Empresários do setor automobilístico avaliam que, se o governo Lula alterar a política de importação de veículos para favorecer a BYD, pode comprometer o ambiente de negócios no Brasil.

Um executivo de uma das principais montadoras declarou que Lula estaria “seguindo o exemplo de Donald Trump”, ao romper acordos institucionais em nome de interesses pontuais.

Segundo ele, a quebra de previsibilidade lembraria o estilo do ex-presidente americano, frequentemente acusado de desrespeitar normas internacionais e comprometer a confiança do mercado.

O centro da polêmica é o programa Mover, política industrial negociada entre o Planalto e as montadoras, que prevê incentivos à produção de carros híbridos e elétricos no Brasil. Com base nele, as fabricantes anunciaram investimentos da ordem de R$ 180 bilhões para modernização de fábricas e desenvolvimento de novos veículos.

No entanto, o governo estuda uma alteração na política de importação de veículos eletrificados, analisando na Câmara de Comércio Exterior (Camex) a possibilidade de reduzir a alíquota para veículos montados nos modelos CKD e SKD — com menor uso de mão de obra e produção local.

A proposta favoreceria diretamente a BYD, que iniciou operações na fábrica de Camaçari (BA) em junho e solicitou redução do imposto de 35% para 10%. Segundo executivos do setor, a mudança seria um “golpe” no planejamento feito com base no Mover e poderia resultar em suspensão ou cancelamento de fases de investimento já aprovadas pelas matrizes no exterior.

Um dos entrevistados afirma que esse tipo de instabilidade “desencoraja a instalação de centros de pesquisa e inovação no Brasil”. O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, tentou apaziguar os ânimos com uma proposta de criar cotas de importação com redução temporária do imposto, escalonadas da seguinte forma:

  • 50 mil carros no 1º ano
  • 40 mil no 2º
  • 30 mil no 3º
  • 20 mil no 4º

As montadoras consideram o volume exagerado. Segundo uma fonte do setor, poucas fábricas brasileiras têm capacidade de produzir 50 mil veículos por ano, o que tornaria a medida desproporcional e injusta com as fabricantes que investem na industrialização local.

Embate entre BYD e montadoras tradicionais

A disputa escancarou o lobby entre a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) e a montadora chinesa. A Anfavea mobilizou federações industriais de nove estados, centrais sindicais como a CUT e a Força Sindical, além do sindicato dos metalúrgicos, contra a possível medida.

Os principais argumentos do grupo são produzir veículos no Brasil gera mais empregos (10 por carro contra 3 no sistema CKD/SKD); a fabricação local fortalece a cadeia de autopeças; a produção de híbridos impulsiona pesquisa e inovação nacional; e reduzir a alíquota de importação desestimula novos investimentos e pode gerar desemprego no longo prazo.

Executivos do setor também apontam que o Brasil tem vantagens competitivas na transição para a mobilidade limpa, como a produção de etanol e a presença de terras raras, usadas na fabricação de baterias.

Para eles, facilitar a importação de veículos chineses em vez de fortalecer a indústria local seria uma contradição frente ao discurso do governo sobre reindustrialização e liderança na economia verde.

Tensão política e interesses cruzados

A possível mudança na política automotiva causa tensão dentro do próprio governo. Três ministérios já se manifestaram contrários à redução de impostos. O Ministério do Trabalho teme demissões; o Ministério do Desenvolvimento alerta para impacto negativo na reindustrialização; e o Ministério da Fazenda: preocupa-se com a perda de arrecadação.

A Anfavea também denuncia práticas desleais: segundo a associação, o governo chinês injetou cerca de R$ 1,5 trilhão em subsídios na indústria automotiva ao longo de 14 anos, o que daria uma vantagem artificial à BYD.

Apesar dos rumores de que a decisão a favor da BYD já estaria tomada e que seria anunciada nesta semana pela Camex, Alckmin afirmou que o tema segue em análise e que a decisão será colegiada, com participação de dez ministérios.

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