Tristeza profunda e recorrente é um dos sintomas da depressão, doença que pode atingir a todos. Em casos extremos, pode até levar ao suicídio, como o que aconteceu a atriz e jornalista Suindara Coelho

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Além do sentimento de tristeza profunda, a depressão causa perda de apetite, dificuldade de concentração, alteração no sono, baixa-autoestima e perda da vontade de realizar atividades cotidianas

A depressão é um distúrbio afetivo que acompanha a humanidade ao longo de sua história e se configura como uma das principais formas de manifestação do sofrimento psíquico na contemporaneidade. No mês passado, a jornalista e atriz Suindara Coelho, de 36 anos, cometeu suicídio e o seu corpo foi encontrado, já sem vida, em um hotel de Goiânia. Ela, como muitos outros brasileiros, sofria de depressão — considerada por muitos estudiosos como o “mal do século” ou da pós-modernidade.

De acordo com o psiquiatra e professor de psicologia na PUC-GO José Reinaldo, a depressão é um transtorno mental determinado por alterações orgânicas e cerebrais, que levam a um estado de humor rebaixado. No sentido patológico, há presença de tristeza, pessimismo, baixa autoestima, podendo causar perda de apetite, dificuldade de concentração, ações antissociais, alteração no sono e, em casos mais extremos, levar ao suicídio. Em alguns casos, a depressão pode vir acompanhada de outras patologias como transtorno de ansiedade, fobia social e síndrome do pânico.

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L. S., que preferiu não se identificar, de 23 anos, é estudante de jornalismo e foi diagnosticada há três anos com depressão e fobia social. Além da tristeza que sentia com frequência, L. percebeu que algo estava errado porque já não possuía vontade e a disposição para estudar, sair e realizar atividades normais do cotidiano. “Eu sempre gostei de manter o meu apartamento bem arrumado e limpo. De repente, eu já não tinha ânimo para isso e tudo passou a estar sempre bagunçado.” Ela revela que, muitas vezes, não conseguia sair da cama para ir para a faculdade e, sempre que podia, se refugiava na casa dos seus pais, lugar onde se sentia mais segura.

É importante diferenciar a tristeza patológica daquela que é transitória, provocada por acontecimentos difíceis e desagradáveis, mas que são inerentes à vida. Pessoas sem a doença passam por momentos de tristeza, porém, conseguem sair deste estado com o tempo. No caso de indivíduos com depressão, a tristeza é sem fim e sem razão aparente. “É uma dor que não se quer sentir, mas que é maior do que você”, explica L.. “Ás vezes até tem um gatilho, uma situação que te faz entrar em uma crise maior ainda. Outras vezes são coisas minúsculas e que tomam proporções gigantescas”.

“O paciente geralmente apresenta um quadro de anedonia, que é a incapacidade de vivenciar prazer nas coisas que antigamente eram agradáveis. O deprimido também experimenta sentimentos de culpa e não reage às situações cotidianas”, esclarece o professor. “Eu me cobro muito, então acabo me culpando e ficando brava comigo mesma por não conseguir fazer coisas que todo mundo faz”, complementa L.. Outro sintoma da depressão é o pensamento recorrente de morte. Entretanto, José esclarece que esse sentimento não significa necessariamente que o paciente tentará se suicidar.

Não existe um fator que determina se a pessoa terá ou não depressão. Segundo o professor, são várias as razões envolvidas que podem levar a doença, entre eles a genética e questões ambientas. A depressão, ainda, pode ser diferenciada por graus de intensidade, existindo a leve, a moderada e a grave. José explica que pessoas com depressão leve conseguem tocar a vida e não há uma perda de produtividade muito grande. Nos casos mais graves, o indivíduo perde totalmente a iniciativa e a vontade de realizar atividades.

Do diagnóstico ao tratamento

Foto: Ilustrativa
A psicoterapia é essencial para o tratamento da depressão

O diagnóstico da depressão é clínico, por meio dos relatos do paciente, ou seja, não existe um exame específico que comprove a doença. “Quando percebi que tinha um problema, procurei ajuda de um psicólogo, mas logo ele me orientou a procurar um psiquiatra também. Para fazer o diagnóstico, o médico fez uma investigação da minha vida e alguns exames, para se certificar se não era nenhum problema hormonal”, conta L..

O tratamento, segundo José Reinaldo, não é igual para todos, mas geralmente é uma associação entre medicamentos e psicoterapia. Entretanto, achar o remédio certo pode ser uma tarefa difícil. L. conta que, desde que descobriu a doença, já precisou trocar várias vezes de medicamento para descobrir o que melhor se adequa a ela. “Ás vezes, pensamos que estaremos curados logo após iniciar o tratamento, mas não é bem assim. É um processo, existem recaídas, momentos em que o emocional volta a ficar fragilizado.”

