O período de férias escolares e as festas de fim de ano trazem consigo um aumento no número de acidentes envolvendo crianças. Dados do Corpo de Bombeiros Militar de Goiás (CBMGO) obtidos pelo Jornal Opção revelam que, somente este ano, já foram registrados 421 acidentes com crianças de 0 a 11 anos, sendo 7 apenas nos primeiros nove dias de dezembro.

Em comparação, julho, outro mês de recesso, apresentou 30 ocorrências em 2025 contra 36 em 2024, uma redução que contrasta com a tendência de alta no último mês do ano. Paralelamente, a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO) informou que cinco crianças morreram em decorrência de quedas em 2025, duas delas no mês de julho. 

“A faixa etária que corre mais riscos de acidentes domésticos são às crianças de até quatro anos de idade”, afirmou o Tenente Coronel Lobo, do Corpo de Bombeiros Militar de Goiás (CBMGO). Ele explica que, nessa fase, a criança já tem capacidade de locomoção, mas quase nenhuma noção clara do perigo. Além disso, os tipos de acidentes mais atendidos pela corporação seguem um padrão recorrente: quedas, afogamentos, queimaduras e intoxicações.

Para contextualizar, no Hospital Estadual da Criança e do Adolescente (Hecad), em julho de 2024, os acidentes domésticos concentraram quase 15% do total de atendimentos. Em nível nacional, o Sistema de Informações sobre Mortalidade registrou quase 500 mortes de crianças e adolescentes de até 19 anos em acidentes domésticos no Brasil em 2024.

Em entrevista ao Jornal Opção, a médica pediatra Mirna de Sousa destacou que a mudança na rotina familiar é um fator-chave. “A criançada está em casa e os pais continuam trabalhando. Então, o nível de atenção e de cuidado para as crianças no dia-a-dia, nesse período, já cai”, analisa.

“É sempre importante lembrar que, em crianças pequenas, o maior número de acidentes acontece dentro de casa”, enfatiza Dra. Mirna. “São acidentes com afogamento, quase afogamento, em banheira, em piscina, às vezes, em balde de água, bacias de água esquecidas no meio da casa. A criança que engatinha, ela vai lá, cai e não consegue sair”, detalha.

Médica pediatra Mirna de Sousa | Foto: Divulgação

A lista segue com “queda de própria altura, queda de escada, queda de cama. Acidente com substâncias químicas. Intoxicação exógena, a criança tem acesso a produto químico, ingere o produto ou medicamentos”.

A pediatra defende que os riscos podem ser categorizados para melhor entendimento e prevenção. “Os perigos dentro de casa e os perigos fora de casa”. No ambiente doméstico, além dos já citados, ela aponta “queimaduras com panela que está no fogão, ou às vezes a criança vai escalar o móvel, o móvel cai”.

“Mesmo dentro de casa, os pais têm que ficar muito atentos e tentar fazer da casa um ambiente seguro”, orienta. “Para a criança pequena, é preciso colocar na casa um protetor de tomada, de portas. Quem tem escada, coloque uma proteção ali e na piscina também, e medicamentos, produtos químicos longe do alcance da criança”.

Por outro lado, os “perigos fora de casa” são igualmente desafiadores. “A gente sabe que nesse período aumenta o movimento nas estradas, é um período chuvoso, aumentam os acidentes com vítimas fatais e não fatais. E dentro dessas vítimas, muitas crianças, muitas vezes, não estão usando o dispositivo de segurança adequado”.

O perigo da distração em festas e viagens

Um ponto destacado pela médica é o contexto das confraternizações. “Quando chega no destino das férias ou nas festas de família, os adultos estão distraídos, muitas vezes, isso associado com injeção de bebida alcoólica, diminui o nível de atenção do adulto responsável, e a criança, de novo, está exposta a acidentes graves”.

Nesse cenário, o risco de afogamento retorna com força. “Mesmo que uma criança saiba nadar, ela não pode ficar sem supervisão perto de água, nunca”. Além disso, é preciso atenção a “queimadura solar, desidratação, porque, também, nesse período, muitas vezes vai para um ambiente de praia ou com muito sol”.

Sua recomendação é abrangente: “Para qualquer ambiente, tem que ter um adulto responsável pela criança, sempre. Não pode piscar.”

