Presidente de comissão do Senado responsável por analisar alterações, o goiano relata dificuldade do Brasil em compactuar mudanças com países lusófonos

Senador Cyro Miranda (ao centro), com Bechara e Ernani Pimentel: especialistas divergiram em relação a novas mudanças | Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Senador Cyro Miranda (ao centro), com Bechara e Ernani Pimentel: especialistas divergiram em relação a novas mudanças | Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, o senador goiano Cyro Miranda (PSDB), defendeu que o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa seja aprovado como está. Em entrevista ao Jornal Opção Online nesta quinta-feira (23/10), o tucano disse que a questão foi mal discutida, e que, inclusive, alguns países lusófonos que assinaram o acordo não se incorporaram às mudanças.

“Nós não podemos fazer uma alteração ortográfica ultramais, ou voltar atrás, o que é muito perigoso”, disse. Cyro Miranda alertou que os alunos das escolas irão começar os estudos aprendendo uma regra e, após um ano, o ensino será alterado.

Isso porque o acordo era para entrar em vigor em 31 de dezembro de 2012 no Brasil. Porém, os integrantes da comissão solicitaram o adiamento na época. O pedido foi acatado em decreto pela presidente Dilma Rousseff (PT). A nova data para a aplicação é de 1º de janeiro de 2016.

Segundo o senador, a realidade do atual acordo reflete a “incapacidade” do governo federal de estar presente nas negociações tanto internas quantos externas para aprimorar as medidas. “Se foi mal feito ou não, estamos praticando ele aqui.” Na opinião dele, o acordo não terá sucesso internacionalmente — esta é a segunda tentativa de unir a Língua Portuguesa. “O importante é não mexermos na nossa ortografia. Nesse momento, podemos sim fazer um estudo durante muitos anos para simplificar a nossa ortografia em consonância com a fonética, mas que não seria executada agora”, argumentou.

Conforme pontuou o político à reportagem, não se pode aceitar nenhuma mudança na ortografia, de modo que não se altere princípios básicos da cultura e história nacional. Caso os outros países não aceitem as alterações, será criada uma confusão. “Não é brincadeira. Há editoras [de livros] e toda uma base acadêmica de ensino de primeiro grau, fundamental e médio envolvida”, sustentou.

Além do Brasil, a articulação, assinada em decreto do dia 16 de dezembro de 1990 pela presidência da República, envolve Guiné-Bissau, Cabo Verde, a República Democrática de São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique e Portugal — junto ao Brasil, esses três últimos países pediram o adiamento da unificação da língua.

As regras do último acordo estão sendo adotadas no Brasil, por editoras, por exemplo, mas só serão obrigatórias a partir do ano que vem. No entanto, não se sabe se o País irá aderir às mudanças.

Debates

Nesta semana, a comissão presidida por Cyro Miranda realizou debates com especialistas da Língua Portuguesa. Na terça-feira (21), o gramático Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras (ABL), defendeu o acordo. Em contrapartida, Ernani Pimentel, presidente do Centro de Estudos Linguísticos da Língua Portuguesa, cobrou maior simplificação gramatical, mas futuramente.

Evanildo Bechara considerou que a simplificação fonética, “aparentemente ideal”, resultaria em mais problemas que soluções, pois extinguiria as palavras homófonas (aquelas que têm o mesmo som, mas escrita e significados diferentes). Como é o caso de seção, sessão e cessão, que ficariam reduzidas a uma só grafia – sesão –, e prejudicaria a compreensão da mensagem.

O gramático disse que as dificuldades na alfabetização e no ensino da língua escrita não se resolvem com a simplificação ortográfica. A opinião é compartilhada por Cyro Miranda: “Sou apenas mediador, como presidente [da comissão] não posso me envolver em partido e linhas de defesa. Tem um pensamento muito avançado, e outro muito avançado. Se dependêssemos de alguns, estaríamos escrevendo farmácia com PH. O problema pode ser resolvido no início dos estudos”, argumentou.

Ernani Pimentel é contra as mudanças, citando que não houve diálogo com a sociedade e com quem atua na área. Ele lidera o movimento para adoção de critério fonético na ortografia, ou seja, a escrita das palavras orientada pela forma como se fala. A partir desse critério, a palavra “chave”, por exemplo, seria escrita com x — chave –, sem preocupação em considerar a etimologia.

O político goiano concorda que a nova reforma é muito confusa, pois há situações de confusão entre a escrita e a fala. “Coisas que usualmente se faz de uma maneira, mas a lógica é outra, e vice-versa. Ela é necessária, mas não agora”, falou Cyro Miranda.

Outros debates serão feitos, principalmente com os professores que, de acordo com o senador, estariam “chiando”. Isso porque os profissionais não foram chamados para a discussão. “Na verdade, ninguém foi ouvido. Esse acordo foi feito pela ABL, somente. Essa que é a grande revolta. Por isso, a comissão tem por obrigação trazer o problema e, democraticamente, discutir a questão. Não temos e nem é competência nossa dizer se haverá reforma”, avaliou. Segundo o senador, a instituição foi convidada diferentes vezes para o debate, mas nunca mandou representante.

Para Cyro Miranda, houve um despreparo no passado e o acordo foi feito a toque de caixa, sem o envolvimento da sociedade. Questionado sobre como promover o diálogo em um Brasil tão extenso, o tucano adiantou que pretende fazer comissões permanentes com coordenação para que as discussões abranjam todo o território nacional.