Mesmo se condenado e depois anistiado, Bolsonaro continuará inelegível, afirma especialista

08 abril 2025 às 17h00

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Júnior Kamenach e Ton Paulo
Agora réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por, segundo a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR), ter não só participado, mas liderado a tentativa de golpe de Estado que culminou nos atentados do 8 de janeiro, Jair Bolsonaro intensificou a pressão para que o Congresso aprove o projeto de lei que concede anistia aos envolvidos na tentativa frustrada de golpe. No entanto, mesmo condenado pelo Supremo, e depois perdoado na lei da anistia (se passar no Congresso), nada mudará quanto ao status eleitoral de inelegibilidade do ex-presidente.
Em tempo, é preciso lembrar: a anistia está prevista no Código Penal brasileiro e trata-se de uma forma de extinção da punibilidade de um crime. Em resumo, é a concessão de um perdão a um delito cometido por um brasileiro ou grupo de brasileiros.
Porém, para que um criminoso seja anistiado, é preciso, primeiro, que ele seja condenado. O que não é o caso de Bolsonaro, que no momento é apenas réu.
Segundo o advogado criminalista Gilles Gomes ao Jornal Opção, ambos os projetos de anistia em análise – um na Câmara dos Deputados e outro no Senado – têm potencial de incluir o ex-mandatário caso ele seja condenado pelos crimes nos quais foi acusado (incluindo golpe de Estado, organização criminosa e deterioração de patrimônio tombado), caso não haja exclusão expressa em seus textos.
Gomes explica que o projeto do ex-deputado federal Vitor Hugo (PL-GO), atualmente vereador por Goiânia, propõe uma anistia abrangente a todos os envolvidos nas manifestações realizadas entre 30 de outubro de 2022 – data do segundo turno das eleições presidenciais – e o início da vigência da lei, independentemente do local onde tenham ocorrido.
“Ele anistia manifestantes, caminhoneiros, empresários e todos que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer outro lugar do território nacional”, detalhou.

Já a proposta do senador Hamilton Mourão (PL) foca exclusivamente nos eventos do dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, e limita a anistia a dois crimes específicos: golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. “Os demais crimes, segundo o projeto do Hamilton Mourão, não são anistiados”, ressaltou Gomes.
Diante disso, o advogado afirma que Bolsonaro pode, sim, ser alcançado por qualquer um dos dois projetos. “O projeto do Major Vitor Hugo anistiaria todos os crimes. Ele é muito mais amplo. Fala que compreende crimes políticos ou com estes conexos, inclusive os eleitorais”, afirmou. “O projeto do Hamilton Mourão é mais estrito. Ele se volta exclusivamente ao crime de abolição violenta de Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.”
“Se você olhar o artigo 29, ele vai fazer uma distinção entre partícipe e autor do crime, e vai falar especificamente que quem, de qualquer modo, concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”, explicou.
Contudo, caso aprovada, a anistia beneficiaria um possível Bolsonaro condenado apenas nos crimes relacionados ao 8 de janeiro. Uma vez que ele está inelegível, assim continuaria.
Inelegibilidade
Gilles Gomes afirmou que a inelegibilidade de Bolsonaro não está relacionada diretamente aos eventos de 8 de janeiro de 2023, mas sim a outra decisão já tomada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo ele, mesmo que o Congresso aprove a anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos, Bolsonaro seguirá impedido de concorrer a cargos públicos.
“Ele permanece inelegível, porque a decisão foi do TSE. O fundamento da inelegibilidade não é a questão propriamente do 8 de janeiro”.
A decisão do TSE mencionada se refere à condenação de Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, em razão de uma reunião com embaixadores em julho de 2022, na qual atacou o sistema eleitoral brasileiro sem apresentar provas.
E a Ficha Limpa?
Um artifício que poderia ser usado por Bolsonaro e seu entorno para levá-lo de volta à elegibilidade (o político insiste que quer ser candidato ao Planalto em 2026) seria a alteração na Lei da Ficha Limpa. Contudo, até essa última porta parece estar se fechando para o ex-presidente.
Isso porque a atual redação do projeto que flexibiliza a Lei acaba com a brecha que possibilitaria a Jair Bolsonaro a reversão de sua inelegibilidade. O ex-chefe do Executivo federal seria beneficiado por um ponto da alteração da Ficha Limpa que reduz o tempo de perda dos direitos políticos.

O texto que saiu da Câmara Federal passou na CCJ. Ele especifica que a perda dos direitos eleitorais ficaria condicionada a casos de “comportamentos graves aptos a implicar cassação de registros, de diplomas ou de mandatos”.
Entretanto, após essa votação, o senador Weverton, que relata a proposta, aceitou uma emenda que altera o texto e extingue o argumento que seria usado por Bolsonaro. A redação sugerida agora mantém a inelegibilidade para casos de comportamento grave, mas retira a parte que condicionava essa punição à cassação de registros, de diplomas ou de mandatos.
Para parlamentares da base governista, tal alteração impede que o ex-presidente use o projeto (caso ele seja aprovado e transformado em lei) como justificativa para tentar recuperar seus direitos políticos.
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