Comissão Nacional da Verdade: 15 goianos são listados como vítimas
11 dezembro 2014 às 12h59
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Está prevista para a próxima segunda-feira (15) a divulgação de novos relatórios apurados pela comissão estadual criada para apurar os abusos do regime ditatorial em Goiás
Após quase três décadas depois do fim da ditadura militar e de dois anos e meio de investigações, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) entregou nesta quarta-feira (10/12) um extenso relatório — ao todo, são 4,4 mil páginas — sobre os abusos do regime ditatorial no Brasil, que durou de 1964 a 1985. Nele, são contabilizados 434 mortos e desaparecidos, além de outros 377 responsabilizados pelos crimes. Entre as vítimas, há 15 goianos.
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Um deles é o estudante, lavador de carro e servente de pedreiro Ornalino Cândido da Silva. Natural de Pires do Rio, ele foi morto em 1968, aos 19 anos de idade, com um tiro na cabeça quando participava de um protesto na avenida Goiás, em Goiânia. O estudante foi confundido com um dos líderes do movimento estudantil da capital, Euler Ivo Vieira. A falsa versão noticiada à época foi a de “morte em tiroteio”.
Outro caso é o de Ismail Silva de Jesus, irmão do atual presidente do PSDB goiano, Paulo de Jesus. O também estudante morreu no dia 9 de agosto de 1972, um dia após ter sido levado preso para o 10º Batalhão de Caçadores de Goiás, comandado pelo então coronel Eni de Oliveira Castro, goiano listado entre os 377 responsabilizados por crimes durante o período ditatorial.
Em Goiás, além do relatório concedido pela CNV, outro documento promete esclarecer melhor os casos de abuso durante o período militar em território goiano. Está prevista para a próxima segunda-feira (15) a divulgação de relatórios da Comissão Estadual da Memória, Verdade e Justiça Deputado José Porfírio de Sousa (CEMVJ). Os relatórios apresentados devem ser finalizados e entregues até o mês de março de 2015 para o grupo nacional.
A CEMVJ foi criada em março deste ano por meio de ato do governador Marconi Perillo (PSDB) com publicação no Diário Oficial do Estado. O grupo, coordenado pela Secretaria de Administração Penitenciária e Justiça (Sapejus), foi criado com a missão de examinar e esclarecer, na esfera do Estado de Goiás, as graves violações de direitos humanos praticados no período da ditadura no país ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988.
Críticas
Mesmo com os avanços significativos, a CNV não conseguiu com que o Comando Geral das Forças Armadas contribuísse com as investigações. A ala militar não apenas se negou a prestar informações à comissão, como também teceu duras críticas ao documento apresentado.
Em nota, o Clube Militar, formado por militares da reserva, condenou o relatório, o qual definiu como “uma coleção de meias verdades, calúnias e mentiras, embaladas com pedaços de verdade”. O texto vai além e ressalta que o teor do que foi apresentado pela comissão mostra claramente a inclinação “socialista” de seus membros e da atual gestão do país.
Outra crítica feita, sobretudo de grupos mais conservadores, é a ausência dos possíveis crimes praticados pela esquerda à época. Na carta do Clube Militar, o assunto também é lembrado. “Das suas 29 recomendações, várias miram diretamente as Forças Armadas, como agentes do Estado. Nenhuma faz referência à ação dos terroristas, guerrilheiros, sequestradores e assassinos esquerdistas que tentavam tomar o poder à força e estabelecer no País um governo totalitário comunista de modelo soviético, chinês ou cubano”, condena trecho da nota.
Avaliação de um ex-preso político
Preso político durante a Ditadura Militar, o goiano Tarzan de Castro avalia que a comissão cumpriu com o seu papel, mas lamentou o bloqueio das informações por parte das Forças Armadas. “Não houve a boa vontade, o que de certo ponto é incompreensível”, pontuou. Na obra de Cláudio Aguiar, intitulada “Francisco Julião – Uma Biografia”, Tarzan é apontado como comandante de dispostivo armado das Ligas Camponesas em Goiás, grupo precursor da reforma agrária no País.
Para ele, as investigações da CNV não podem cessar, pelo contrário, devem fazer parte de um longo processo, o qual define como crucial para o entendimento histórico desse período nebuloso para os brasileiros.
“O processo deve continuar. Toda as partes devem ser ouvidas. Eu acredito que a comissão cumpriu seu papel, mas não tinha forças para fazer que com quer as Forças Armadas abrissem os arquivos. Esse processo deve ter continuidade. É necessário maturação para quer as instituições falem o que sabem, mas, em particular, as Forças Armadas”, reiterou.