Especialistas avaliam que ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral é estratégia frágil e sem criatividade
03 agosto 2021 às 12h11
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Profissionais do marketing avaliam que o presidente utiliza dos ataque às instituições para desfocar dos problemas do governo
Por parte de todos aqueles que desejam disputar as eleições presidenciais em 2022, as estratégias já foram delineadas e cartas já foram postas na mesa. Para Jair Bolsonaro (sem partido), atual presidente da República que visa reeleição, esse cenário não seria diferente. Nesse leque de táticas a serem implantadas, o principal alvo de Bolsonaro são as instituições políticas e o sistema eleitoral, de modo que a defesa pelo voto impresso se coloca como seu maior discurso atual.
O fato de, na última quinta-feira, 29, o presidente ter convocado a imprensa e seus apoiadores para uma live onde, em tese, ele apresentaria provas que comprovariam as fraudes eleitorais dos anos de 2014 e 2018 que ele tanto sustentou desde antes de ser eleito, e no final ter afirmado “não ter como se comprovar que as eleições não foram ou foram fraudadas” após passar duas horas e quarenta e nove minutos desferindo ataques ao sistema eleitoral, foi a gota d’água para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso, porque nesta semana, a Corte fez questão de abrir um inquérito administrativo contra o presidente, com a intenção de apurar os ataques sem prova de Bolsonaro ao voto eletrônico.
A solicitação do TSE também foi para que o presidente da República passe a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em um inquérito que já se encontra aberto na Cúpula do Poder Judiciário.
Para Jorcelino Braga, empresário, atuante no marketing político e presidente regional do Patriota-GO, o aumento dos ataques de Bolsonaro às instituições se tratam de um desvio de foco e de uma estratégia falha, que promove um grande desgaste político ao governo federal.
“O governo está tendo inúmeros problemas, então eles estão criando factoides para desviar a atenção, só que é tão absurdo falar em voto de papel em pleno século 21, ao considerar toda nossa inteligência artificial, toda a tecnologia do mundo. É a mesma coisa de falar em parar com o WhatsApp e voltar para o Código Morse, telégrafo e para a entregar cartas. É uma volta ao século 18”, afirma.
Quando se trata dessa fragilidade da tática utilizada por Bolsonaro, o mestre em Comunicação, Mídia e Cultura que atua com Marketing Político, Paulo Faria, concorda. Como exemplo da falta de eficiência do voto de papel, ele exemplifica o caso das eleições municipais de Goiânia, no ano de 1985, onde Daniel Antônio (PMDB) venceu Darci Accorsi (PT) no pleito em um único turno.
“O Darci era desconhecido, mas fez uma campanha de marketing que ficou conhecida no Brasil todo porque foi inovadora, o programa era uma cadeira de barbeiro, onde ele saía nas barbearias falando sobre as propostas dele. Nessa eleição, no entanto, foram encontradas nas ruas de Goiânia, urnas abertas e votos jogados nas ruas. Era uma quantidade pequena, mas era isso que acontecia”, relembrou, ao pontuar que, com a urna eletrônica, criou-se um controle que não existia.
Desse modo, para Paulo, o atual presidente da República vem utilizando de ações previsíveis, ao se encontrar sem saída. “Como o governo Bolsonaro não entrega serviços, o que sobrou foi fazer um debate do enfrentamento a questões especificas, então Bolsonaro está copiando o discurso de contestação do voto utilizado por Donald Trump, nos Estados Unidos, durante as eleições.
No entanto, no que se refere a qualidade estratégica para enfrentamento político, considero essa uma tática de tamanha fragilidade, já que continua sendo voltada para o público interno, que hoje está na faixa dos 25% da população. Além disso, a base de lógica dela também é frágil, pela falta de criatividade e pelo fato de que temos uma longa, positiva e duradoura experiencia com o uso das urnas eletrônicas”, pontua Paulo.
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O que deveria ser feito, para Paulo Faria, era a construção de uma estratégia que permitisse alargar o público-alvo. No entanto, ele acredita que para Bolsonaro, isso se trata de uma encruzilhada. “Toda vez que ele faz uma estratégia que é mais acessível e abarca maior parcela da população, a base mais radical que o apoia, rejeita”, afirma.
O cientista político Guilherme Carvalho explica que essa estratégia utilizada por Bolsonaro, apesar de não tão funcional, ecoa em seu público e é semelhante a outras táticas já adotadas pelo presidente, que “sempre tenta puxar o debate para algum tipo de polarização”.
Antes, diz Guilherme, esse foco era principalmente voltado a questão da moralidade e da corrupção, mas desde que o ex-juiz Sergio Moro anunciou sua demissão do Ministério da Justiça, em abril de 2020, e lançou uma série de eventuais problemas relativos ao bem público no interior do governo, essa retórica é alterada.
“Durante toda a eleição, era o nós, aqueles que não estão envolvidos em escândalo nenhum e que não se mistura com esse tipo de pessoa, contra eles. No momento em que ele perde a capacidade de continuar mantendo essa retórica, ele passa a jogar a discussão para o âmbito do questionamento das instituições estabelecidas, como as instituições eleitorais”, esclarece o cientista político.
Guilherme relembra, no entanto, que esse movimento não é novo, mas que se iniciou desde o final do ano de 2014, momento em que o “bolsonarismo nasce como herdeiro” do impeachment da ex-presidente Dilma.
“Ali ele começa a instrumentalizar uma serie de contestações ao processo eleitoral, que ganharam bastante eco nas eleições norte-americanas, mas perderam certa nas eleições de 2018, quando ele é eleito pelo mesmo sistema. Para recobrar todo esse movimento, ele começou a dizer que teria vencido as eleições de 2018 no primeiro turno, quando na verdade ele utiliza um vídeo com 11% das urnas apuradas dizendo que aquilo seria o resultado”, contextualiza.
“A retórica que agora é instrumentalizada por ele é que acabou a corrupção no Brasil, e que o momento atual é outro: o de extirpar os erros no interior das instituições, o que inclui as eleições, que passam a ser um erro por, segundo ele, não serem totalmente transparentes”, ilustra o cientista político, que acrescenta que essa estratégia funciona especificamente com o núcleo mais duro de apoiadores de Bolsonaro, que são os que ainda o apoiam fielmente.