Entenda como o consumidor goiano foi prejudicado com altas em diversos setores desde 2020
14 março 2021 às 13h05

COMPARTILHAR
Alimentação e combustível foi o que mais pesou no bolso da população

Desde o início de 2020, cidadãos goianienses se depararam com difíceis contextos. Além da Covid-19, que até o momento contaminou cerca de 431.260 mil pessoas no estado de Goiás, muitos acabaram desempregados ou com suas jornadas de trabalho e salários reduzidos. Em contrapartida, produtos essenciais como o combustível e a própria alimentação, sofreram aumentos que indignaram a população.
Alimentação mais cara
Já em 2021, o ano começou com mais um marco que impacta no bolso do consumidor goianiense: tanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de Goiânia sofreram aumento no mês de fevereiro. Ambos os indicadores medem o índice nacional de preços oferecidos ao consumidor em capitais brasileiras. Diferente do INPC, que no segundo mês o ano teve alta de 0,59%, o IPCA, que aumentou 0,76%, abarca uma parcela maior da população na amostragem da pesquisa – e engloba famílias que possuem desde renda mensal de 1 até 40 salários mínimos.
Referente ao acúmulo anual dos indicativos, apesar de ambos terem tido a terceira menor variação do país, o número ainda é elevado – sendo o IPCA com 4,65%, maior valor registrado desde 2016, que juntou 10,80%, e o INPC 1,09%. Segundo a economista e analista de mercado, Greice Guerra, o aumento do dólar, que subiu mais de 40% no ano de 2020, foi o grande responsável pelo aumento de ambas as taxas.
A economista explica que, com a alta da moeda americana, há grande impacto no valor dos insumos e, consequentemente, no preço final dos produtos e no bolso no consumidor. “A pandemia força o aumento do dólar e essa alta impacta as commodities, aumenta os custos de produção e o custo das empresas que, por sua vez, precisam repassar essa alta aos produtos’, detalha a analista.
Para o estudante de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Goiás (UFG), Matheus Barbosa, que realiza as compras mensais de alimentos em sua casa, o aumento que mais pesou foi o do preço dos alimentos, de forma geral. A alta fez com que ele tivesse que utilizar certas estratégias para que o impacto dos preços excessivos, atrelada às dificuldades financeiras, fosse o mais brando possível.

“Se no ano passado, quando eu realizava as compras com os tickets alimentação e precisava inteirar por volta de R$100, hoje preciso acrescentar entre R$300, R$350 reais. Para tentar driblar esse aumento, tivemos que diminuir o consumo de arroz e partir para outros carboidratos que podem substituir. Além disso, durante as compras, preciso analisar sempre o custo-benefício. Ao invés de escolher a marca mais cara, vou na que atende minhas necessidades e que cabe no orçamento”, explica Matheus.
E Matheus não está enganado. Segundo pesquisa publicada no início de março deste ano pela Superintendência de Proteção aos Direitos do Consumidor do Estado de Goiás (Procon-GO), desde 2020 houve aumento de 31,36% nos 13 tipos de produtos que são definidos pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) para comporem a cesta básica. De acordo com os dados levantados, atualmente, o preço da cesta poderá variar entre R$366,22 a R$645,44.
Contudo, mesmo que o aumento médio tenha sido na casa dos 31%, certos alimentos subiram cerca de 75%. O arroz, que Matheus mencionou ter precisado reduzir o consumo, teve aumento médio de 65,13%, atrás somente do óleo de soja, com 75,03% e seguido da banana maçã e da carne.
Além da alta do dólar, o advogado, pós-doutor em Direito do Consumidor e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Diógenes Faria, explica que a pandemia teve grande influência no encarecimento dos alimentos, já que as refeições realizadas em casa, que ocasionam uma demanda firme de produtos alimentícios, aumentaram. “Esse aumento impacta na saúde financeira do consumidor, pois somos uma pátria de superendividados, principalmente neste momento de crise, econômica, política e sanitária”, acrescenta.
Já a advogada especialista em Direito Civil, Taísa Steter, apesar de acreditar que a elevação de preços é consequência de diversos fatores, concorda. “Com o isolamento e o enfraquecimento das relações econômicas, a produção no campo foi muito afetada e isso promove a alta dos custos”, diz. A advogada também ressalta que o agravamento da situação é percebido ainda mais pela falta de uma política de enfrentamento de crise.
Preço dos combustíveis
No orçamento do estudante de Economia da UFG e motorista de aplicativo, Fábio Júnior, o que mais pesou, foi a alta dos combustíveis, que só em 2021 sofreram seis aumentos (seis na gasolina, com elevação de 54%, cinco no diesel, com 41,6%). Segundo o motorista, para conseguir obter lucros no trabalho, é necessário que sejam pegas muitas corridas durante o dia, o que inclusive impede que o trabalhador chegue em casa a tempo para assistir as aulas da faculdade, e tenha seu estudo prejudicado.

