“Enquanto não houver equalização de tarifas, não dá para implantar a moeda unificada”, diz especialista
08 junho 2019 às 10h00

COMPARTILHAR
Governo brasileiro cogita criar o ‘peso-real’, moeda única entre nosso país e a Argentina

A proposta de criar uma moeda única entre Brasil e Argentina foi debatida durante visita do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao país vizinho. O “peso-real”, nome que seria dado à possível moeda, seria administrado por um banco central supranacional que conduziria uma política monetária unificada.
Para o ministro da Economia, Paulo Guedes, é possível que no futuro haja apenas uma moeda em toda a América Latina. Ele ressalta que, apesar de ser necessário fazer reajustes fiscais nos países envolvidos, é preciso aceitar os riscos. Também citou como exemplo a Alemanha quando ingressou na União Europeia.
Opinião de especialista
O Jornal Opção conversou sobre o assunto com o doutor em Estudos Comparados sobre as Américas, Jeferson de Castro Vieira. Segundo o especialista, o primeiro passo, antes de implementar a moeda unificada, seria fortalecer o Mercosul. “É um projeto muito interessante de integração dos mercados [Mercosul], mas não se fortaleceu, então é preciso que haja o fortalecimento do ponto de vista econômico, social, e, por fim, do ponto de vista na questão da moeda”.
Jeferson salienta que é necessário, também, que todas as contas estejam equilibradas: “Hoje temos problemas de contas públicas no Brasil e na Argentina, enquanto não houver equalização de tarifas não dá para implantar a moeda. A moeda, na verdade, é uma última etapa de um processo de unificação”.
Sobre a comparação feita pelo ministro em relação à Alemanha, Jeferson disse que o país, quando entrou na União Europeia, já estava fortalecido: “Todas as contas da Alemanha já estavam ajustadas para entrar na União Europeia, então essa comparação não tem nada a ver, o país entrou no mesmo pé de igualdade da França e Inglaterra”, pontuou.
No que diz respeito aos benefícios da unificação para a Argentina, como alegou o ministro, o especialista diz que o bloco deve ser fortalecido como um todo. “É uma jogada de marketing, o Mercosul não é só esses dois países, tem ainda, Paraguai e Uruguai”. E salientou que a estrutura produtiva dos países é diferente: “A agroindústria na Argentina é muito forte, que de certa forma seria fortalecida pelo acordo, já o Brasil tem uma indústria forte, como a questão automobilística, por exemplo. A dificuldade nisso, é a competitividade em termos de produção”.
Anos atrás
Em 2003, quando o mesmo assunto estava em pauta, a BBC publicou uma análise de especialistas, os quais afirmaram que o Mercosul não estava pronto para uma moeda única. Na ocasião, a proposta foi vista como boa, mas não para aquele momento, opinião semelhante à do especialista, agora, em 2019.
Os analistas alegaram, na época, que “ao abrir mão da soberania sobre a política monetária, os países perdem um instrumento precioso para conduzir suas economias, podendo ser prejudicados por uma política única de juros, como acontece agora com a França e a Alemanha na Europa, por exemplo”.
E alertaram também para os riscos: “Quando um bloco de países adota uma moeda única, a responsabilidade sobre a política monetária – como a fixação dos juros – deixa de ser de cada país e passa a ser de um banco central comum. Foi isso o que aconteceu com os 12 países da Europa que adotaram o euro como moeda. O banco central de cada um perdeu sua função de autoridade monetária, transferida ao Banco Central Europeu (BCE).
Conclusão
Em síntese, Jeferson explica que, para chegar à moeda única é preciso alguns pressupostos: “Tem que ter uma inflação muito parecida entre um país e outro e as contas públicas devem estar equilibradas nos dois países. Portanto, esses requisitos não foram cumpridos, não tem como fazer uma moeda única agora, além disso, a Argentina está em uma situação muito mais grave que o Brasil, com uma inflação de mais de 70% e um déficit público elevado, dificuldades, estas, que impossibilitam uma possível unificação monetária entre os países”.