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Advogado agroambiental Marcelo Feitosa explica que lei permite interferência em Área de Preservação Permanente em caso de obras de utilidade pública, como o aeroporto

Foto: Renan Accioly
Operários retiram árvores em Área de Preservação Permanente com o objetivo de abrir caminho para a construção de uma bacia de contenção| Foto: Renan Accioly

O corte de árvores na Área de Preservação Permanente (APP) da nascente do Córrego Jaó foi autorizado pela Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima), conforme explicou o órgão à reportagem.

Após questionamentos feitos pela Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) e veiculados com exclusividade pelo Jornal Opção, a pasta foi ao local fiscalizar e esclareceu que uma licença foi emitida à Infraero permitindo a retirada da vegetação, como parte das obras para a construção de uma bacia de contenção. Dúvidas foram levantadas após ser observada a poluição do lago natural da nascente, ao lado da Rua da Divisa.

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O Código Florestal estabelece que devem ser mantidas APPs em um raio de 50 metros ao redor das nascentes. Na última semana, o Jornal Opção mostrou que o lago natural da nascente está sendo poluído com sedimentos do solo e das obras do Aeroporto de Goiânia. Um técnico da Amma foi ao local e constatou que a nascente ainda está preservada, mas a lagoa – cuja água vai para o córrego – está comprometida.

Na tarde desta segunda-feira (30/11), dois técnicos da Secima foram ao local observar a poluição. Entretanto, segundo o gerente especial de Fiscalização, Monitoramento e Auditoria Ambiental, Vitor Lenza Júnior, não existe irregularidade no local. “O que aconteceu ali foi que a água da chuva levou parte do solo para o lago. De qualquer forma, aquela água já é barrenta mesmo. Lá nem tem peixe e a lagoa só se forma em época de chuva”, disse.

Agora, segundo o funcionário, a Infraero colocou britas sobre o solo para impedir que mais sedimentos naturais e da própria obra sejam levados ao lago da nascente (como tem acontecido), podendo gerar assoreamento.

Situação de lagoa natural próxima à nascente do Córrego assusta | Foto: Renan Accioly
Situação de lagoa natural próxima à nascente do Córrego assusta | Foto: Renan Accioly

Para o gerente, a obra da nova bacia de contenção pode parecer ruim por um lado, por estar alterando o meio ambiente, mas por outro, garante que ação está sendo positiva para a região. De acordo com ele, quando chove, a água normalmente chega com muita força no lago. E para ele, a bacia de contenção, que está sendo construída pela Infraero, irá auxiliar neste sentido. “E não vai impactar sobre a nascente. Vai continuar o curso normal”, assegurou.

Sobre o fato de terem ido, então, ao local, após matéria veiculada pelo Jornal Opção, Vitor Lenza alegou que a secretaria foi apenas observar se a Infraero estava realizando a obra conforme permitido. O gerente disse não entender porque a Amma está se envolvendo no caso, uma vez que, de acordo com ele, caso compete à Secima.

O diretor da Amma, Wilmar Mendes, rebateu dizendo que o caso ocorreu dentro de Goiânia e, por isso, não poderia ficar omisso — mesmo que a Secima afirme que concedeu as licenças. “Vamos continuar monitorando a região e fiscalizando para ver se está tudo correto.” O funcionário explicou que ainda não recebeu a documentação requerida à Infraero — a outorga de água e a licença ambiental. “Está complicado, porque estamos desentendidos com o que de fato aconteceu.”

Foto: Renan Accioly
Foto: Renan Accioly

Vitor Lenza explicou que a licença para a retirada das árvores foi concedida com a promessa de compensação ambiental, que deverá ser a reposição da vegetação no local. Caso não seja o local exato de onde a vegetação foi retirada, poderá ser em alguma outra área da região.  “Olha, a gente sabe que bonito não está, mas a obra está legal em relação ao meio ambiente.”

O advogado agroambiental Marcelo Feitosa disse, entretanto, que no Código Florestal não há nada estabelecendo uma compensação ambiental. Feitosa ainda esclarece que o artigo 8º da Lei 12.652/2012 do novo Código Florestal permite a intervenção em Área de Preservação Permanente somente em hipótese de utilidade pública, como é o caso do Aeroporto de Goiânia.

Entretanto, a permissão deve ser concedida pelo órgão competente estadual – no caso, a Secima. “Deve-se ressaltar que ainda que haja essa permissão, é vedado qualquer ação que possa colocar em risco a existência do manancial”, explica. E completa: “Se houver de fato a autorização do governo estadual, não há crime ambiental”

Utilização da água

Lago natural da nascente do Córrego Jaó, ao lado da Rua da Divisa. Água fica no local e em seguida segue curso do córrego| Foto: Renan Accioly
Lago natural da nascente do Córrego Jaó, ao lado da Rua da Divisa. Água fica no local e em seguida segue curso do córrego| Foto: Renan Accioly

A Infraero obteve ainda por parte da Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh), antiga Secima, a outorga de água do lago da região em questão. O documento o qual o Jornal Opção teve acesso foi emitido em 2012 e prevê a liberação do uso do recurso por 6 anos. Na outorga, pontua-se que a água poderá ser bombeada de janeiro a dezembro, com vazão de 8,4 litros por segundo.

O advogado Marcelo Feitosa explicou que a outorga nada mais é que uma permissão do uso do recurso hídrico, algo permitido conforme a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos. Deve haver, entretanto, fiscalização constante por parte do poder público para observar a utilização correta do recurso, conforme estabelecido pela outorga, que poderá ser revogada em caso de descumprimento.