Médicos e cientistas refutam vídeo antivacina

01 janeiro 2022 às 16h31

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Cientista americano Robert Malone está sendo compartilhado em grupos de WhatsApp por supostamente ter acesso a informações privilegiadas quanto ao risco de vacinas de RNA mensageiro
*Com colaboração de Gabriella Oliveira

Um vídeo gravado pelo cientista americano Robert Malone se tornou popular em redes sociais e WhatsApp pelas declarações contra a segurança das vacinas infantis para Covid-19 que funciona com a técnica do RNA mensageiro. O conteúdo foi criticado como infundado e mentiroso por diversos cientistas e associações de saúde, mas grupos antivacina tornaram o vídeo popular. No Brasil, a fala de Robert Malone viralizou após autorização da aplicação da Pfizer na faixa etária entre 5 a 11 anos.
O Jornal Opção ouviu a opinião de médicos e cientistas, que afirmaram que as declarações do cientista americano são falsas e perigosas. No vídeo, Malone diz que as crianças não vacinadas “não representam perigo para os pais ou avós”, o que contradiz os dados epidemiológicos disponíveis até o momento. Também alega que as vacinas causariam “danos reprodutivos” e “danos permanentes”, ignorando resultados dos testes de segurança, medidos em testes clínicos com milhares de voluntários que não apresentaram dano permanente algum.
Marcelo Daher, médico infectologista, respondeu às afirmações de Robert Malone com ceticismo. “No mundo todo, mais de seis milhões de crianças já foram vacinadas com o imunizante da Pfizer e existem zero óbitos relacionados à vacina” afirmou o especialista em infecções contagiosas. “Já a Covid-19 mata e deixa sequelas. O Brasil é um dos países com maior número de mortes entre crianças”. Os números oficiais são 2.625 mortes entre crianças e adolescentes no país; o que significa quatro mortes por dia desde o começo da pandemia.

Sobre a tecnologia dos imunizantes de RNA mensageiro, Marcelo Daher explica que a tecnologia produz vacinas mais seguras do que as concorrentes. “Não há incorporação do material genético no núcleo, o RNA fica apenas no citoplasma da célula. As pessoas têm medo de alterações no genoma, mas o próprio vírus Sars-CoV-2 também tem RNA mensageiro que circula no citoplasma de nossas células; então não há razões para temer mais a vacina do que o vírus”.
Marcelo Daher lembra também que uma das razões pelo qual o vídeo de Robert Malone tem sido levado à sério é o fato de que o cientista americano trabalhou no desenvolvimento de tecnologias relacionadas ao RNA mensageiro. Entretanto, ao contrário do que tem sido entendido, Robert Malone não foi desenvolvedor da tecnologia utilizada para produzir as vacinas contra a Covid-19.
Como apontam diversos sites de checagem e veículos de mídia dos Estados Unidos, Robert Malone não é o “inventor das vacinas mRNA”. É fato, como aponta o site Health Feedback, que o médico colaborou para o desenvolvimento da tecnologia. Em 1989, Robert Malone escreveu um artigo em apontou ser possível transferir mRNA envolvido em um lipossomo (gordura) para células. Porém, essa transferência sempre gerou uma reação inflamatória.
Zacharias Calil, médico e cirurgião pediátrico, também atacou as alegações feitas por Robert Malone; “É claro que qualquer imunizante injetado no organismo pode provocar efeitos indesejáveis, mas a quantidade e severidade das reações observadas pelas agências sanitárias dos EUA, Canadá, Austrália, União Europeia – são 31 países que já aplicaram a vacina da Pfizer em crianças – a quantidade e severidade das reações não é preocupante”.

Outras alegações do cientista americano são de que as vacinas causam infertilidade e danos cardíacos, mas os estudos citados no vídeo foram feitos em camundongos, e não em seres humanos. Os efeitos colaterais cardíacos somam menos de 0,01% dos indivíduos observados e raramente resultam em complicações graves, enquanto a taxa de letalidade da Covid-19 é de 2,9%.
“Temos muitos estudos mais recentes que provam a segurança dos imunizantes”, diz Zacharias Calil. “Eu acompanhei o trabalho da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e afirmo que o padrão de segurança é o esperado para a aplicação na população. Não há efeitos adversos entre as crianças que sejam muito diferentes dos observados nos adultos”.
Zacharias Calil lembra que o número de infecções em crianças é subestimado, pois, os jovens têm mais contaminações assintomáticas e consequentemente não são diagnosticados com a doença. “Mas os jovens transmitem as doenças e a vacinação vai diminuir muito a transmissão comunitária ao redor dessas pessoas”, conclui Zacharias Calil.