Prefeita em Goiás pode ter candidatura impugnada por suposto 3º mandato; entenda

05 julho 2024 às 16h40

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A prefeita de Mimoso de Goiás, cidade do entorno do Distrito Federal (DF), pode ter sua possível candidatura à reeleição impugnada por ter um suposto terceiro mandato exercido pelo mesmo grupo familiar a que ela pertence.
O Jornal Opção tentou contato com a prefeita, mas Rosângela Alves dos Reis (UB) não respondeu as mensagens, e nem atendeu as ligações. A reportagem conseguiu conversar com o assessor jurídico dela, Carlos Ladislau, que apenas informou que não vão se posicionar.
Rosângela, atual prefeita da cidade, é esposa de Genivaldo Gonçalves dos Reis, que venceu as eleições para chefe do Executivo do município em 2016. Ele esteve no cargo até 2019, quando teve o mandato cassado.
Segundo decisão unânime do Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO), Genivaldo e o vice-prefeito, Manoel Ubaldino de Freitas, já falecido, foram culpados pelos crimes de abuso de poder econômico, captação e utilização de recursos ilícitos, mais conhecido como Caixa 2, durante a campanha.
Após a cassação, Mimoso de Goiás teve eleições suplementares em setembro de 2019, em que o vencedor foi Rafael Bruno Moreira de Ataídes, que seria sobrinho de Rosângela.
Além disso, a própria atual prefeita tentou disputar o pleito, mas renunciou, juntamente com seu vice, Aniel Pereira de Souza, após impugnação requerida pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).
O órgão havia acusado a inelegibilidade dos candidatos devido ao parentesco de Rosângela com o então prefeito afastado Genivaldo, já que são cônjuges. Além disso, o vice Aniel ainda é parente do prefeito em exercício à época, Moisés Pereira de Souza, que também era o presidente da Câmara Municipal.
As renúncias foram homologadas no Juízo da 131ª Zona Eleitoral. Os candidatos reconheceram risco da disputa de uma eleição sob julgamento e, ainda, futuras instabilidades políticas devido à eventual perda de mandato. A impugnação se baseia justamente no período entre a cassação até a eleição, que é de menos de seis meses.
Passado o mandato tampão de Rafael Bruno Moreira de Ataídes, nas eleições municipais de 2020 a atual prefeita Rosângela foi a vencedora. Agora, ele é pré-candidata à reeleição na cidade, o que tem gerado acusações do suposto terceiro mandato seguido do mesmo grupo familiar.
O que dizem especialistas?
Mesmo que se comprove tal vínculo de parentesco entre Rosângela e Rafael, o advogado eleitoral, Aurelino Ivo Dias, explicou ao Jornal Opção que a relação entre tio/tia e sobrinho/sobrinha não é impedimento para a candidatura. “Sobrinho não é impedimento. O que não pode é cônjuge, pai, mãe, ou irmão. Sobrinho é terceiro grau”, explicou.
No capítulo IV da Constituição Federal, que diz respeito aos direitos políticos, o sétimo parágrafo do mesmo artigo diz que “são inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.”
A redação foi adicionada pela Emenda Constitucional nº 16 de 1997, surgindo o direito à reeleição. Por sua vez, o § 5º do artigo 14 diz que “o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente”.
A reportagem também ouviu a advogada especialista em direito público e eleitoral, Maíce Andrade, que fez a mesma ressalva com relação ao parentesco de sobrinho. “Não configuraria nenhuma ineligibilidade, porque o sobrinho não enquadra naquelas vedações dos parentes de primeiro e segundo grau”, disse.
No entanto, a profissional alerta para a possibilidade de um terceiro mandato seguido, já que o marido e Rosângela vêm das duas gestões anteriores.
“De acordo como está na Constituição Federal, o mandato é o período de quatro anos entre uma e outra eleição regular. A eleição suplementar é uma mera complementação desse período total. Então, a renovação do pleito pela incidência da eleição suplementar não origina um novo mandato. Então, configuraria um terceiro mandato consecutivo no mesmo núcleo familiar”, argumenta.
Jurisdição
O caso é semelhante a um outro ocorrido em 2016, quando o Progressistas (PP) nacional fez uma consulta ao Tribunal Superior Eleitoral. Na oportunidade, o “Prefeito A” foi eleito nas eleições municipais de 2008, mas exerceu seu mandato até o final do ano de 2009, quando foi cassado pela Justiça Eleitoral.
Em 2009 foi eleito o “Prefeito B”, mediante eleições suplementares, que terminou regularmente o mandato. Em 2012 foi eleito o “Prefeito C”, que é parente consanguíneo em 2º grau do “Prefeito A”, exercendo ininterruptamente o seu mandato.
O questionamento do PP era se o “Prefeito C” preencheria as condições de elegibilidade para candidatar-se à reeleição nas eleições municipais de 2016. À época, o então relator, ministro Luiz Fux, determinou que o “Prefeito C” era “inelegível para o desempenho do cargo de Chefe do Executivo municipal nas eleições de 2016”.
Em seu voto, o ministro argumentou que os parágrafos quinto e sétimo do artigo 14 da constituição “destina-se a evitar que haja a perpetuação indeterminada de uma mesma pessoa ou de um grupo familiar na chefia do Poder Executivo”.
Ainda conforme Luiz Fux, a cassação do titular, independentemente do momento em que venha a ocorrer, não tem a condição de descaracterizar “o efetivo desempenho de mandato”.
“A eleição suplementar [rectius: renovação da eleição] tem mera aptidão de eleger candidato para ocupar o período remanescente do mandato em curso, até a totalização do quadriênio, não configurando, portanto, novo mandato, mas fração de um mesmo mandato”, justificou.
Para o relator, portanto, nesse caso o “Prefeito “A” desempenhou o mandato referente ao quadriênio 2009-2012, e o seu parente em segundo grau, Prefeito “C”, assumiu a chefia do Poder Executivo no período de 2013-2016, de modo que, no segundo mandato, ficou caracterizada a reeleição.
“Em razão disso, atraiu-se a vedação de exercício de terceiro mandato consecutivo por esse núcleo familiar no mesmo cargo ou no cargo de vice-prefeito”, alegou.
O Tribunal, por unanimidade, seguiu o voto do relator e considerou o “Prefeito C” inelegível para as eleições de 2016. Votaram o então presidente, ministro Gilmar Mendes, as ministras Rosa Weber, Maria Thereza de Assis Moura e Luciana Lóssio; os ministros Luiz Fux, Napoleão Nunes Maia Filho e Henrique Neves da Silva, além do vice-Procurador-Geral Eleitoral, Nicolao Dino.
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