Quando questionado sobre as formas de tratamento, José sustenta que o uso de medicamentos é necessário, uma vez que a doença traz sérios riscos de autoextermínio para o paciente. Nos casos de depressão mais leve, é possível tentar seguir um tratamento apenas com psicoterapia. O professor ressalta que os psicotrópicos não provocam dependência, pois a retirada é feita gradualmente pelo médico que acompanha o caso, de uma forma progressiva para que não ocorra uma síndrome de retirada.

O professor afirma que o tratamento para depressão geralmente traz bons resultados e muitos pacientes conseguem retomar o seu nível mental anterior. O grande problema, segundo José, é que a depressão é uma doença recorrente, o que significa que ela pode se repetir no futuro. Em alguns casos, ocorre um episódio único, mas em outros não. Nos casos de repetição, José alerta que é conveniente que o tratamento seja mais prolongado.

A arte pode se unir a terapia e auxiliar no tratamento de problemas emocionais | Foto: Reprodução/Catraca Livre
A arte pode se unir a terapia e auxiliar no tratamento de problemas emocionais | Foto: Reprodução/Catraca Livre

Embora não esteja curada da doença e passe por momentos difíceis, L. percebe algumas evoluções no seu quadro. “Eu já não sinto aquela mesma ansiedade sem motivo o tempo todo”, começa. “Também não acordo no meio da noite com a respiração e o coração acelerado. Outra coisa que mudou é que, hoje, já consigo enfrentar melhor as situações, antigamente eu apenas fugia delas”, finaliza a estudante. L. tem muitas esperanças de que, um dia, toda a dor passe. Para ela, a pessoa que sofre de depressão precisa tentar mudar a estrutura do seu pensamento, de dentro para fora, tentar não ver somente os lados negativos, e é nisso que ela vem trabalhando nela mesma.

Além dos tratamentos convencionais, existem terapias alternativas que podem auxiliar na cura da depressão, como a Arte Terapia. Como o próprio nome diz, a técnica une a terapia à arte — por meio de pintura, dança, de modelar e outros atos criativos — na tentativa de proporcionar alívio àqueles que buscam a restauração do seu equilíbrio emocional. Assim, a arte exerce uma função cognitiva e se torna um mediador da expressão, fornecendo ao indivíduo informações sobre si próprio, e ao terapeuta um registo do processo.

Estigmas, apoio e entendimento

Foto: Reprodução/Facebook
Tirinha que retrata o preconceito e a falta de compreensão que pessoas com depressão enfrentam no seu cotidiano

Apesar da ser um problema cada vez mais comum e atingir indivíduos de diversas idades, muitas pessoas ainda não conseguem compreender a depressão como doença, o que faz com que hajam alguns estigmas e preconceitos envolvendo-a. Muitas vezes esse preconceito pode vir da própria família e dos amigos, que julgam o sentimento de tristeza e de desamino do paciente como “frescura”, “preguiça” ou como se a vontade de reagir dependesse apenas deles mesmo.

L. disse já ter sentido isso na própria pele por diversas vezes. “Muitos já disseram que eu devia me esforçar um pouco mais, que bastava ter força de vontade e eu conseguiria reagir e sair da depressão ou mesmo que o fato de não querer fazer certas coisas era por preguiça. Mas essas pessoas não entendem que a dor, essa dor que ninguém vê, mas que continuo sentindo, é muito maior do que eu”, relata.

Além disso, o apoio da família e de amigos é muito importante para a recuperação do paciente com depressão. L. conta que, a princípio, sua família não entendia o que acontecia com ela. “Com o tempo, minha mãe passou a pesquisar mais sobre o assunto, a ler sobre a doença, e hoje consegue lidar melhor comigo e com os meus problemas”, revela. “Porque mesmo que, às vezes, eu não queira ver e nem falar com ninguém, é bom saber que tem alguém por perto para de dar apoio. Eu me apoio muito em Deus, na minha família e alguns amigos que me entendem para vencer essa doença”.

“Nós só esperamos mais compreensão das pessoas”, pediu L.. “Que elas entendam que é uma doença. A incompreensão e a cobrança não nos ajudam a melhorar”. A estudante conta que, se a depressão trouxe algo de bom, foi exatamente essa sensibilidade com relação à dor dos outros. Hoje, ela consegue entender muito melhor as pessoas, que dor nem sempre precisa de motivos e nem se mede, e que o melhor que se pode fazer, ao invés de julgar, é respeitar e apoiar.