Pesquisa sobre poluição das águas no Cerrado desenvolvida na UEG é eleita a melhor do Brasil em Ciências Ambientais

01 setembro 2025 às 14h52

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A tese de doutorado de Igor Romeiro dos Santos, defendida no Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais do Cerrado (Renac) da Universidade Estadual de Goiás (UEG), foi eleito a melhor tese do Brasil na área de Ciências Ambientais pelo Prêmio Capes de Tese 2025, principal reconhecimento acadêmico da pós-graduação no país.
O estudo analisou a presença de poluentes emergentes e microrganismos resistentes em dois importantes rios goianos, o Rio Extrema e o Rio Meia Ponte. O trabalho foi orientado pela professora Elisa Flávia Luiz Cardoso Baião e coorientado pela professora Cátia Lira do Amaral.
Em entrevista ao Jornal Opção, Igor explicou a relevância do trabalho, que teve duração de três anos e resultou em cinco artigos científicos. “Eu fiz um doutorado em Recursos Naturais Cerrado pela UEG e defendi em 2024. Nós fizemos análise no Rio Extrema, com foco na nascente, e fizemos análise no Rio Meia Ponte”, detalhou.
A professora Elisa Baião explicou que foram realizadas oito coletas ao longo do Meia Ponte, passando pela Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) Goiânia. As amostras foram analisadas desde a nascente até a foz do rio, em Cachoeira Dourada. “A gente conseguiu observar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina e também de Klebsiella pneumoniae (KPC), uma superbactéria resistente a diversos antibióticos, da nascente até a foz do Rio Meia Ponte, o que nos gerou grande preocupação”, relatou a orientadora ao Jornal Opção.
Até pouco tempo atrás, bactérias como a KPC eram consideradas restritas a ambientes hospitalares. No entanto, como destacou a professora, “ela tem se tornado cada vez mais uma bactéria de preocupação comunitária. Então, todos nós da comunidade podemos ter acesso a essa bactéria resistente a diferentes antibióticos, o que dificulta o tratamento das infecções bacterianas”.
Segundo Igor, a equipe conduziu análises físico-químicas da água, verificou a presença de bactérias heterotróficas e avaliou parâmetros toxicológicos. “Nós conseguimos isolar essa bactéria desde a nascente até a foz do Rio Meia Ponte. E mesmo dentro da estação de tratamento, essa bactéria foi isolada. E após o tratamento primário também”, ressaltou.
Para o pesquisador, a presença dessas bactérias está diretamente relacionada a duas fontes principais: a agropecuária e o esgoto doméstico. “Provavelmente, essas bactérias vêm da agropecuária, tem muitas fazendas ao redor da nascente. Então, nós conseguimos nos isolar lá. […] Quando chegou no efluente isso aí se amplificou, nós conseguimos isolar mais cepas”, explicou.
A hipótese é que o uso indiscriminado de antibióticos na criação animal, somado ao descarte inadequado de resíduos urbanos, contribua para a disseminação de genes de resistência bacteriana. Esse fenômeno representa uma ameaça não apenas ao equilíbrio ambiental, mas também à saúde pública, uma vez que a resistência antimicrobiana é considerada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) um dos maiores desafios globais da atualidade.
O projeto contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e do Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS), o que possibilitou a aquisição de equipamentos e o desenvolvimento de técnicas avançadas de microbiologia e toxicologia. “Nós não conseguiríamos realizar pesquisas de alto impacto sem financiamento. […] Eu acredito que como é um assunto que está em alta, principalmente em artigos publicados na literatura global, a nossa pesquisa ganha relevância porque mostra a presença desse microrganismo no meio ambiente, algo pouco relatado”, afirmou Igor.
A pesquisa contou ainda com o apoio da Saneago, que forneceu dados e acesso às estações de tratamento. Elisa Baião destaca que “a Saneago é nossa parceira, e ela sempre se mostrou muito disposta a fornecer os materiais das estações de tratamento, e a gente trabalha em parceria com ela”.
O trabalho enfrentou também dificuldades práticas. Igor destacou que a coleta precisava ser processada rapidamente para evitar a degradação das amostras e a perda de microrganismos. “Eu acredito que o maior desafio estava no processamento das amostras para a gente conseguir isolar as superbactérias e não degradar os antimicrobianos para a gente conseguir detectá-las”, explicou.
Continuidade no pós-doutorado e aplicações práticas
Atualmente, Igor Romeiro segue aprofundando as descobertas em seu pós-doutorado na Universidade Federal de Goiás (UFG), em parceria com a UEG. O foco agora é desenvolver métodos de inativação das cepas isoladas, utilizando estratégias como terapia fotodinâmica e terapia fototérmica. A ideia é aplicar esses recursos futuramente em estações de tratamento de esgoto, ampliando a capacidade de eliminar microrganismos resistentes.
“Nós estocamos as bactérias em ultra-freezer a menos 80 graus. E aí toda vez que eu preciso fazer análise, eu reativo essas bactérias em uma estufa microbiológica. […] Os próximos passos da minha pesquisa são a inativação dessas cepas utilizando estratégias inovadoras”, explicou.
Reconhecimento para a ciência em Goiás
Além de sua contribuição científica, a conquista de Igor tem um significado simbólico para a UEG e para o estado. A tese foi o único trabalho de uma instituição goiana a vencer o Prêmio Capes de Tese 2025. Para o pesquisador, o reconhecimento reforça a relevância da universidade e abre espaço para novos investimentos. “A premiação mostra que nós estamos crescendo enquanto pesquisadores e que isso dá abertura para mais órgãos de fomento”, destacou.
Igor acredita que os resultados podem subsidiar políticas públicas de monitoramento da qualidade da água e da eficiência dos sistemas de tratamento em Goiás. “Junto ao Renac e ao Laboratório de Biotecnologia (LaBiotec), o prêmio mostra que estamos avançando, o que abre portas para investimentos em pesquisas para promover o uso sustentável da água, preservar a biodiversidade e garantir a qualidade de vida para as futuras gerações”, afirmou.
Criado em 2005, o Prêmio Capes de Tese reconhece os melhores trabalhos de conclusão de doutorado defendidos no Brasil, avaliando critérios como originalidade, relevância para o desenvolvimento científico, tecnológico, cultural, social e de inovação e o valor agregado pelo sistema educacional ao candidato.
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