Filipe Suzin explicou que cultivo da planta possibilita aproveitamento de todos os componentes, diferente de remédios industrializados

Na última terça-feira (14), os ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitiram a três pessoas o plantio de maconha para fins medicinais, uma decisão inédita no tribunal. O colegiado concluiu que a produção artesanal do óleo com fins terapêuticos não representa risco de lesão à saúde pública ou a qualquer outro bem jurídico protegido pela legislação antidrogas.

Por meio do salvo-conduto, que possibilita a segurança jurídica, o plantio da maconha não será enquadrado como crime para o trio. Em Goiás, houve uma decisão parecida direcionada ao empresário Filipe Barzan Suzin. Um dos responsáveis pela Associação Curando Ivo, o empresário chamou atenção após criar, em 2020, conta na redes sociais para relatar a melhora do Alzheimer que atinge o pai, Ivo Suzin, através de óleo extraído da maconha — da qual Filipe também faz uso para leucemia.

“Com o cultivo a gente tem a possibilidade de ter dentro de casa genéticas distintas, de poder testar essas genéticas, ver qual a comporta melhor e traz mais benefícios e qualidade de vida para o paciente. Isso é um fator muitíssimo importante, além de baratear bastante o acesso ao medicamento, porque a gente produz dentro de casa, dentro de uma sala, em área externa e cada um envolve um valor.  Mas é importante dizer como pode diminuir o custo”, ressaltou o empresário, que faz uso de inalação de componentes da planta para conter sintomas do tratamento para leucemia, como enjoo. “O único remédio do meu pai é esse que eu faço em casa”, completou.

Apesar de ter comemorado a decisão, Filipe Suzin criticou que seja estabelecido um limite para o número de plantas permitidas para o cultivo. “Na decisão eles limitam a quantidade de plantas permitidas. Isso não é interessante porque o paciente tem que ter a autonomia de entender quantas plantas são necessárias”, declarou.

Judiciário e Legislativo

O diretor jurídico da Associação Curando Ivo, Matteus Jacarandá, explicou que a decisão inaugurou um novo entendimento no âmbito jurídico sobre o assunto. O advogado ressaltou, no entanto, que a decisão não é vinculante, ou seja, vale apenas para os três envolvidos e não permite que outras pessoas também cultivem a planta. “O STJ nada mais fez do que fazer valer a lei de drogas, que diz que a União pode autorizar o plantio das plantas descritas como drogas para fins medicinais. Como o legislativo e o executivo permaneceram omissos, relutantes, o judiciário assumiu uma posição de destaque para resolver essa controvérsia”, afirmou.

“A decisão de ontem inaugurou um novo entendimento. A lei diz que o plantio e a colheita de vegetais do qual possam derivar drogas é crime, mas o STJ vem dizendo que a conduta do paciente que usa para fins exclusivamente medicinais, desde que preenchidos os requisitos médicos, demonstra a responsabilidade e o entendimento sob a produção caseira do seu próprio fitoterápico. Isso vai nortear os novos casos, abriu as portas”, comemorou.

O vereador de Goiânia e advogado Lucas Kitão ressaltou que essas decisões individuais dão segurança jurídica, mas falta um marco regulatório para assegurar a conduta dentro da legislação brasileira. Além disso, ele ressaltou que a decisão da corte constitui um erga omnes, ou seja, é de repercussão geral e vai influenciar em outros processos parecidos.

“Temos muitas decisões com esse conteúdo de salvo-conduto, onde a pessoa tem a segurança jurídica provisória. O STJ vem pacificando entendimento geral. Com a jurisprudência do STJ, não vai ter como negar, vai valer para outras instâncias judiciais. No entanto, é uma grande perda que isso não seja previsto na legislação. Se tivesse um marco regulatório para plantar, seria melhor, a pesquisa andaria muito mais rápido. É um universo muito grande”, explicou. “A sociedade anda de elevador. As leis andam de escada”, ressaltou, em referência a falta de celeridade nas discussões do marco regulatório do uso da planta na Câmara Federal.