Na sessão ordinária de quarta-feira, 13, na Câmara Municipal de Aparecida de Goiânia, um debate opôs os vereadores Dieyme Vasconcelos (PL) e Tales de Castro (PSB) em torno da presença de livros com conteúdos de caráter sexual nas escolas. 

O estopim foi a exibição, por parte de Dieyme Vasconcelos, de trechos do livro ‘O Avesso da Pele’, do escritor Jeferson Tenório. O vereador, criticou a presença de livros com “conteúdos sexuais” em escolas municipais e associou a prática ao que chamou de “doutrinação de militantes esquerdistas dentro da sala de aula”. 

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Dieyme cita trecho do livro ‘O Avesso da Pele’ | Vídeo: Câmara de Aparecida de Goiânia

Em entrevista ao Jornal Opção, ele afirmou: “Existe já, todo ano, o Conselho Nacional de Educação, que é realizado por um parâmetro nacional que já define isso a respeito desses conteúdos juntamente com o MEC e juntamente com outros conselhos do Brasil também. Então, a forma adequada é fazer uma, sobre a idade adequada, principalmente, porque esse tipo de conteúdo, ele tem que ser falado, mas ser falado para uma idade adequada”.

Já o vereador Tales de Castro disse ao Jornal Opção que a ação espalhou fake news desnecessárias. “Isso foi mais uma tentativa de atacar a educação, de dizer que a escola não é um ambiente seguro, de querer desmerecer o trabalho dos professores”, disse.

O vereador destacou que todos os livros utilizados nas escolas passam por edital de seleção junto ao Ministério da Educação (MEC) e são avaliados por bancas de doutores, pesquisadores e pelo Conselho Nacional de Educação, seguindo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). “Não há distribuição de livro pornográfico nas escolas. É uma grande mentira”, afirmou.

Segundo Vasconcelos, sua fala foi mal interpretada por veículos de comunicação, que teriam dado a entender que o livro já estava sendo distribuído em Aparecida. “Nada disso”, garante. O parlamentar argumenta que o objetivo é impedir que obras com abordagem sexual explícita cheguem a alunos de faixas etárias consideradas inadequadas. Para ele, a medida é preventiva e visa evitar situações semelhantes à de uma professora que, segundo relata, teria compartilhado experiências sexuais com estudantes, caso que levou o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, a suspender a educadora.

O vereador ainda defendeu que sua atuação não tem caráter partidário: “Essa pauta é muito maior que isso, independente de que livro o Ministério da Educação tenha comprado, esse livro não pode entrar na sala de aula. Não importa o governo, se está errado nós vamos para cima”. Vasconcelos afirmou já ter apresentado quatro projetos de lei com foco na proteção de crianças e adolescentes, incluindo a proibição de livros eróticos em sala de aula e a definição sobre o uso de banheiros públicos e privados.

Outro alvo de críticas foi a obra ‘Aparelho Sexual e Cia – Um guia inusitado para crianças descoladas’, de origem francesa, voltada a estudantes de 11 a 15 anos. Para Vasconcelos, mesmo quando há justificativas pedagógicas, materiais com esse tipo de conteúdo devem ser cuidadosamente analisados.

Ele enfatizou que temas como reprodução e sexualidade podem ser abordados nas aulas de biologia, mas dentro de critérios etários e com avaliação de psicólogos. “Se você leu trechos desse livro ‘O Avesso da Pele’, isso não é um conteúdo que você está ensinando para uma criança, isso é um livro pornográfico”, sustentou.

Do outro lado do debate, Tales contesta a narrativa do colega. O explicou que ‘O Avesso da Pele’, obra vencedora do Prêmio Jabuti, foi selecionado em 2019, durante o governo Jair Bolsonaro, e entregue às escolas em 2022, ainda na gestão do ex-presidente. O livro foi recolhido em 2024, já no governo Lula. “O atual governo pediu para recolher. Não foi no governo Lula que ele foi distribuído”, ressaltou.

Ele reforçou que a obra não é pornográfica, mas sim uma narrativa literária que aborda questões históricas e culturais, como a escravidão e seus abusos. “Talvez o equívoco tenha sido distribuí-lo para determinada faixa etária, mas não se trata de conteúdo erótico ou pornográfico”, completou.

Método nazista e fascista

Na tribuna e durante a entrevista, Tales de Castro comparou o método de atuação de alguns políticos à propaganda nazista e fascista. Ele citou a Ação Integralista Brasileira, movimento da década de 1930 que, segundo ele, perseguia minorias e que também tinha o mesmo lema que hoje a extrema direita usa: “Deus, Pátria e Família”.

“No Brasil, eles utilizam os mesmos métodos: criar um inimigo imaginário para gerar pânico e se apresentar como solução. Foi assim com Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália. Hoje, alguns fazem o mesmo ao dizer que escolas têm banheiro unissex ou mudam o sexo de crianças, quando isso simplesmente não acontece”, afirmou Tales.

Para ele, essa estratégia de comunicação “repetir uma mentira várias vezes até virar verdade” é herança direta do chefe da propaganda nazista, Joseph Goebbels.

Tales também ampliou o debate, apontando que a desinformação ganha força na era digital e precisa de combate coordenado. Ele defendeu que o Judiciário, o Congresso Nacional, o governo e as big techs firmem um pacto para combater conteúdos falsos e criminosos, como redes de pedofilia e notícias falsas sobre educação.

“As informações circulam de forma muito diferente de anos atrás. Hoje, muita gente se informa pelo Instagram e pelo WhatsApp, e isso facilita a disseminação de conteúdo sem fonte ou critério”, destacou. Para o vereador, o problema não é de “esquerda ou direita”, mas de responsabilidade na comunicação.

Tales criticou a postura de Dieyme, afirmando que o colega usa pautas irreais para ganhar visibilidade política. “O vereador é pré-candidato a deputado estadual e tenta criar terror para conquistar curtidas e votos, e eu até falei isso na Câmara ontem, isso é uma tática de comunicação que muita gente está usando na política, e eu acho isso assim uma coisa covarde, que é querer ficar aterrorizando a população, colocando medo pra se apresentar como salvador da pátria”, disse.

Ele defendeu que a Câmara se concentre em problemas concretos de Aparecida, como a dívida herdada pela prefeitura e a necessidade de reorganizar os serviços públicos. “Em vez de ajudar a discutir os problemas reais da cidade, fica criando fake news para crescer politicamente. Não dá para aceitar esse tipo de coisa”, concluiu.

As informações oficiais também divergiram das acusações. O Ministério da Educação afirmou que nunca adquiriu o livro Aparelho Sexual e Cia – Um guia inusitado para crianças descoladas. O Ministério da Cultura, por sua vez, confirmou a compra de 28 exemplares da obra em 2011, destinados exclusivamente a bibliotecas públicas, e não a escolas.

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