Jovem com síndrome e tumor raros só percebeu mudança na cor da pele anos depois do diagnóstico
03 novembro 2024 às 12h35
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A cearense Sabrina Gomes, de 24 anos, enfrenta uma batalha contra uma condição médica rara e debilitante. Diagnosticada com Síndrome de Cushing e com um timoma, um tumor de 17 centímetros no tórax, Sabrina vive com sintomas que vão de dificuldades respiratórias e insuficiência renal até alterações na cor de sua pele. A situação da jovem tornou-se ainda mais delicada em razão das complicações hormonais causadas pelo tumor, que também impede a realização de uma cirurgia de remoção.
O timoma de Sabrina, um tumor que se desenvolve no timo – glândula localizada na região do mediastino – tem um comportamento invasivo. Ele comprime órgãos vitais, como o esôfago, a veia cava e o coração, dificultando sua respiração e causando desconforto constante. Além disso, esse tumor é responsável pela produção descontrolada do hormônio ACTH, que desencadeou o desenvolvimento da Síndrome de Cushing em Sabrina, levando a um aumento significativo dos níveis de cortisol, o hormônio do estresse.
O primeiro diagnóstico de Sabrina veio em 2015, aos 15 anos e começou a perceber sinais como inchaço, manchas escuras na pele e ansiedade. Após diversas consultas, exames e duas cirurgias para retirada de nódulos ainda na adolescência, os médicos confirmaram a presença do timoma e da Síndrome de Cushing. Ambos os problemas impõem sérios riscos à sua saúde, afetando desde a função renal até o sistema metabólico.
Cinco anos depois do diagnóstico inicial, em 2020, Sabrina começou a notar um escurecimento leve em sua pele, que se intensificou após uma cirurgia em 2022 para remover suas glândulas adrenais. Esta cirurgia foi necessária para reduzir os altos níveis de cortisol, mas teve um efeito colateral inesperado: acelerou ainda mais a mudança de cor de sua pele, que continua escurecendo à medida que o tumor se expande e produz mais hormônio ACTH.
A produção excessiva de ACTH pelo tumor é incomum e provoca efeitos que vão além da Síndrome de Cushing. Como ACTH e MSH (hormônio responsável pela produção de melanina) têm origens semelhantes, o corpo de Sabrina confunde os dois hormônios, aumentando a produção de melanina, a proteína que dá cor à pele. Esse processo é o que explica o escurecimento progressivo de áreas do corpo da jovem, um sintoma raro e difícil de controlar.
A endocrinologista Ana Rosa Quidute, que acompanha o caso, explica que o tumor de Sabrina é um desafio médico por ser neuroendócrino e por produzir ACTH em excesso. Ela esclarece que, em tumores como o timoma de Sabrina, o risco de complicações hormonais pode ser mais ameaçador que o próprio tumor. “O excesso hormonal descontrolado é o que precisa de tratamento imediato, pois a Síndrome de Cushing sozinha já é grave e pode levar a consequências fatais se não tratada”, ressalta a médica.
No ano passado, Sabrina enfrentou uma cirurgia delicada para drenar o líquido acumulado no pericárdio, a membrana que envolve o coração, e alargar a traqueia, comprimida pelo tumor. Essas medidas foram paliativas, mas necessárias para evitar que as funções respiratórias e cardíacas fossem comprometidas ainda mais pela compressão causada pelo crescimento do timoma.
Como a cirurgia de remoção do timoma é inviável devido à sua proximidade com órgãos vitais, a equipe médica sugeriu um tratamento alternativo, que envolve o uso do lutécio, um radiofármaco especializado em atacar células tumorais neuroendócrinas. Este medicamento possui uma carga radioativa que é absorvida pelas células do tumor, podendo reduzir seu tamanho e controlar os sintomas causados pela produção excessiva de hormônios.
Segundo Ana Rosa, antes de recomendar o lutécio, a equipe médica realizou exames para avaliar se as células do tumor de Sabrina possuíam receptores adequados para captá-lo. O resultado foi positivo, o que abriu uma nova possibilidade de tratamento. “O lutécio tem potencial para diminuir o volume do tumor, e isso nos dá esperança de controlar a doença”, comentou a médica.
O tratamento com lutécio é composto por quatro aplicações endovenosas, com intervalos de seis semanas entre cada dose. Cada aplicação custa em média R$ 32 mil, totalizando cerca de R$ 130 mil. Sabrina, no entanto, não possui recursos para arcar com os custos e acionou a Defensoria Pública da União para pleitear judicialmente o fornecimento do medicamento.
Em dezembro de 2023, a Justiça determinou que a Secretaria Estadual de Saúde do Ceará (Sesa) providenciasse o tratamento com lutécio. A decisão judicial foi favorável, mas a aquisição do medicamento tem enfrentado atrasos. Sabrina tem retornado à Secretaria de Saúde em busca de informações sobre a entrega do remédio, que já deveria estar disponível desde março de 2024.
“Eu levo todos os documentos e explico a gravidade do meu caso, mas até agora nada foi resolvido”, relatou Sabrina. Em agosto, uma nova ordem judicial determinou que a Sesa acelerasse a compra, mas até o momento o medicamento ainda não foi fornecido, e a jovem continua aguardando pelo início do tratamento.
Enquanto luta para conseguir acesso ao lutécio, Sabrina enfrenta as complicações diárias causadas pelo timoma e pela Síndrome de Cushing. O tumor, que continua a crescer, coloca pressão sobre órgãos vitais e contribui para o escurecimento progressivo de sua pele, além de provocar sintomas debilitantes que afetam sua qualidade de vida.
O caso de Sabrina evidencia os desafios enfrentados por pacientes com doenças raras e complexas no sistema público de saúde. Mesmo com uma decisão judicial, a jovem segue aguardando o medicamento que pode oferecer alívio aos sintomas e controlar a progressão de sua condição, enquanto enfrenta um quadro clínico grave e debilitante.
Confira o vídeo de Sabrina contando sua história e denunciando a Secretaria da Saúde do Ceará:
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