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A atuação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Goiás, sob a gestão de Gilvane Felipe (Cidadania), tem gerado questionamentos por parte do governo do Estado. O Executivo critica a paralisação das obras do novo Cavalhódromo de Pirenópolis, a situação de degradação Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte na Cidade de Goiás, e autorização para edificações que destoam do patrimônio Art Déco no centro de Goiânia. 

Nossa Senhora da Boa Morte

Ao visitar a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte, na cidade de Goiás, no final de julho, o governador Ronaldo Caiado (UB) criticou o abandono da Igreja. O prédio tombado está em ruínas e ameaça desabar, colocando em risco um acervo de mais de 900 peças, incluindo obras de José Joaquim da Veiga Valle, o “Aleijadinho goiano”. O governador disse: “O Iphan é um órgão que só sabe atrapalhar e não ajuda em nada. É impressionante. Eles atrapalham aqui, o Estado não pode fazer nada. A praça toda está recuperada, apenas a igreja está completamente abandonada”.

Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte situada diante do Largo da Matriz, em Goiás
Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte situada diante do Largo da Matriz, em Goiás | Foto: Divulgação

O deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), Bruno Peixoto (UB), fez coro às críticas a autarquia vinculada ao Governo Federal e citou como bons exemplos as reformas da Catedral de San´tanna, Nossa Senhora Aparecida, no Povoado de Areia e a Igreja do Ferreiro tocadas pelo Governo de Goiás e inauguradas durante a transferência simbólica da capital do Estado para a Cidade de Goiás. “Não podemos aceitar que o Governo Federal deixe a memória do nosso povo virar pó”, disse.

Por meio de nota enviada ao Jornal Opção na ocasião, o superintendente do instituto em Goiás, Gilvane Felipe, comentou que, apesar de ser um bem tombado, a Igreja da Nossa Senhora Boa Morte não pertence ao IPHAN. A gestão é compartilhada entre a Diocese de Goiás e o Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM). “O IPHAN notificou formalmente o Ibram quanto à necessidade urgente de manutenção da igreja”, completou.

Na nota do Iphan, se lê: “A igreja abriga o Museu de Arte Sacra da Boa Morte, cuja gestão da função museológica é do Ibram, firmada em termo de cessão para este fim. Ou seja, o Iphan não tem responsabilidade pela gestão do bem. Conforme o Decreto-Lei 25/1937, a responsabilidade pela conservação das edificações tombadas em nível federal é dos seus proprietários. O tombamento federal não altera a propriedade do bem, mas busca impedir que este seja destruído ou descaracterizado. Cabe ao Iphan fazer a fiscalização do bem tombado, como tem feito no templo mencionado, e indicar a seus proprietários ou gestores a execução de adequações eventualmente necessárias.”

Em maio, o governo do Estado enviou ofício aos dois órgãos solicitando informações e oferecendo apoio técnico para viabilizar a restauração, mas não houve avanço. Para Caiado, falta vontade política para discutir a transferência da gestão ao Estado e impedir que o patrimônio continue a se deteriorar. O Ibram não respondeu ao Jornal Opção até o fechamento desta matéria e Diocese afirmou “Dom Jeová não irá se pronunciar sobre o assunto”. 

estação brt praça cívica
Estação do BRT destoante do conjunto Art Déco cobre museu Zoroastro Artiaga | Foto: Guilherme Alves / Jornal Opção

Centenário Art Déco

A liberação para a construção das estações do BRT ao redor da Praça Cívica e na Avenida Goiás e da própria sede do Iphan também são alvos de críticas. A sede do Iphan é um prédio tombado no conjunto Art Déco da capital e foi reformado com a instalação de estruturas metálicas e placas de vidro — alterações que destoam das características originais. 

A flexibilização do rigor com a correção estética e histórica foi criticada pelo governador, que comparou as estações do BRT à gaiolas. “Eu não sei onde é que está esse compromisso (do Iphan), com aquelas gaiolas que foram construídas na Praça Cívica, que é, por certo, o único e o maior monumento que nós temos no estado, o maior conjunto arquitetônico de art déco”, questionou Caiado em outra ocasião.

Sede do Iphan modificada após reforma | Foto: Guilherme Alves / Jornal Opção

Cavalhódromo 

O Iphan não autorizou a execução do projeto, elaborado pela Secretaria da Cultura (Secult) e pela Secretaria de Infraestrutura (Seinfra) para a construção do novo Cavalhódromo de Pirenópolis. Enquanto o governo do Estado afirma que o impedimento se deu por uma portaria de 1995 que impõe restrições de altura e ocupação, o Iphan afirma que a questão é mais complexa. 

O Cavalhódromo foi interditado em 2023 porque apresentava risco iminente de desabamento, segundo a Defesa Civil. Em reuniões realizadas no início de 2024 com representantes da Secretaria da Retomada, Secretaria da Cultura, comunidade detentora do imóvel, promotores do Ministério Público, ficou acordado que o espaço usado para festas e esportes seria demolido, limpo, e que o gramado do local seria usado até a conclusão das obras. Os participantes acordaram que o projeto do novo Cavalhódromo seria apresentado à sociedade (O processo é publico e pode ser consultado aqui).

Segundo Renata Silva de Oliveira Galvão, chefe do Escritório Técnico do Iphan em Goiás, “a comunidade detentora entendeu que o projeto apresentado não atendia suas necessidades, pois é um prédio gigantesco com campo pequeno demais para receber as Cavalhadas. Não é que ‘o Iphan não quer’, o impasse existe porque a comunidade detentora não concordou com o projeto”, disse Renata Galvão.

No processo 01516.000116/2024-87, se lê: “A comunidade e os detentores da Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis definiram os seguintes apontamentos e sugestões quanto ao projeto proposto: Indicou-se a necessidade de adequar as medidas do campo, precisam ser maiores para garantir uso dos jogadores de futebol (…); ressaltou-se que preciso pensar em uma estrutura [do prédio] menor;  os representantes do Estado de Goiás se comprometeram em agendar uma reunião presencial para apresentar o Projeto detalhadamente à comunidade.”

Política

Gilvane Felipe foi auxiliar em diversos cargos do ex-governador Marconi Perillo (PSDB). Nos bastidores, há a avaliação de que a condução atual do Iphan em Goiás pode estar alinhada a uma estratégia política do ex-governador para criar obstáculos à atual gestão estadual.