Durante a regulamentação das apostas no Brasil, o governo teve 251 reuniões com representantes de bets, mas apenas 5 com grupos de saúde, segundo uma reportagem publicada pela Folha de S. Paulo. A análise de 555 compromissos dos ministérios da Fazenda e da Saúde, entre março de 2023 e 31 de julho de 2024, revela que 381 reuniões envolveram o mercado de apostas.

Destas, 251 foram dedicadas a diálogos com bets. Os encontros, que envolveram altos funcionários como Regis Dudena e José Francisco Manssur, foram cruciais para a formulação de regras semelhantes às de Gibraltar, Malta e Curaçao, locais conhecidos por abrigar várias dessas empresas.

No entanto, essas normas têm sido criticadas por não contemplarem adequadamente o investimento em saúde para tratar jogadores patológicos. Apesar das 13 reuniões realizadas com o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR) e 10 com a Associação Nacional de Jogo Legal (ANJL), que representam o setor de apostas, a Secretaria de Saúde Mental do Ministério da Saúde participou de apenas cinco encontros.

O único ambulatório especializado no vício em apostas, o Pro-Amjo do Hospital das Clínicas da USP, não foi consultado durante a criação das políticas de “jogo responsável”. Pesquisadores e profissionais de saúde criticam a falta de investimento em tratamentos especializados e campanhas de conscientização.

O Ministério da Fazenda, em nota enviada à Folha de S. Paulo, afirmou que as campanhas educativas para mitigar problemas relacionados ao jogo patológico serão implementadas a partir de 2025, com a participação dos próprios sites de apostas.

Enquanto o setor de apostas comemora a regulamentação, especialistas em saúde alertam que o Brasil não está preparado para enfrentar a epidemia de vício em jogos, já que as equipes de saúde mental não receberam o treinamento necessário para diagnosticar e tratar adequadamente a ludopatia.

Estima-se que os brasileiros gastaram cerca de R$ 54 bilhões em apostas online em 2023, valor que reflete o impacto econômico, mas também o potencial risco à saúde pública. Especialistas como Hermano Tavares, coordenador do Pro-Amjo, destacam que esse dinheiro sai “do bolso do trabalhador”, podendo comprometer o futuro de uma geração. “É igual à propaganda do ‘beba com responsabilidade’, é colocar a raposa para cuidar do galinheiro.”

O governo enfrenta o desafio de equilibrar o crescimento econômico proporcionado pela regulamentação das apostas com a necessidade urgente de proteger a saúde pública e tratar a dependência em jogos, que já atinge proporções epidêmicas no país.

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