Entenda como um cientista brasileiro transformou a história e fez justiça para Galileu Galilei

17 fevereiro 2025 às 09h22

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A trajetória do cientista brasileiro Carlos Chagas Filho (1910-2000) é marcada por contribuições notáveis à ciência, mas um de seus feitos mais emblemáticos foi seu papel decisivo na reabilitação histórica de Galileu Galilei. Convidado pelo papa Paulo VI para presidir a Pontifícia Academia de Ciências, Chagas Filho viu na posição uma oportunidade de corrigir um erro secular da Igreja Católica: a condenação do astrônomo italiano pelo Tribunal da Inquisição no século XVII.
Galileu Galilei, um dos maiores cientistas da história, foi processado pela Igreja em 1615 por defender a teoria heliocêntrica, que colocava o Sol, e não a Terra, no centro do universo. Suas descobertas, baseadas em observações astronômicas, contrariavam a visão geocêntrica tradicionalmente aceita na época.
Como resultado, foi julgado, declarado herege e forçado a se retratar para evitar penas mais severas. Mesmo após negar publicamente sua própria teoria, passou seus últimos anos em prisão domiciliar.
O episódio se tornou um dos maiores símbolos do conflito entre ciência e religião, sendo amplamente criticado por cientistas e intelectuais ao longo dos séculos. Para Chagas Filho, um homem de fé e um defensor incansável do conhecimento científico, era inaceitável que Galileu permanecesse manchado pela condenação.

Durante os 16 anos em que presidiu a Pontifícia Academia de Ciências, entre 1972 e 1988, Chagas Filho trabalhou ativamente para revisar o caso. Liderou estudos e reuniu evidências históricas e científicas que fundamentaram o reconhecimento do erro da Igreja. Seu esforço culminou na reabilitação formal de Galileu em 1992, quando o papa João Paulo II anunciou publicamente que a condenação do astrônomo foi um equívoco.
O impacto de Carlos Chagas Filho dentro da Pontifícia Academia de Ciências não se restringiu ao caso Galileu. Ele promoveu debates sobre temas de grande relevância para a humanidade, como os impactos dos conflitos nucleares, alertando para os perigos das armas atômicas e para a necessidade de um uso pacífico da energia nuclear.
Outro destaque de sua atuação foi sua participação nos estudos sobre o Santo Sudário, a relíquia que, segundo a tradição cristã, teria envolvido o corpo de Jesus Cristo após sua crucificação. Com base em análises científicas, Chagas Filho e sua equipe concluíram que o tecido datava do século VII, fornecendo uma nova perspectiva sobre a história do artefato.
Além de sua influência no Vaticano, Chagas Filho teve um papel fundamental no desenvolvimento da ciência no Brasil. Fundou o Instituto de Biofísica da Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e foi um dos responsáveis pela criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão essencial para o financiamento e promoção da pesquisa no país.
Sua atuação também o levou ao cenário internacional. Ele participou de conferências da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e representou o Brasil em discussões sobre ciência e desenvolvimento global. Como diplomata e cientista, Chagas Filho defendeu a importância da ciência como ferramenta para o progresso da humanidade.
Herança científica
A paixão pela ciência estava no DNA de Chagas Filho. Ele era filho de Carlos Chagas, o renomado médico sanitarista que descobriu a doença de Chagas e se tornou o único cientista do mundo a descrever completamente uma doença infecciosa – identificando o parasita causador, seu vetor, seus hospedeiros, as manifestações clínicas e a epidemiologia da enfermidade.
Ao longo de sua vida, Carlos Chagas Filho publicou cerca de 200 artigos científicos e recebeu diversos reconhecimentos pelo impacto de seu trabalho. Seu legado ultrapassa fronteiras, consolidando-se na história como um dos cientistas brasileiros mais influentes.
Seja no Brasil ou no exterior, sua atuação representou uma ponte entre fé e razão, entre tradição e inovação. Ao corrigir uma injustiça histórica e promover o diálogo entre ciência e religião, Chagas Filho provou que o conhecimento deve estar sempre a serviço da humanidade.
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