Após ter a segunda e última refeição do seu dia, ela sai em busca de locais que ainda possuam internet funcionando para fazer pequenos serviços de freelancer. São dezenas de pequenos prédios e áreas de refugiados até que se encontre algum lugar que possa fornecer condições de que ela trabalhe.

Ao anoitecer, por volta das 7 da noite, ela então começa mais uma busca: produtos de higiene básica. Esses produtos estão em falta em Gaza e, por conta de bloqueios, se tornam ainda mais difíceis de se conseguir. Sabonetes e shampoos, muitas vezes, não podem ser encontrados, fazendo com que em muitas ocasiões para essa família, ocorra uma luta incessante em busca de higiene.

Essas práticas foram impostas aos palestinos que vivem em Gaza desde o 7 de outubro, fazendo com que muitos deles, se não a totalidade, se sintam exaustos devido a falta de escolhas ou, como Naim chama, condições de morte certa em que vive.

Ajuda

Desde o terceiro mês de “conflito”, Naim conseguiu implementar grandes campanhas de caridade para ajudar os inocentes que estão presos no Norte da Faixa de Gaza. Ela, hoje, não é mais responsável pelas campanhas mas elas ajudam fornecendo comida para os afetados. Você pode ajudar através do link.

Nihal Naim comemora campanha de arrecadação de roupas de verão para 88 crianças em Gaza e reforça o pedido de ajuda e apoio às pessoas do território palestino | Foto: Redes sociais

Outro ponto que Naim buscou para fugir da realidade foi a criação de um espaço no Sul de Gaza para que freelancers possam ter acesso a internet e, assim, conseguir trabalhos. Até o momento, essa iniciativa conseguiu restaurar trabalhos para 70 cidadãos de Gaza que não tinham condições de trabalhar por conta da falta de eletricidade e internet.

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