Casos recorrentes de trabalho escravo no Brasil evidenciam o longo percurso que o país ainda tem de percorrer até poder vangloriar-se de nação consciente e justa

Ação da SRTE/GO resgatou sete trabalhadores submetidos a condições desumanas em uma fazenda de Jataí cuja jornada diária era de 15 horas diárias, sem direito a descanso | Foto: Divulgação SRTE/GO
Jornada diária era de 15 horas diárias, sem direito sequer uma hora de descanso | Foto: Divulgação SRTE/GO

Na data em que deve ser votada a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata sobre o trabalho escravo (57A/1999), na tarde desta terça-feira (27/5), a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Goiás (SRTE/GO) divulgou mais um caso de trabalhadores em condições análogas à escravidão no Estado de Goiás, que entre 2008 e 2014 contabiliza 2.158 pessoas nessa situação (confira tabela a seguir). São 126 anos desde a abolição da escravatura no Brasil, tardia, vale ressaltar; e faz 15 anos que a PEC do Trabalho Escravo tramita no Congresso Nacional, num trâmite moroso –– embora preveja a expropriação de propriedades rurais ou urbanas onde seja flagrado o trabalho análogo à escravidão, considerado crime pelo Código Penal em seu artigo 149.

tabela trabalho escravo

A ação da SRTE/GO resgatou sete trabalhadores submetidos a condições desumanas em uma fazenda de Jataí, localizada no km 435, sentido Rio Verde. As vítimas da ambição deste fazendeiro trabalhavam em atividades de carregamento, empilhamento, carga e descarga de toras de eucalipto, numa jornada de 15 horas diárias –– enquanto a Convenção das Leis Trabalhistas (CLT) prevê máximo de 8 horas diárias, quando muito 10; e 12 no caso de pagamento de hora extra. Acima disso, somente se for essencial à empresa, que tem de arcar com a hora extra em dobro ao funcionário.

De acordo com Superintendente Regional do Trabalho e Emprego em Goiás, Arquivaldo Bites, os sete trabalhadores trabalhavam das 6h às 20h sem sequer uma hora de intervalo para descanso, sendo que, embora houvesse carteiras de trabalho assinadas com o valor do salário mínimo (R$ 724), eles nunca receberam esse direito. O “patrão” pagava-lhes R$ 3,00 por metro de madeira carregada no caminhão e R$ 2,00 por metro de madeira descarregada.

Somado à exploração física dessas pessoas, as equipes da SRTE/GO identificaram ainda diversos fatores de risco à saúde e integridade física, como ferimentos nas mãos e demais partes do corpo; exposição à poeira; exposição a ruído das máquinas, picadas de animais peçonhentos; posturas penosas, entre outros. “A sociedade precisa saber que existem pessoas sofrendo em condições degradantes e desumanas, para que outras obtenham um lucro acima do justo”, destaca Arquivaldo Bites.

A fazenda em questão foi interditada pelo Ministério do Trabalho (MPT). Vinte e sete autos de infração foram lavrados contra o proprietário e os sete trabalhadores receberam R$ 30.927,74 mais o pagamento de cinco parcelas de seguro desemprego que serão ajuizadas em ação civil para reparo do dano à dignidade dos trabalhadores.

Caso de repercussão nacional ocorrido em Goiás recentemente resultou na condenação às lojas C&A de Goiânia e Aparecida de Goiânia a pagarem R$ 100 mil por jornada de trabalho excessiva. A decisão foi interposta após a Procuradoria Regional do Trabalho no Estado constatar o descumprimento de uma série de normas trabalhistas.

Entre outras irregularidades, as unidades da marca obrigavam o trabalho em feriados sem autorização em convenção coletiva, não homologavam rescisões no sindicato dos trabalhadores, não concediam intervalo de 15 minutos quando a duração do trabalho ultrapassava quatro horas, impediam o intervalo para repouso e alimentação em situações diversas, prorrogavam a jornada de trabalho além do limite legal de duas horas diárias e não pagavam horas extras no mês seguinte à prestação de serviços.

[Atualização]: A matéria originalmente afirmava que a C&A havia sido condenada por trabalho análogo à escravidão. Sobre isso, a empresa enviou nota ao Jornal Opção Online esclarecendo a situação.

Confira:

Sobre a decisão do TST envolvendo a C&A

A C&A esclarece que fiscalizações ocorridas em 2009 em três lojas localizadas no Estado de Goiás lamentavelmente identificaram irregularidades com relação ao cumprimento de jornada de trabalho pelos seus funcionários. Essas fiscalizações resultaram em um processo, cujo julgamento teve desfecho na semana passada, no Tribunal Superior do Trabalho.

Em respeito à opinião pública e, principalmente, aos nossos mais de 20 mil funcionários, a C&A enfatiza que nenhuma das decisões proferidas nos autos da ação teve como fundamento a ocorrência de trabalho análogo ao escravo dentro da empresa.

Com unidades em quase todo o País, a C&A empreende continuamente uma série de iniciativas com o objetivo de cumprir a legislação trabalhista em suas 269 lojas, nos centros de distribuição e nas demais áreas administrativas. Entre essas medidas estão a adoção de sistemas de tecnologia que apoiam o planejamento e o controle da jornada de trabalho dos funcionários, o treinamento das lideranças e a disponibilidade de vários canais de comunicação para que os funcionários possam se informar e esclarecer dúvidas sobre diversos temas, entre eles, as relações de trabalho. Além disso, a empresa tem como um dos pilares da sua estratégia de Sustentabilidade a valorização de seus funcionários.

Em seus 37 anos de atividade no Brasil, a C&A atua para que as relações de trabalho, em todos os níveis, sejam justas, transparentes e respeitosas.

C&A