A prática, segundo ela, exige comunicação clara. “Se vai sair para pegar uma água, para ir ao banheiro, para conversar com uma pessoa, chame um outro adulto responsável e fale: ‘A criança está aqui, eu vou ali fazer algo e já volto. Você está tomando conta dela nesse momento’. Verbalize isso, tem que ser uma comunicação clara, reta”.

Como agir em casos de acidente?

Questionada sobre os procedimentos corretos em situações de emergência, Dra. Mirna inicia com um conselho: “A gente fala que sempre, quando vivemos uma situação de emergência, a primeira coisa a fazer é gritar por ajuda, gritar por socorro. Porque, às vezes, a gente tem muito próximo alguma pessoa que é capacitada para resgate”.

Especificamente para afogamentos, a cautela é extrema: “Cuidado, porque, às vezes, no ímpeto de querer salvar a criança, o adulto pula na água e, muitas vezes, se afoga junto. Então, tentar usar um cabo de vassoura, um cano, alguma coisa que você consiga entregar, ou jogar uma boia”.

“É necessário para o responsável tentar manter a calma, porque o adulto, quando ele está muito apavorado, nesses momentos, são momentos de grande pressa, muitas vezes, ele se coloca em risco também, ou, às vezes, piora o quadro, ao invés de ajudar”, completa.

A Dra. Mirna avalia que o caminho para reduzir os índices ainda é longo. “Eu acredito que ainda falta muita conscientização, sim. As famílias muitas vezes ficam naquela história de ‘a tragédia acontece só com o outro”.

“É necessário alertar sempre, fazer campanhas de conscientização, isso faz diferença”, defende. “São gotinhas no oceano, mas a gente vai transformando a realidade através de informação de qualidade”.

Quedas, afogamentos, queimaduras e intoxicações lideram as ocorrências

Em sintonia com a especialista, o Tenente Coronel Lobo confirma a elevação nas ocorrências. “No período de férias escolares, realmente a gente observa um aumento nesse tipo de ocorrência. É um período que as crianças ficam mais nas residências. Muitas vezes não estão sob a supervisão constante de um adulto e isso favorece uma situação de algum acidente”.

Para o oficial, a prevenção se sustenta em dois pilares: “Os dois pilares para a gente evitar acidentes com crianças no ambiente doméstico são supervisão constante de um adulto ou responsável e adaptação do ambiente”.

Tenente Coronel Lobo | Foto: Divulgação

Segundo o Tenente Coronel, a lista dos acidentes mais atendidos pela corporação, são quedas, afogamentos, queimaduras e intoxicações. 

Sobre quedas, a orientação é “instalar redes de proteção nas janelas. Mesmo que a pessoa não tenha crianças em casa, mas que receba visitas de crianças, é necessário essa instalação e também manter móveis longe das janelas”. Já para prevenir queimaduras, ele recomenda “manter os cabos e as panelas para dentro do fogão e usar protetor de tomada”.

Sobre afogamentos, ele adverte: “O básico é a supervisão constante. Não pode deixar a criança sozinha ter acesso à piscina. Mesmo que seja uma criança que saiba nadar”. Além disso, o Tenente Coronel alerta para um perigo subestimado: o afogamento de crianças, de cerca de 2 anos, em baldes, bacias e até no vaso sanitário. “Deixe eles sempre tampados. Os casos estão aí para provar que existe essa possibilidade”.

Quanto às intoxicações, a regra de segurança sugerida é “sempre colocar medicamentos e produtos de limpeza em armários altos e trancados”. Ele também chama a atenção para a escolha de brinquedos adequados à faixa etária, para evitar engasgos.

Além disso, ele ressalta a importância do conhecimento em primeiros socorros. “É importante que os adultos conheçam os procedimentos de emergência para caso de acidente doméstico. Todos os pais responsáveis que têm crianças, eles têm que ter esse conhecimento”.

“Seja o que fazer em caso de queimadura, o que fazer em caso de intoxicação. Se você tem condições de levar a criança ao ambiente hospitalar, leve. Alguns minutos podem ser decisivos”, ressalta. O Tenente Coronel Lobo destaca ainda que a manobra de desengasgo é um conhecimento vital: “É importante que todo pai e mãe saiba fazer uma manobra de desobstrução de vias aéreas. Elas podem ser a diferença entre a vida e a morte”.

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