Revisão do saldo do FGTS: ingressar ou não com ação judicial

14 maio 2021 às 23h05

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Muitos clientes têm nos questionado se é interessante ou não ingressar com ação judicial revisional do FGTS
O FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço foi criado pela Lei Federal nº 5.107/1966, sendo uma “poupança obrigatória” onde todas as empresas devem recolher, mensalmente, 8% do montante a ser pago para o trabalhador, para uma conta vinculada ao número do PIS do trabalhador, junto à Caixa Econômica Federal. Essa conta rende juros e correção monetária, sendo que a lei determina os casos em que o trabalhador poderá efetuar saques.
Entretanto, apesar de a “poupança ser obrigatória”, o trabalhador, além de não ter o direito de sacar quando bem entende, ainda não pode escolher uma aplicação que lhe seja mais rentável, já que a lei define que a Caixa Econômica Federal é a instituição responsável pela gestão do FGTS, que os juros são de 3% e que a correção monetária deve ser calculada com base na TR (Taxa Referencial).
E é esse justamente o impasse, pois a partir de 1999 a TR já não refletia mais a inflação do período, o que levou a defasagem dos saldos nas contas do FGTS dos trabalhadores, sendo que outros índices oficiais de correção monetária deveriam ser usados para recompor as perdas, como, por exemplo o INPC.
O Supremo Tribunal Federal (STF), em 2013 já havia decidido pela não se aplicação da TR para corrigir as perdas inflacionárias de precatórios (decisões transitadas em julgado onde o governo é o devedor), sendo que tal entendimento é o mesmo que serve como tese quanto a revisão dos saldos do FGTS calculados desde 1999.
Dessa forma, quem trabalhou com carteira assinada, no período de 1999 em diante, teria direito a pleitear judicialmente a revisão dos valores, para que seja aplicado outro índice de correção que reflita a inflação do período, mesmo que já tenha sacado o FGTS.
Qual é o entendimento do Poder Judiciário?
A questão já foi objeto de manifestação do STJ (Tema Repetitivo 731) que decidiu, por unanimidade, que a TR é a taxa que deve ser aplicada, afastando a pretensão dos trabalhadores.
Entretanto, a questão aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal, que será proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn 5.090), de relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, ajuizada pelo PSOL em 2014.
O julgamento estava previsto para 13/05/2021, mas, mais uma vez, foi retirado da pauta e ainda sem nova data para ser julgado.
Além das várias ações individuais já propostas, a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizou Ação Civil Pública (ACP) junto a Justiça Federal do Rio Grande do Sul em 2014, dada a quantidade de demandas dos trabalhadores que pleiteavam, junto ao Órgão, pelo ingresso de ações individuais em juízo.
Quanto à referida Ação Civil Pública, em primeira instância a decisão foi desfavorável ao pleito dos trabalhadores, sob o argumento de que o STJ já havia decidido que era aplicável a TR. A DPU recorreu ao TRF4, e o processo encontra-se sobrestado aguardando o julgamento do STF, como da mesma forma estão sobrestadas todas as demais ações individuais sobre o tema.
Já que a DPU ajuizou ação civil pública, tem orientado os trabalhadores a não ingressarem com ações individuais, devendo aguardar o fim do julgamento da ADI no STF e os impactos nas demais ações.
O que fazer? Aguardar, conforme informa a DPU ou ajuizar ação revisional individual?
Como a Ação Civil Pública proposta pela DPU abrange toda a coletividade, e como não existe mais o risco de que o STF entenda que a Ação Civil Pública não é cabível no caso do FGTS, porque desde 2019 o STF pacificou a questão, determinando que cabe o ajuizamento de ação civil pública para a defesa de direitos sociais relacionados ao FGTS, não se faz mais necessário que os trabalhadores continuem ajuizando ações individuais, porque já estão acobertados pela Ação Civil Pública proposta pela AGU.
Tenho direito a revisão de todo o período?
Bom, isso vai depender do julgamento da ADI no STF, mas existem algumas possibilidades:
1) O STF decidir pela constitucionalidade da norma que determina a aplicação da TR – esse é o pior dos cenários, porque nesse caso, a discussão se encerra e os trabalhadores não terão direito a revisão. Entretanto, o STF já se manifestou, em outros casos, desfavoravelmente a aplicação da TR, pode ser que siga nesse mesmo caminho.
2) O STF decidir pela inconstitucionalidade da norma que determina a aplicação da TR. Nesse caso, devemos aguardar pela modulação dos efeitos para ver se: i) será (ex tunc) ou, seja se retroage sendo aplicada a todo o período; ii) pelas questões já expostas (risco sistêmico – prejuízo à CEF), a de o STF determinar que os efeitos sejam da publicação da decisão em diante; iii) ou ainda uma solução híbrida.
Em qualquer dos casos, ainda deve-se considerar de que forma o STF apreciará a questão da prescrição, se trintenária ou quinquenal.
Resumindo e deixando em linguagem mais acessível: pode-se ganhar o direito à revisão dos valores de todo o período de 1999 em diante (últimos 30 anos), ou o direito de revisão será de parte dos valores (últimos 5 anos), exemplificando: se a decisão for proferida em 2021, o direito de revisão dos últimos 5 anos, seria do período de 2016 em diante, ou seja, todo o período anterior a 2016 já estaria prescrito.
Ainda, os trabalhadores devem considerar, que por se tratar de ações que geram um alto impacto econômico à Caixa Econômica Federal, isso será levado em consideração no julgamento.
A revisão somente é possível de 1999 até 2013?
Na verdade pode compreender os anos posteriores a 2013, porque a TR continua sendo o índice aplicável, entretanto as ações propostas abarcam o período considerando as datas em que foram ajuizadas.
Assim, o prazo depende de como o STF vai aplicar a questão da prescrição, ou seja, o prazo que o trabalhador terá direito a revisão.
Como se trata de questão econômica o prazo prescricional é de 30 anos (trintenário), ou seja, se o trabalhador está requerendo a revisão do saldo desde 1999, se contarmos 30 anos para frente, ele poderia postular em juízo até 2029.
Entretanto, ao tratar do tema da prescrição, o STF quando se manifestou sobre a cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS , determinou que prescrição seria quinquenal, ou seja, de 5 anos, e modulou os efeitos determinando que para as ações propostas antes da decisão (13/11/2019) o prazo seria trintenário, e para as ações ajuizadas após essa data, a prescrição seria quinquenal.
Veja que, apesar de o que estava sendo discutido era sobre o direito de reclamar os depósitos de FGTS que não haviam sido feitos, é um precedente, e pode ser que o STF se utilize do mesmo raciocínio no julgamento referente à ADI 5090 que trata da inconstitucionalidade da aplicação da TR para fins de correção monetária dos saldos do FGTS.
Em quanto tempo teremos uma solução?
A decisão, infelizmente, vai demorar. Se a sentença for favorável aos trabalhadores, por lei, a Caixa Econômica Federal tem obrigação de recorrer. Não há como estipular um prazo, mas observe que a ADI foi ajuizada em 2014, já se passaram 7 anos.
*Luciana Gualda, sócia de Montezuma e Conde