“Diferente do ano passado, em 2021 a demanda por corridas diminuiu muito, na percepção dos motoristas. Então a gente acaba muito mais tempo desligado, e com o preço do álcool, a maioria das viagens estão nos pagando R$1 real por quilômetro. Então, se a gente faz uma corrida de 10 km, ela tende a durar por volta de meia hora. Eu ganho R$10 reais, e o lucro que sobra para mim é de R$5,50. Para além do combustível, temos o custo do seguro do carro, do IPVA, multas e estragos que podem ocorrer no veículo pela quantidade de buracos nas vias, entre outros custos. Então antes, se eu trabalhava entre 4h e 5h por dia para obter R$16 reais por hora, hoje se eu trabalhar só isso, não consigo manter as contas básicas mensais”, explica Fábio.
A maior justificativa para o aumento, segundo a Petrobrás, é a necessidade de alinhamento internacional, que segue o Plano de Paridade Internacional (PPI) desde 2016 em resposta a uma política de controle de preços existente durante o governo de Dilma Rousseff (PT). O economista Walter Marin, entretanto, explica que uma das principais razões é a falta de concorrência e o estabelecimento de um monopólio da Petrobrás no país, que a impede de conseguir suprir a demanda interna e a obriga a importar. “Se tivessem mais refinarias, pode ser que elas dessem conta de abastecer internamente o Brasil sem a necessidade de importação”, diz.
Walter ainda acrescenta que os trabalhadores que sobrevivem de atividade informal são os mais prejudicados. “O aumento dos combustíveis dificulta o ingresso de capital estrangeiro no país, e o Brasil não possui recursos o suficiente para bancar a expansão dos investimentos e a capacidade produtiva em prol de reduzir o desemprego”, explica.

Como principal reação, motoristas de aplicativo dos municípios de Goiânia e Senador Canedo, realizaram paralisações, manifestações e carreatas em prol da implementação de políticas públicas redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que incide sobre a venda e o transporte de produtos. Os movimentos ocorreram tanto na porta da base da Petrobrás localizada em Senador Canedo, quanto na Praça Cívica, região central de Goiânia.
Inspeções dos preços
Entretanto, a percepção do Procon-GO, a partir do monitoramento de preços dos alimentos feito por fiscalização, é que os aumentos não são considerados abusivos. “No primeiro momento, empreendemos esforços através de diligências fiscais, para que fizéssemos uma série de visitas a supermercados e outras lojas que comercializavam esses produtos e notificássemos os estabelecimentos para a apresentação de notas fiscais de entrada e saída dos últimos meses”, explica o superintendente do Procon-GO, Allen Viana.

“Nós vivemos em um ambiente de livre mercado e não há tabelamento de preços para esses itens ou quaisquer outros, exceto medicamentos. Assim, o que nós monitoramos sempre, é se tem alguma alteração que tenha promovido uma majoração desproporcional. Sabemos que existem preços distintos em lojas distintas, mas com a posse das notas fiscais de entrada e saída dos produtos, conseguimos levantar que ao longo dos meses que não houve essa prática abusiva, já que o lucro obtido pelos pontos de venda não foi considerado desproporcional. Se tratou de uma dinâmica do mercado. Contudo, ainda há processos administrativos que estão sob análise da nossa gerência de cálculo”, esclarece.

As inspeções, entretanto, continuam. O Procon de Goiânia, por exemplo, durante o mês de março, está em uma operação de fiscalização dos postos de combustível, que visa averiguar se a redução do PIS/Cofins, aplicada em decreto pelo Governo Federal, está sendo praticada, além de buscar entender a motivação da elevação dos preços. Além de notificarem os postos para envio das notas fiscais referente aos três primeiros meses de 2021, o órgão ainda investiga as denúncias realizadas pelos consumidores. Isso, porque no início de março, Jair Bolsonaro (sem partido) assinou decreto e medida provisória que zeram tanto a cobrança de impostos federais ao gás de cozinha quanto o PIS e COFINS referentes ao óleo diesel – que vale pelos meses de março e abril de 2021.
Para que o consumidor possa reduzir o impacto desse encarecimento, a principal dica do Procon Goiás é a pesquisa de preços, seja ela feita pela própria população, ou a consulta de estatísticas realizadas por órgãos de defesa ao consumidor. Além disso, fazer uso um roteiro de compras e de calculadora para que não seja ultrapassado o orçamento. Também é válida a comparação de preços entre marcas e pontos de vendas distintos.
“Diante de um contexto de valores tão elevados que impactam tão sensivelmente o orçamento doméstico das famílias, quando você faz a pesquisa, terá uma variação de preços bem considerável. Um exemplo, é que em uma pesquisa do Procon quanto a um produto específico, vimos variação de 370% entre um supermercado e outro”, conclui o superintendente Allen Viana.