Municípios poderão ter até 60% a mais em repasses ecológicos com a nova reformulação tributária

29 janeiro 2025 às 14h49

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A reforma tributária sancionada recentemente promete transformar o cenário fiscal brasileiro e impulsionar políticas ambientais nos municípios. Com a extinção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e do ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza), esses tributos serão substituídos pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que terá uma parcela obrigatoriamente destinada à preservação ambiental. Inspirado no ICMS Ecológico, o novo IBS Ecológico assegura que 5% da arrecadação total dos estados será repassada às cidades, levando em consideração critérios como a presença de unidades de conservação e outras ações sustentáveis.
Em entrevista ao Jornal Opção, o advogado especialista em direito tributário no agronegócio, Luciano Faria, destacou a importância dessa mudança para a manutenção de investimentos ambientais. “A criação do IBS Ecológico representa a continuidade do ICMS Ecológico dentro do novo sistema tributário brasileiro, garantindo que os municípios continuem recebendo incentivos financeiros para a preservação ambiental. O ICMS Ecológico tem sido uma fonte de recursos essencial para diversos municípios, podendo representar de 1% a 13% de sua arrecadação. A transição para o IBS Ecológico mantém esse estímulo e assegura que a preservação ambiental – uma obrigação constitucional – continue sendo incentivada por meio de mecanismos tributários eficazes”, disse
Faria explica que a regulamentação da nova política deve levar em conta aspectos regionais para evitar prejuízos aos municípios que já dependem do ICMS Ecológico. “Os estados podem desempenhar um papel importante ao contribuir com estudos técnicos e sugestões para que os critérios de distribuição dos recursos sejam justos e eficazes. É fundamental que esses critérios sejam baseados em indicadores ambientais claros, considerando biomas, impactos ambientais locais e a capacidade das cidades de implementar políticas sustentáveis”, afirmou o advogado.
Principais desafios dos municípios
Embora a proposta de incentivo ambiental seja bem recebida, sua implementação traz desafios, especialmente para municípios com menos recursos e estrutura administrativa. O especialista pontua que um dos maiores entraves será o envolvimento da população em práticas ambientais para garantir o recebimento dos repasses. “A conscientização e a colaboração dos cidadãos são fatores fundamentais, o que exige investimentos contínuos em educação ambiental, fiscalização eficiente e regulamentação clara”, disse Luciano. O advogado explica que além da necessidade de apoio comunitário, muitas prefeituras terão que modernizar sua estrutura administrativa e técnica para monitorar e comprovar suas ações ambientais, exigindo mão de obra qualificada e regulamentação específica.
O risco de desvio de finalidade também é um ponto de atenção. A regulamentação do IBS Ecológico deve estabelecer diretrizes para assegurar que os recursos sejam aplicados exclusivamente em ações ambientais. Para evitar fraudes e má gestão, Luciano Faria sugere auditorias regulares e maior transparência na prestação de contas públicas. “A eficácia do novo modelo dependerá de uma governança eficiente”, destaca o advogado.
Mudanças estruturais na distribuição de repasses
As diferenças entre o ICMS Ecológico e o IBS Ecológico geram debates sobre possíveis impactos nos municípios que já recebem incentivos ambientais. Segundo Luciano Faria, a maior mudança é que, enquanto o ICMS Ecológico era regulamentado pelos estados e poderia variar entre 1% e 13% dos repasses, o IBS terá um repasse fixo de 5% e será definido em nível federal. Para algumas cidades, essa mudança pode garantir maior previsibilidade e estabilidade nos repasses, mas também pode demandar ajustes em seus planos de gestão ambiental.
Segundo estimativas do Banco Mundial e do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), a reformulação no sistema tributário pode resultar em um aumento de 60% nos repasses ecológicos para os municípios, totalizando R$ 8,7 bilhões anuais. Esse montante é mais que o dobro do orçamento destinado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) em 2024, que foi de R$ 3,6 bilhões.
Outro ponto que merece atenção é o impacto da transição para o IBS Ecológico, que está prevista para ocorrer entre 2029 e 2033. Durante esse período, o novo sistema será gradualmente implementado e o ICMS e ISS serão extintos. Esse processo pode levar a oscilações na arrecadação dos governos estaduais e influenciar os valores das transferências ecológicas aos municípios. No entanto, dispositivos como o Fundo de Desenvolvimento da Infraestrutura Regional Sustentável (FDIRS) estão sendo planejados para mitigar possíveis perdas financeiras.
Histórico do ICMS Ecológico e sua importância para os municípios
O ICMS Ecológico foi introduzido no Paraná, em 1991, e se expandiu para cerca de 20 estados brasileiros, tornando-se uma ferramenta para incentivar práticas sustentáveis nos municípios sem aumentar a carga tributária sobre os contribuintes. A estratégia encorajou diversas cidades a investirem em turismo ecológico, criação de atrativos naturais e preservação de áreas ambientais.
Dentre os municípios que se destacaram pelo uso eficiente dos recursos do ICMS Ecológico, estão São Jorge do Patrocínio, Guaraqueçaba e Morretes, no Paraná; e Serranópolis, Piraquara e Maringá, que ampliaram a conservação de reservas naturais e impulsionaram a economia sustentável com base no ecoturismo.
Integração com outras políticas ambientais
Uma das estratégias para ampliar o impacto do IBS Ecológico é a sua integração com outras políticas públicas ambientais, como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Luciano Faria aponta que essa sinergia pode trazer benefícios adicionais para conservação de recursos naturais e práticas sustentáveis. “A integração do IBS Ecológico ao Pagamento por Serviços Ambientais pode potencializar os efeitos positivos da tributação ecológica.Ao garantir um fluxo de recursos estável para políticas ambientais, ele pode estimular investimentos em infraestrutura sustentável”, destaca.
No longo prazo, o advogado Luciano Faria explica que o IBS Ecológico tem o potencial de fortalecer a economia verde e impulsionar o desenvolvimento sustentável dos municípios. Regiões que abrigam biomas estratégicos, como a Amazônia, o Pantanal e a Mata Atlântica, poderão se beneficiar diretamente desse novo modelo tributário, garantindo recursos financeiros para ampliar e aprimorar estratégias de conservação ambiental. A mudança pode incentivar investimentos em infraestrutura sustentável, criação de empregos verdes e aumento na valorização das áreas protegidas.
Entretanto, para que essa expectativa se concretize, será fundamental a implementação de uma regulamentação clara e fiscalizações. “No longo prazo, espera-se que o IBS Ecológico contribua para a transição de municípios para modelos econômicos mais sustentáveis, incentivando a preservação dos recursos naturais como parte integrante do desenvolvimento econômico local. No entanto, seu sucesso dependerá da regulamentação eficiente, da fiscalização rigorosa e do compromisso dos gestores públicos na implementação de projetos ambientais de impacto real”, conclui Luciano Faria.