Escândalo de corrupção no setor de energia faz premiê de Portugal renunciar

07 novembro 2023 às 15h34

COMPARTILHAR
O primeiro-ministro de Portugal, António Costa (Partido Socialista), anunciou sua renúncia nesta terça-feira, 7, em meio a um escândalo de corrupção no setor de energia. A decisão veio após uma extensa operação que investiga irregularidades nos negócios relacionados à transição energética, atingindo o núcleo do governo de Costa.
Apesar de negar envolvimento em qualquer atividade ilícita, Costa afirmou que sua permanência no cargo é incompatível: “A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição da sua boa conduta e menos ainda com a suspeita de qualquer ato criminoso.”
O presidente Marcelo Rebelo de Sousa aceitou formalmente a renúncia, e os próximos passos, incluindo a convocação de eleições antecipadas, serão anunciados pelo chefe de Estado. Segundo a legislação portuguesa, é dele a prerrogativa de convocar eleições antecipadas e dissolver o Parlamento em situações consideradas graves.
Rebelo programou encontros com líderes partidários, bem como uma reunião extraordinária do Conselho de Estado, e planeja realizar um pronunciamento à nação na próxima quinta-feira, 9. Devido aos requisitos legais e ao período de recesso de fim de ano, quaisquer eleições antecipadas provavelmente só ocorrerão a partir de janeiro. No entanto, é esperado que Costa permaneça no cargo até que seu sucessor seja selecionado.
Megaoperação
A megaoperação realizada nesta terça envolveu mais de 140 agentes, incluindo policiais e membros do Ministério Público, que conduziram buscas em vários endereços, incluindo a residência oficial do premiê. As investigações se concentram em negócios ligados ao lítio e ao hidrogênio verde, componentes cruciais para os projetos de transição energética da União Europeia.
As primeiras suspeitas de irregularidades datam de 2019. O lítio é crucial para as baterias de veículos elétricos e o alvo é sua extração no município de Montalegre. No que diz respeito ao hidrogênio, as preocupações concentram-se na atuação do governo em um extenso projeto planejado para Sines.
Duas pessoas próximas a Costa foram detidos na operação: seu chefe de gabinete, Vítor Escária, e o consultor Diogo Lacerda Machado. As suspeitas recaem sobre negócios relacionados à concessão e extração de lítio em Montalegre e projetos de hidrogênio em Sines.
A Procuradoria-Geral da República justificou as detenções alegando perigos de fuga, continuação de atividade criminosa e perturbação do inquérito. Os detidos são suspeitos de prevaricação, corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e tráfico de influência.
Foram detidos também Nuno Mascarenhas, que é do mesmo partido socialista, ocupando o cargo de presidente da Câmara Municipal de Sines, equivalente ao de prefeito, juntamente com dois empresários. É importante ressaltar que o porto de Sines desempenha um papel fundamental como a principal saída para as exportações portuguesas.
A respeito da situação do primeiro-ministro, o Ministério Público esclareceu que o nome de António Costa surgiu durante as investigações, com suspeitos mencionando “sua intervenção para desbloquear procedimentos” no contexto das apurações.
O ministro das Infraestruturas, João Galamba, também foi alvo de buscas e formalmente declarado investigado, juntamente com o ministro do Meio Ambiente, Duarte Cordeiro, e o ex-titular da pasta João Matos Fernandes.
Impactos
O escândalo político abalou Portugal, com líderes de partidos de oposição pedindo a renúncia ou demissão do governo socialista. Após a divulgação das operações de busca, António Costa cancelou uma viagem a Porto e outros compromissos, dirigindo-se imediatamente para o Palácio de Belém, onde se reuniu com o presidente da República.
António Costa assumiu como primeiro-ministro de Portugal em novembro de 2015, graças a uma aliança inédita entre partidos de esquerda historicamente divididos. Apesar das críticas à fragilidade desse arranjo, apelidado pejorativamente de “geringonça”, o grupo conseguiu completar a legislatura.
Sua reeleição em 2019 foi seguida por eleições antecipadas em janeiro de 2022, após a não aprovação do Orçamento de Estado de 2022, resultando na dissolução do Parlamento pelo Presidente da República.
Surpreendentemente, o Partido Socialista, liderado por António Costa, conquistou uma maioria absoluta na Assembleia da República, apesar das pesquisas indicarem um empate técnico com a maior legenda da oposição. No entanto, seu terceiro mandato foi marcado por uma série de escândalos políticos no primeiro escalão e por uma acentuada queda na popularidade do líder socialista.
Leia também: