É tempo de os líderes testarem suas forças
25 fevereiro 2024 às 00h01
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Por meio de vídeos e chamados em corrente por parte de aliados, o ex-presidente Jair Bolsonaro convocou, para o dia 25 de fevereiro, este domingo, um ato na avenida Paulista, em São Paulo, “em defesa da democracia”. A manifestação contará com dezenas de lideranças políticas, incluindo o governador de Goiás e pré-candidato à presidência da República, Ronaldo Caiado. Paralelamente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva promoveu uma verdadeira corrida no G20 – reunião das 20 maiores economias do mundo, realizada neste ano no Rio de Janeiro – para estabelecer diálogos com chefes de Estado, ao mesmo tempo em que deliberava com seu círculo sobre como contornar a mais recente crise de seu governo.
Cada uma das atuais e mais importantes lideranças políticas estão se movimentando com robustez em diferentes direções, mas unidos por uma consciência única: é hora de colocar as cartas na mesa e ir para o tudo ou nada. Em um ano de eleição com tantas atipicidades como 2024, os caciques políticos sabem plenamente que a hora é de demonstração de poder. São as ações e articulações de agora que ditarão, diretamente, os desdobramentos políticos deste ano até 2026.
Há quem diga que Bolsonaro pode ter queimado a largada ao convocar uma manifestação logo agora. Porém, para o objetivo pretendido por Jair, para este colunista a iniciativa vem no timing perfeito. O ato vem na esteira da operação da Polícia Federal que teve como alvos o PL, militares e o próprio ex-presidente. A manifestação na Paulista será uma clara demonstração de força ao Supremo Tribunal Federal (STF), sobretudo ao ministro Alexandre de Moraes. Ao evidenciar a dimensão do apoio popular que ainda tem (espera-se milhares de pessoas na Paulista), Bolsonaro dá um claro recado para Moraes: “Pense bem antes de mandar me prender. Repare, ainda, qual o meu tamanho”.
Convenhamos: mesmo sem mandato e alvo de investigações, Bolsonaro tem grande apelo popular e dispõe de apoiadores fiéis. A intenção do ex-chefe do Executivo é mostrar justamente que sua prisão pode desequilibrar o jogo político e provocar caos no País. Quanto ao efeito disso, há de se observar.
Nesse contexto de efervescência, em que a base bolsonarista até então quase cansada e desmobilizada, e ainda magoada por se sentir “abandonada” após os atos antidemocráticos do 8 de janeiro, volta a se unir e se solidificar, é natural que aqueles que já tinham um alinhamento com o ex-presidente respondam ao chamado dele.
É o caso de Caiado, que pode dar mais uma demonstração de sua influência e poder na avenida Paulista. Caiado é o tipo político que sabe bem onde pisa e consegue prever bem para onde fluirão as articulações, resultado de décadas de experiência na política. Ao marcar presença ao lado de Bolsonaro na Paulista, o governador goiano deve se aproximar ainda mais da base à qual é simpático (e vice-versa) e mover seu nome algumas posições à frente na fila de possíveis candidatos à presidência para 2026.
Vale lembrar que Caiado já é tido por muitos como o candidato natural da direita para 2026. Agora, o chefe do Executivo estadual segue em busca de se projetar nacionalmente. Com aparições frequentes na imprensa nacional, sobretudo em contextos ligados aos números positivos da segurança pública em Goiás, o governador já chega a ser cotado por alguns veículos de imprensa, como a revista Veja, como a cabeça de uma chapa em que teria Michelle Bolsonaro como vice. A imagem do governador ao lado do ex-presidente em um ato simbólico na Paulista pode reforçar ainda mais essa ideia no imaginário popular da direita.
Ao mesmo tempo que Bolsonaro e Caiado fazem suas jogadas, Lula também dá suas cartas para demonstrar a dimensão de seu poder. No entanto, o atual presidente parece partir para o risco acentuado – caso os planos vinguem, os louros serão grandes. Caso não, a queda será feia.
Me refiro aqui às recentes declarações do presidente sobre a guerra de Israel contra o grupo terrorista Hamas, que acaba por atingir, diretamente, judeus e palestinos. É fato que a linha adotada por Netanyahu tem causado estranheza e horror em diversos chefes de nações, ao preterir ações de inteligência e operações especiais na busca pelos terroristas e optar por ataques amplos, provocando um verdadeiro massacre de inocentes, mulheres, crianças e idosos palestinos que nada têm a ver com o terrorismo do Hamas.
Uma prova disso é o fato de que absolutamente todos os países da União Europeia, com exceção da Hungria, pediram o cessar-fogo em Gaza. O recado foi claro a Israel: seu objetivo, a luta contra o terrorismo e a defesa do povo israelense, é válida. Mas não da forma como está sendo feita.
Buscando obter novamente um status de negociador da paz e diplomático, status esse carimbado em seu segundo mandato, Lula tece ataques diretos ao sionismo de Netanyahu. A última declaração, comparando os ataques em Gaza com o holocausto do povo judeu, pegou mal em grande parte do ocidente, rendendo a Lula até um pedido de impeachment por parte da oposição brasileira.
É sabido que o pedido não prospera, mas demonstra que a oposição está desperta e em movimento. Contudo, com suas movimentações no G20 e o fato de não se retratar, mantendo o que disse, Lula põe sua força em teste. O presidente decidiu pagar para ver o tamanho de sua influência diplomática e não recuou nem mesmo depois de ser declarado “persona non grata” por Israel.
Para aliados, os resultados da fala de Lula a médio e longo prazo refletirão diretamente no cessar-fogo em Gaza e na proteção dos palestinos e judeus da guerra. Os efeitos positivos políticos e eleitorais disso sobre Lula seriam, por óbvio, enormes. Porém, caso a retórica israelense fale mais alto entre os países que acompanham a guerra, e a oposição brasileira saiba tirar proveito disso, Lula saíra nanico e quase com status de pária. Como dito, ele pagou para ver e espera demonstrar seu poder com isso.