Com a chegada do Dia das Crianças, celebrado no próximo sábado, 12 de outubro, a reflexão sobre a importância da proteção à infância torna-se ainda mais relevante. Dados da segunda edição do relatório Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil, lançado em agosto deste ano pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), revelam que mais de 15 mil crianças e adolescentes, com idades entre 0 e 19 anos, foram mortos de forma violenta no Brasil nos últimos três anos. E no mesmo período, 165 mil meninos e meninas foram vítimas de violência sexual.

O levantamento aponta que os números de estupro contra crianças e adolescentes têm crescido constantemente nos últimos anos. Foram registrados 46.863 casos de violência sexual em 2021, número que aumentou para 63.430 em 2023 – o equivalente a uma criança ou adolescente vítima de estupro a cada 8 minutos no último ano.

Além disso, as violências sexuais e letais têm atingido cada vez mais as crianças mais novas. As mortes violentas aumentaram 15,2% no caso de crianças de até nove anos de idade e a violência sexual cresceu, em particular, entre meninas e meninos nesta faixa etária. Entre 2022 e 2023, houve um acréscimo de 23,5% nos registros de estupro contra criança de até quatro anos, e de 17,3% entre aquelas com cinco a nove anos.

No contexto goiano, foram registradas 7.868 estupros de crianças e adolescentes de 0 a 19 anos entre 2021 e 2023. No mesmo período, foram registradas 270 mortes violentas de jovens na mesma faixa etária no Estado. Porém, importante destacar que Goiás não informou a idade simples da vítima para os casos de mortes decorrentes de intervenção policial em relação aos 3 anos.

Dificuldades para a Justiça

De acordo com o advogado criminalista Gabriel Fonseca, além dos crimes de natureza sexual, como estupro e pornografia infanto-juvenil, as crianças no Brasil também são frequentemente vítimas de sequestro, maus-tratos e abandono. “Esses crimes, muitas vezes são cometidos em ambientes ocultos e de pouca circulação, o que traz desafios à Justiça, principalmente na produção de provas”, comenta Gabriel.

De acordo com o advogado, a legislação brasileira trata com extrema seriedade os crimes contra crianças. Um exemplo é o crime de estupro de vulnerável, que abrange qualquer ato lascivo contra menores de 14 anos, independentemente da anuência da vítima. “Mesmo que a criança não ofereça resistência, a lei não considera qualquer tipo de consentimento válido. Para crimes como este, a pena varia de 8 a 15 anos de reclusão”, explica.

Além disso, o Brasil dispõe de uma legislação rigorosa para enfrentar outros crimes contra a infância, como a produção e disseminação de pornografia infanto-juvenil e o abandono de menores. No entanto, segundo o advogado, a aplicação da lei enfrenta sérios obstáculos: “A principal dificuldade para a Justiça é a produção probatória. As crianças, muitas vezes, têm dificuldades em entender ou expressar o que aconteceu com elas, e os crimes geralmente ocorrem em locais sem testemunhas.”

O papel da sociedade

Gabriel também destaca a importância da atuação conjunta da família, da sociedade e das instituições na prevenção desses crimes. “As escolas, as famílias e toda a comunidade têm papel fundamental para proteger nossas crianças. Ensinar os jovens a evitar situações perigosas, como conversar com estranhos ou ficar sozinhos em locais desconhecidos, pode ajudar a evitar muitos crimes”, afirma.

A comunicação aberta entre pais e filhos é uma das principais ferramentas de prevenção. Segundo o advogado, qualquer sinal de abuso ou suspeita deve ser imediatamente comunicado às autoridades competentes. “Não podemos ignorar sinais. Toda suspeita deve ser levada à polícia ou ao Ministério Público para apuração. Condutas criminosas precisam ser investigadas rapidamente para evitar que novas crianças se tornem vítimas”, alerta.

A luta da Justiça

Nos crimes contra crianças, a obtenção de provas é um grande desafio. Gabriel explica que, para a punição dos responsáveis, é necessário que as investigações contem com diversos tipos de evidências, que podem incluir exames periciais e depoimentos especiais. “O depoimento especial permite que a criança relate os eventos em um ambiente seguro e adequado, sem a pressão dos tribunais convencionais. Além disso, laudos psicológicos também são cruciais, pois ajudam a identificar mudanças comportamentais que podem estar associadas ao abuso.”

Esses mecanismos de proteção e investigação, quando corretamente aplicados, são essenciais para garantir a justiça às vítimas e evitar que os agressores sigam impunes.

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