Polícia Civil identifica 54 vítimas de organização criminosa formada por militares, em Anápolis
30 outubro 2014 às 18h47

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Dentre elas, pelo menos 30 foram assassinadas. Segundo delegado, no final de 2013 o grupo percebeu que estava sendo investigado e diminuiu as ações
A Polícia Civil identificou até o momento 54 vítimas da organização criminosa de Anápolis desmantelada pela Polícia Civil por meio da Operação Malavita. O grupo, que usava como pano de fundo de suas ações o tráfico de entorpecente, foi desmantelado na última quarta-feira (29/10) pela PC, e nesta quinta-feira (30) o titular da Delegacia Estadual de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), o delegado Alexandre Lourenço, concedeu entrevista explicando como a associação criminosa funcionava.
Das 54 pessoas, o delegado aponta que pelo menos 30 foram vítimas de homicídio. De acordo com ele, depois da distribuição da representação da medida cautelar, há o indicativo de seis outras vítimas do grupo. A polícia ainda não sabe dizer exatamente quantas foram mortas, já que algumas estão teoricamente desaparecidas, outras foram – em tese – sequestradas. “Sabemos de dois desaparecimentos”, confirma Alexandre. No ano passado, Anápolis teve registradas 189 mortes. Questionado se o número poderia subir agora, o delegado disse não poder confirmar nada no momento.
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A operação visava cumprir 39 mandados de busca e apreensão e 23 de prisão temporária, a maioria deles em Anápolis. Dos 23 mandados, 14 são para policiais militares e cinco para agentes da Polícia Civil. Dois deles permanecem foragidos. Esta operação, segundo Alexandre, é apenas a primeira fase da investigação. “A investigação caminha. Nós agora entramos em outra fase, muito mais aprofundada e talvez muito mais complexa do que se desenrolou até o momento”, garante.
Dentro das investigações, são 36 inquéritos que abarcam uma imensidão de crimes, dentre extorsão, sequestro, homicídio, tortura, abuso de autoridade, dentre outros. Normalmente, segundo o delegado, o que incentivava a ação do grupo era a cobrança de vantagem ou a administração do tráfico de entorpecentes em algumas regiões de Anápolis. “Eles, na verdade, estavam se apropriando de uma região de Anápolis para a administração do tráfico, e nesse contexto decorreram os crimes”, explicou o delegado Alexandre.
Mesmo com o foco no tráfico, a organização criminosa realizava também extorsões e sequestros com objetivo de lucro. Segundo o delegado, na maioria dos casos das pessoas raptadas, depois que o valor do resgate era pago, apenas os corpos eram devolvidos.
Alexandre explica que as vítimas não têm um perfil específico, sendo que geralmente eram pessoas envolvidas com tráfico de drogas. “Esse é o pano de fundo da organização. Havia um controle da área e da atividade criminosa”, explica. Alexandre afirma, entretanto, que foram identificadas vítimas envolvidas com roubo de carga e pequenos furtos.
No final do ano passado a organização percebeu que estava sendo investigada e começou a refluir nas atividades. “Houve um recuo que permaneceu até aproximadamente o mês de abril deste ano”, afirmou. Depois disso, o grupo voltou às atividades, mas com menos violência. “No ultimo mês, especialmente, elas [as atividades] foram muito mais constantes. Foi então que surgiu necessidade de uma medida de contenção tão gravosa como a que foi praticada ontem [29/10].”
Alguns mandados de busca e apreensão foram realizados nos dois comandos da Polícia Militar de Anápolis, onde foram encontrados pertences pessoais dos agentes alcançados nos alojamentos, armários particulares, mesas e em alguns veículos que utilizavam. “A ação foi realizada lá apenas para isso. Nós não encontramos qualquer relação do comando ou de quem quer que seja desses batalhões em relação com as atividades”, garantiu Alexandre.
Assassinato de testemunhas e ‘modus operandi’
O grupo, como explica o delegado, tinha o hábito de eliminar testemunhas para a manutenção da atividade. “Temos algumas investigações que apontam para isso”, disse ele. O delegado afirma que alguns pontos de confluência puderam ser identificados. “O modus operandi que eles têm é muito semelhante aos das forças policiais. Eles se aproximam gritando palavras de ordem, geralmente utilizadas pela polícia, e o armamento é similar ao dos agentes”, afirmou, explicando que essa foi uma das características que chamaram atenção da polícia, relacionando em seguida a participação de policiais.
Quanto à possibilidade de poder caracterizar a organização como “grupo de extermínio”, Alexandre garante que a polícia não pode falar desta forma. “O contexto do grupo de extermínio exige um elemento probatório ainda mais pujante”, sustenta, dizendo novamente que a investigação se estende para além da operação.
Como começou
As investigações tiveram apoio do Ministério Público de Goiás (MPGO), da Força Nacional de Segurança (FNS) e da Polícia Militar, e se iniciaram em Anápolis, a partir de inquéritos da operação conduzida pela Draco. Foi após o desparecimento de Iamon Pinheiro de Lima que a polícia conseguiu conectar alguns fatos da investigação. O caso ocorreu no dia 17 de junho do ano passado, quando Iamon desapareceu e as testemunhas ligadas ao fato foram eliminadas.
Como informou Alexandre, o caso foi em um posto de gasolina de Anápolis, quando a vítima passou em uma bicicleta por uma viatura. Mais à frente, policiais desceram do veículo e o capturaram. Outros ciclistas que estavam junto com Iamon foram eliminados pelo grupo.