‘Rebite’: redes sociais são principal ferramenta para venda ilegal

19 julho 2025 às 08h00

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Responsável por 90% das apreensões de rebite (medicamentos à base de anfetaminas e outros estimulantes do sistema nervoso central), Goiás também virou ponto de escoamento da droga que é de venda proíbida no Brasil. O medicamento é comumente usado para manter pessoas acordadas por mais tempo. Apenas neste ano, 1,3 mil comprimidos foram apreendidos pela Polícia Rodoviária Federal (PRF). No ano passado, o número chegou a mais de 1,5 mil por dia – um por minuto.
Segundo o chefe de comunicação da PRF em Goiás, Victor Rustiguel, a grande concentração de anfetaminas no Estado está atribuída à localização do estado, “por onde transitam inúmeros veículos de carga, que tem como parte dos motoristas potenciais consumidores dessa anfetamina”.
O agente ainda explica que a droga sintética é produzida em várias partes do país, inclusive em solo goiano. Em 2024, uma operação da PRF e Ministério Público de Goiás (MPGO) foram apreendidos em vários pontos do estado cerca de 214 kg de matéria-prima, além de maquinários usados para fabricar milhões de comprimidos.
Conforme Rustiguel, as investigações das forças policiais apontaram que a droga produzida em Goiás era distribuída para diversos estados brasileiros, sobretudo estados do norte e nordeste. O medicamento, conhecido popularmente como rebite, é consumido por motoristas profissionais, como caminhoneiros, objetivando a inibição do sono e prolongar jornadas de trabalho.
“Infelizmente ainda é comum flagrantes de motoristas portando essas anfetaminas ou até sob efeito. Situação que pode ser observada pelas longas jornadas de motoristas durante as viagens (…) Isso viola a legislação e coloca todos em risco”, destacou o policial.
Portanto, segundo Rustiguel, para inibir a circulação da droga no estado, a Polícia Rodoviária Federal e o Ministério Público apostam em ações de fiscalização constante a veículos de carga. Além disso, existe uma colaboração entre a polícia e com inteligência e operações conjuntas, como a que apreendeu centenas de quilos da droga no estado, para coibir a prática desse crime.
Procura
Mesmo com a venda e consumo proibido pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), o rebite é divulgado e comercializado no mercado paralelo on-line. Traficantes anunciam o produto em grupos públicos e privados em redes sociais como Facebook e WhatsApp, com preços que chamam atenção.
O Jornal Opção entrou em contato com um traficante de rebite para entender como funciona o mercado paralelo. Se passando por uma pessoa interessada na mercadoria, a conversa flui rapidamente e logo o criminoso escancara os preços tentadores (tabela abaixo). Ele justifica que o “estimulante corujão [extra forte]” é importado e passa todas as características do produtos, como em uma venda regular.
Tabela de preços:
- Cartela Com 10 Comprimidos …….. R$35 + Frete
- Cartela Com 20 Comprimidos …….. R$48 + Frete
- Cartela Com 30 Comprimidos …….. R$60 + Frete
- Cartela Com 40 Comprimidos …….. R$75 + Frete
- Cartela Com 50 Comprimidos …….. R$86 + Frete
- Cartela Com 60 Comprimidos …….. R$98 + Frete
- Cartela Com 70 Comprimidos …….. R$120 + Frete
- Cartela Com 80 Comprimidos …….. R$136 + Frete
- Cartela Com 90 Comprimidos …….. R$150 + Frete
- Cartela Com 100 Comprimidos …….. R$175 + Frete
A droga, inclusive, tem grande procura. Durante a apuração, a reportagem se deparou com enxurradas de posts de pessoas que se dizem caminhoneiros e que procuram por rebite. Em um dos comentários do grupo “G,D.R galeda do rebite”, um suposto motorista pergunta se está tendo a anfetamina e o especula o preço.
“Alguém vendendo? Estou precisando. Trabalho de madrugada e é bugado. O meu acabou”, diz um participante anônimo. A mensagem foi divulgada no dia 26 de maio deste ano.
Como a droga age no organismo:
Em entrevista ao Jornal Opção, o neurologista do Einstein Goiânia, Marco Túlio Pedatella, explicou que o uso de medicamentos a base de anfetaminas é recomendado apenas em tratamento médico, de casos específicos, como: transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH); narcolepsia (uma condição que causa sonolência excessiva); obesidade; transtorno de compulsão alimentar, e alguns casos na psiquiatria, diferente do que é flagrado nas rodovias de Goiás.
Pedatella ainda explicou que muitos motoristas, especialmente de caminhões que percorrem longas distâncias, recorrem ao “rebite” para dirigir por muitas horas seguidas sem parar, seja para cumprir prazos apertados de entrega ou evitar paradas para descanso e com isso aumentar a produtividade nas viagens. Contudo, essa prática é ilegal e extremamente perigosa, tanto para o motorista quanto para outras pessoas nas estradas.
“A falsa sensação de energia pode mascarar o cansaço real, prejudicando os reflexos e aumentando o risco de acidentes graves. Eles não são medicamentos feitos para combater o sono comum ou fadiga em situações rotineiras”, destacou o neurologista, que ainda enfatizou que o consumo desses medicamentos estimulam o sistema nervoso central, podendo provocar efeitos colaterais como: aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, redação da sensação de sono e cansaço.
“Podem também provocar euforia, agitação e aumento da disposição. Seu uso indevido pode provocar efeitos colaterais perigosos, como: Insônia crônica, ansiedade, irritabilidade e paranoia. Além de taquicardias (aumento dos batimentos cardíacos), arritmias cardíacas. Seu uso pode indiscriminado pode causar dependência química e psicológica, bem
como gerar alucinações e alterações de humor. O uso contínuo, pode levar o corpo a desenvolver tolerância, exigindo doses cada vez maiores, consequentemente aumentando significativamente o risco de overdose ou morte súbita”, destacou o especialista.
Além disso, conforme o neurologista, o uso indevido desses medicamentos pode acarretar em dependência química; alterações cerebrais e cardiovasculares, além de problemas psiquiátricos, como surtos psicóticos. Isso sem contar nos riscos de acidentes de trânsito por alteração nos reflexos e julgamento. Uso de doses maiores pode causar overdose, que pode levar à morte.