ECA seria solução… Se fosse aplicado
04 julho 2015 às 15h37

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Para especialistas, o Estatuto da Criança e do Adolescente é eficiente, mas falta investimentos no setor socioeducativo. “É tratado como um mini-sistema penitenciário”, defende promotora

“O ECA é uma das leis mais modernas do mundo, mas não é aplicada.” A avaliação do advogado Paulo Lépore, especialista em Direito da Criança e do Adolescente, traz à tona a ineficácia do sistema socioeducativo, na semana em que a Câmara Federal aprovou, em primeira votação, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos em casos de crimes hediondos.
Para o advogado, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não está ultrapassado e até funciona, mas falha porque as políticas estatais não fornecem a estrutura idealizada pelo documento. “Em alguns casos, as unidades de internação acabam representando verdadeiros depósitos de pessoas, imponto severo sofrimento físico e psicológico”, afirma o advogado.
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O ECA, estabelecido há mais de 25 anos no País, também é questionado pela coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância e Adolescência do Ministério Público de Goiás (MPGO), Karina D’Abruzzo. Em entrevista ao Jornal Opção Online, a promotora afirmou que o estatuto ainda “não foi completamente aplicado” no que diz respeito à implementação de políticas públicas. “Quando você não oportuniza a base, a tendência é ter violência”, argumentou.
Para a promotora, o sistema socioeducativo no Brasil não cumpre com seu objetivo porque não é levado a sério. “O socioeducativo não educa, porque não oferece a estrutura mínima e é tratado como um mini-sistema penitenciário.” Para funcionar, a especialista reitera a necessidade da implantação de políticas públicas também nos ambientes de internação. “Tem que ter Saúde e Educação. Atualmente, os meninos têm um ou duas horas de aulas por dia em classes multiseriadas. É como se fosse uma cadeia. Vai reeducar a pessoa como?”
Contrária à redução da maioridade penal, Karina afirma que ao concordar com a medida “estamos assumindo nossa incompetência”. Para ela, o menor infrator tem consciência de seus atos, assim como qualquer adulto, mas não possui a mesma maturidade. “Se o socioeducativo deixa a desejar, o que dizer do sistema penitenciário?”, argumenta.
Mudanças
A ineficácia do ECA é uma das justificativas usadas pelo segmento contrário à redução da maioridade penal. Por isso, existem diversos projetos de lei que propõem a adoção de um maior rigor no estatuto, o que poderia evitar uma medida mais drástica.
Recentemente, a presidente Dilma Rousseff (PT) admitiu que o governo poderia propor uma mudança no estatuto para ampliar a punição a adolescentes envolvidos em crimes hediondos. Atualmente, o tempo máximo de internação previsto no ECA é de três anos, sem diferenciar o tipo de infração cometida pelo adolescente. Um dos projetos de lei parado no Congresso defende a ampliação deste tempo para oito anos.
Na avaliação da promotora Karina D’Abruzzo, a ampliação do tempo de internação é uma medida “menos pior” do que a redução da maioridade penal, mas está longe de ser a solução para a criminalidade infanto-juvenil. A promotora reitera a falta investimento no setor e conta que adolescentes vêm sendo liberados das casas de socioeducação para dar espaço a outros internos. “Falta estabelecer prioridade absoluta para esse público. Só encontraremos uma saída quando os governantes enfim vivenciarem que a criança é de fato o futuro da nação, e esse futuro é pra hoje.”